Poder
corruptor da inflação
Pedro J. Bondaczuk
A moeda é um dos símbolos da soberania de um país.
Preservá-la e fortalecê-la é mais do que uma sábia decisão política ou uma ação
econômica inteligente. É um ato de patriotismo, porquanto mantém intacta a
moral pública e o respeito ao que o professor Eduardo Gianetti da Fonseca
denomina de “acordo ético básico da sociedade”.
Por isso, entre outros males produzidos pela
inflação, ressalta o seu efeito corruptor. À medida em que inexiste uma
“unidade de valor estável” no País, as pessoas passam a agir no sentido do
“cada um por si”. E esta, convenhamos, não é uma base sólida (ou sequer um
fundamento) para a construção de uma nação próspera, justa e equilibrada.
E o que ocorre hoje no Brasil em relação ao cruzeiro?
A rigor, a moeda existe somente para o pagamento de salários e nada mais. O
governo insiste que a dolarização da economia brasileira é um expediente que
está descartado. Na prática, porém, ela já vigora e há muito tempo.
Até cachorro-quente, atualmente, é cotado pelo valor
da moeda norte-americana. O País, na realidade, não possui mais signo
monetário. Os impostos são cobrados em Unidades Fiscais de Referência (Ufirs),
os aluguéis sofrem reajustes pelos índices inflacionários e mercadorias e
serviços têm seus preços todos expressos em dólares. Onde fica o cruzeiro nesta
história?
O advogado e ex-procurador-geral da Fazenda
Nacional, Jayme Alípio de Barros, em artigo publicado no caderno “Dinheiro”, do
jornal “Folha de S. Paulo”, em 24 de dezembro de 1992, intitulado “O governo
provisório e a inflação vitalícia”, constata: “A inflação brasileira já é mal
crônico e grave; como a Aids em relação aos indivíduos, ameaça de vez o
organismo da economia nacional, minando suas defesas, impedindo a ação preventiva
e restauradora dos anticorpos sociais produzidos pelo trabalho e pela livre
iniciativa. Nos grupos de maior risco, estão os devedores em geral, os
assalariados não-metalúrgicos, sem salários indexados, e até, paradoxalmente, o
próprio Tesouro Nacional, que, por gastar e dever demais, se tornou vítima,
muito embora seja ele o principal agente da inflação”.
Não foi por acaso que a decomposição do tecido
social do País se deu exatamente no período do maior surto inflacionário. Esse
é um mal impossível de se conviver, caso se pretenda ter um país democrático e
justo. Muitos ainda não entenderam isso e pregam soluções paliativas. Outros,
os que se beneficiam com a concentração de renda, assumem atitudes dúbias.
Publicamente, exigem um combate feroz à inflação, enquanto em âmbito privado
resistem às medidas saneadoras.
No livro “A Rebelião de Atlas”, de Ayn Rand, há um
trecho sugestivo que se aplica ao Brasil contemporâneo, embora não acreditemos
em situações apriorísticas ou em qualquer espécie de determinismo.
Diz: “Observai o dinheiro. O dinheiro é o barômetro
das virtudes de uma sociedade. Quando notardes que o comércio se efetua, não
por consentimento das partes, senão por obrigações; quando vires que, com o fim
de produzir, necessitais de autorização de quem não produz nada; quando
observardes que o dinheiro aflui para os que traficam não com gêneros, senão
com favores; quando vos deres conta de que muitos se fazem ricos pelo suborno,
pela pressão, mais do que pelo trabalho, e que as leis não vos protegem contra
eles, senão que, ao contrário, são eles os protegidos contra vós outros; quando
observardes como a corrupção é recompensada e a honradez se converte em
sacrifício, podereis assegurar, sem temor de vos equivocardes, que vossa
sociedade está condenada”.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 18 de julho de 1993)
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