Sunday, October 16, 2016

Reagan e o Dominó


Pedro J. Bondaczuk


O presidente norte-americano Ronald Reagan está profundamente determinado, desde 1981, a depor o regime sandinista da Nicarágua, o qual acredita se tratar de um fruto gerado pela semente selvagem do governo marxista de Fidel Castro em Cuba. Depois de diversas tentativas, que foram desde o corte da ajuda para a reconstrução daquele país (assolado por terrível terremoto na década passada) aprovada por seu antecessor, Jimmy Carter, à minagem, por parte de agentes da CIA, de portos nicaragüenses, pensa estar dando, agora, o golpe de misericórdia em Daniel Ortega e seus seguidores.

Rompeu, unilateralmente, um tratado de amizade e cooperação com Manágua, e anunciou, anteontem, em Bonn (onde se encontra participando da reunião de cúpula dos sete países mais industrializados do Ocidente) um embargo econômico total ao seu desafeto da América Central.

A atitude de Reagan nos lembra muito uma outra ação norte-americana, no início da década de 60, na região do Caribe, pouco depois de Fidel Castro depor o ditador cubano Fulgêncio Batista, que transformara Cuba num gigantesco cassino, a ponto dessa ilha ficar conhecida, por muitos anos, pelo pejorativo e deprimente título de “Bordel das Américas”, houve como que um clima de pânico em alguns círculos de Washington.

O vencedor do movimento, iniciado nos ermos de Sierra Maestra, após entrar em Havana com seus homens, buscou obter, imediatamente, ajuda junto aos EUA. Talvez (e muito provavelmente) já estivesse de namoro com os russos, mas não, certamente, com a intenção de se transformar num satélite de Moscou encravado bem em frente à Flórida.

Washington, na oportunidade, não somente negou qualquer espécie de assistência a Castro, como ainda participou, diretamente, de uma malfadada e caricata operação de contragolpe, no ridículo episódio protagonizado na Baía dos Porcos. Isso acabou servindo de argumento decisivo aos marxistas que assessoravam o líder cubano (entre os quais Che Guevara), para que ele recorresse ao Cremlin, jogando Cuba até hoje na órbita da União Soviética.

O que vem ocorrendo na Nicarágua é mais ou menos semelhante, com algumas agravantes para a Casa Branca. Ao contrário dos fidelistas, os sandinistas prometeram, e realizaram, eleições presidenciais, há mais de seis meses, embora não da maneira como muitos esperavam. Ou seja, após uma ampla reconciliação nacional.

Mas esta, na oportunidade, fora inviabilizada pelo próprio governo norte-americano, ao explorar a desmedida ambição de determinados setores nicaragüenses, ligados ao ex-ditador Anastásio Somoza, logicamente sequiosos para recuperar os privilégios que antes gozavam e que preferiram radicalizar suas posições.

O embargo decretado anteontem por Reagan fatalmente conduzirá a Nicarágua a um grau de estatização econômica jamais visto. E levará Manágua a depender, cada vez mais, do bloco oriental para sobreviver. O boicote contra Cuba, em vigor até hoje, é verdade que empobreceu esse país, impedindo o seu progresso material. O regime de Castro sobrevive, contudo, embora às custas de Moscou, que despende US$ 10 milhões por dia para manter o luxo de ter um enclave em pleno feudo norte-americano.

No afã de evitar que a Teoria do Dominó, prevista pelo ex-presidente Eisenhower para o Sudeste Asiático em 1954, funcionasse na América Central, Reagan acaba, na verdade, de possibilitar a colocação da segunda peça desse jogo.

Tornada vítima, aos olhos das oposições, existentes nos países vizinhos, a Nicarágua vai emular outras rebeliões. Propiciará outros movimentos semelhantes ao seu. Até que os EUA não tenham outro recurso, senão uma intervenção militar, pura e simples, na área. Tudo, em conseqüência de um outro erro de enfoque do seu governo. Parece que a história recente não ensinou nada, mesmo, ao núcleo de poder de Washington.

(Artigo publicado na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 3 de maio de 1985).

Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk      

No comments: