Realidade
e estereótipos
Pedro J. Bondaczuk
O Brasil, há muito tempo, vem sendo analisado pelos
intelectuais através de estereótipos. Estudos sem fim tentam compreender e
explicar a personalidade do brasileiro, como se houvesse uma homogeneidade, um
elo comum, um comportamento básico que igualasse todas as pessoas. Todavia, não
há.
O antropólogo Roberto da Matta, em artigo que
publicou no Jornal do Brasil há muito tempo, em 24 de julho de 1994, analisou
essas tentativas de definir o nosso jeito de ser. Constatou, em determinado
trecho: "Em torno de 1900, o Brasil foi lido como um país a ser
arianizado; em 1960, foi a nação dos espoliados prestes a realizar sua grande
revolução socialista; em 1970, foi a terra do milagre econômico do Delfim e do
Médici, hoje, ele é visto como país da violência, da falência moral, do
separatismo e da ausência de valores éticos".
Estereótipos. Meros estereótipos. O País está longe
de ser homogêneo, quer no comportamento da população, quer nos estágios de
desenvolvimento em que se encontra. Há ilhas de prosperidade de fazer inveja a
sociedades do Primeiro Mundo, mas existem bolsões de miséria, de enormes
proporções, rivalizando com povos mais carentes da África, como Burkina Faso,
Somália, Ruanda ou Etiópia.
Há metrópoles modernas e dinâmicas e comunidades
mergulhadas num imenso atraso. Há pessoas extremamente competentes, solidárias,
com altíssimo senso ético e bandidos cínicos e cruéis, muitos dos quais de
colarinho branco, a cometer toda a sorte de crimes.
Há crianças sadias, superdotadas, com potencial para
ter um brilhante futuro e meninos de rua como Ricardo da Silva Soares, que em
1994 tinha 12 anos, que teve o crânio esmagado pelas rodas de um caminhão da
Prefeitura de São Paulo, no dia 10 de setembro daquele ano, ao ser confundido
com um saco de lixo, dentro do qual dormia, numa calçada do Largo do Arouche.
Tudo isso é Brasil. Podemos ser um pouco de
Macunaíma, mas também o somos da Irmã Dulce. Podemos ter características de
Lampião, mas temos a coragem e o ideal de um Marechal Rondon. Somos múltiplos,
heterogêneos, não somos passíveis de receber rotulações.
O próprio da Matta, no mencionado artigo, conclui:
"Nenhuma sociedade se esgota nas definições dos seus membros. As imagens
variam, o que nos leva a pensar que somos parte de um momento e de uma geração
que nos limita. Isso demonstra que ninguém está com a verdade, o que é um
alento numa sociedade, na qual cada grupo foi sempre dono de uma verdade
absoluta". O Brasil é tão grande que não cabe em estereótipos!
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