Riscos de um presidente fraco
Pedro J.
Bondaczuk
O escândalo da venda secreta de armas para o Irã e da
transferência ilegal de fundos para os rebeldes nicaragüenses pode ser que não
derrube o presidente Ronald Reagan, como o Watergate fez, em 1973, com o também
republicano Richard Nixon. Aliás, é até bastante provável que isso não venha a
acontecer, de fato, embora o caso atual seja muito mais grave do que o de 14
anos atrás, por envolver questão de política externa.
Mas uma coisa, certamente, todo
esse “affaire” vai provocar: o descrédito público do governante que chegou a
bater recordes de popularidade há pouquíssimo tempo, graças aos seus raros
dotes de exímio comunicador. Doravante, suas decisões, quando se referirem a
assuntos de Exterior, certamente irão merecer maior vigilância por parte do
Congresso.
Esta circunstância, de
enfraquecimento do presidente, pode ter implicações mais sérias do que parecem
à primeira vista. Principalmente no que diz respeito às negociações com a União
Soviética a respeito de desarmamento nuclear.
Uma pergunta que os observadores
estão fazendo a todo o momento, e que, certamente, o seu interlocutor soviético
também fará (mesmo que seja a si próprio), na eventualidade de realmente sair
uma terceira reunião de cúpula, prevista para Washington, ainda no corrente
ano, entre os líderes das superpotências, é até que ponto Reagan terá poder
para negociar. E firmar qualquer acordo, numa área de tamanha importância como
a das armas atômicas, sem garantias de que ele será cumprido, é uma temeridade.
É deixar uma bomba de tempo montada para explodir no momento em que ninguém
esperar, deflagrando novas, perigosas e sucessivas crises entre Estados Unidos
e União Soviética.
Que se deseje apurar até que
ponto Reagan se envolveu na ajuda clandestina aos contras, é até compreensível,
mas não de todo desejável, por mais estranho que isso possa parecer. O próximo
ano irá marcar a eleição daquele que deverá suceder o presidente na Casa
Branca. É mais do que lógico, portanto, que o Partido Democrata, virtualmente
sem candidatos fortes, após a inesperada e intempestiva renúncia do ex-senador
Gary Hart, procure erodir a imagem republicana perante o eleitorado.
Mas isso seria o melhor para os
Estados Unidos? Seria desejável para o mundo livre? Seria o mais propício para
a causa da paz mundial? É muito contestável que o seja. Que o presidente
norte-americano está enfraquecido neste momento ficou mais do que evidente
quando do ataque iraquiano à fragata “USS Stark”, acontecido no domingo à
noite, no Golfo Pérsico. Não que alguém esperasse alguma reação intempestiva
dele, como uma retaliação ao Iraque, por exemplo, que não traria benefícios a
ninguém.
Mas Reagan ficou inibido de fazer
uso até de um dispositivo que a própria Constituição de seu país lhe faculta,
que é a chamada lei dos poderes de guerra, para auxiliar um dos seus maiores
aliados na região, o Kuwait. Ao invés disso, preferiu consultar cuidadosamente
o Congresso, para colocar a frota de petroleiros kuwaitiana sob a proteção da
bandeira norte-americana. E se o incidente fosse com os russos?
Muitos outros sintomas de sua
debilidade (que não cabe citar aqui) foram mostrados, nos últimos dias, por
parte da Casa Branca, que se vê acossada, vigiada e na defensiva, por causa de
algo que foi superdimensionado por ambas as partes.
Que organizações particulares de
extrema-direita financiavam os contras durante o período de veto legal do
Legislativo para isso, nunca foi novidade para ninguém. As agências cansaram-se
de mandar despachos nesse sentido. É evidente que leis existem para serem
cumpridas. E ainda mais por presidentes, que têm a obrigação sobressalente de
as fazer cumprir!
O governo de Reagan errou, desde
o início, em sua estratégia contra os sandinistas, fazendo deles heróis e
unindo os nicaragüenses em torno de sua causa. E isso nunca foi novidade
também. Mas erro maior cometem aqueles que acham que desprestigiando o
Executivo norte-americano estarão dando alguma contribuição para a causa da paz
mundial.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 22
de maio de 1987).
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