Sunday, October 16, 2016

Morte na alma



Pedro J. Bondaczuk


O saudoso mestre B. Sampaio, na crônica "Pecados da Língua", publicada no Correio Popular de Campinas há alguns anos e que consta de seu livro (premiado pela Academia Brasileira de Letras), intitulado "O Cosmorama da Cidade", constata: "Diz o ditado que o peixe por sua boca morre. Também pela boca morremos nós, ou vamos morrendo na alma, porque, não contentes de pecar por pensamentos, damos à língua e dizemos mal do nosso semelhante. E como se não bastasse a só intenção silenciosa para tornar-nos réus de grave culpa, soltamos a palavra e lá se vai a maledicência a apregoar a nossa imperfeição".

Há pessoas cuja diversão predileta é falar mal da vida alheia. Ninguém escapa de sua língua ferina, deva ou não, seja ou não merecedor de reprovação por idéias, textos, conduta ou ausência dela. Há críticas que são sempre bem-vindas, por servirem de corretivos de rumos em nossas vidas.

Quando bem fundamentadas, embora arranhem nosso ego e firam nosso amor próprio, alertam-nos para nossas falhas, permitindo que as corrijamos. Estas, contudo, não podem e nem devem ser confundidas com a pura e simples maledicência. Com o rancor patológico que determinadas pessoas costumam sentir e mostrar por seus semelhantes, mesmo contra os que não conhecem pessoalmente.

O leitor, certamente, já teve a oportunidade de se deparar com gente assim, que todos evitam, para escapar de aborrecimentos inúteis. Tais indivíduos, se participam de uma conversa numa roda de amigos, ou se freqüentam com assiduidade redes sociais, buscam aparentar onisciência. Palpitam sobre tudo e sobre todos (políticos, esportistas, artistas, escritores etc.etc.etc.), mas sempre destilando veneno.

Se o assunto é sobre determinado cantor de sucesso, de imediato arranjam uma brecha no bate-papo, presencial ou internético, para suas observações em geral inoportunas. "Fulano?! Ora, todos sabem que se trata de um efeminado", logo afirmam, com ares de sabe-tudo.

Ou, quando não questionam a virilidade da figura famosa, recorrem a outros defeitos –  geralmente existentes somente em suas cabeças de sociopatas – para criticar, ou afirmando que o artista é viciado em drogas, ou que é mulherengo ou qualquer outra coisa que lhe confira "notoriedade".

Dessas "críticas" não há quem não deseje se livrar. São destrutivas, mesquinhas, covardes, que revelam somente uma personalidade desajustada e sumamente infeliz. Não constroem nada e, se puderem, destroem qualquer um, já que ninguém gosta de ser mal-falado, principalmente quando tem consciência de estar agindo bem.

Os maledicentes... Ah! como são frustrados e amargos os maledicentes! São mais um caso para se ter piedade do que rancor. Todavia, as críticas honestas, fundamentadas, coerentes, são importantíssimas, mesmo quando partidas de alguém que não nos aprecia.

Ruy Barbosa observou, num discurso proferido no Senado: "Amigos e inimigos estão, amiúde, em posições trocadas. Uns nos querem mal, e fazem-nos bem. Outros, nos almejam o bem, e nos trazem o mal". Elogios, em geral, tendem a ser funestos, mesmo quando o elogiado é merecedor deles. Sábia é a observação do saudoso mestre B. Sampaio, mentor e um dos fundadores da Academia Campinense de Letras. De fato, o maledicente vai morrendo na alma a cada aguilhoada que dá em seus semelhantes. E, pior: “assassina” reputações.

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