Wednesday, October 19, 2016

Decepção do século

Pedro J. Bondaczuk

O Brasil é tido no Exterior como a grande decepção deste século. Teve inúmeras oportunidades para deslanchar em seu desenvolvimento, mas por contar com governos incompetentes e políticas inconsistentes chega neste final de milênio ostentando dados sociais estarrecedores, senão revoltantes.

O País não conseguiu, sequer, definir suas prioridades econômicas. Não sabe o que produzir para vender a quem e a que custo. Tudo é feito empiricamente, na base de tentativa e erro, daí essa fase de retrocesso acelerado. Claro que o atraso não se deve apenas a isso. Entram na história o fator corrupção, o item irresponsabilidade e outras tantas variáveis negativas, como o oportunismo, a desorganização, a indisciplina etc.

O correspondente da “Agência Estado” em Washington, Paulo Sotero, ouviu o ex-secretário do Tesouro norte-americano, Nicholas Brady, que desabafou: “O Brasil é uma das promessas não realizadas do mundo atual”.

Se lá fora, o País é avaliado com tamanha severidade, imaginem aqui. Quando o crítico faz constatações contundentes desse tipo, em artigos carregados de amargura, isso não significa descrença nos destinos nacionais ou aquele pessimismo indolente e rancoroso, que não conduz a lugar algum.

Quando se critica a situação, e principalmente o comportamento dos que conduziram o Brasil a esse buraco, há uma enorme carga de confiança de que nem tudo está perdido. Esse é o papel da imprensa. Ou seja, alertar, constatar, sugerir, condenar o que é condenável, para que os erros sejam sanados, os vícios combatidos, os problemas racionalizados e o País encontre aquele destino com o qual todos sonhamos e por cujo objetivo tantos se sacrificam, virtualmente por nada. Por dois salários-mínimos e meio (o ganho de 52% dos brasileiros que trabalham), o que condena essas pessoas a morarem em favelas, a não terem acesso à educação, a serem desnutridas e a não contarem com nenhuma assistência sanitária.

E ainda assim, o brasileiro confia. Ama sua pátria como poucos povos são capazes de amar. É por gostar tanto deste País que as críticas às mazelas e aos desmandos soam tão ácidas. A todo o instante políticos e economistas tentam nos passar a idéia de que o Brasil é muito pobre. Que não há recursos para todos. Não o é.

A ganância de alguns é que não tem limites. O povo é que vegeta num estado lastimável de miserabilidade. O ex-secretário do Tesouro norte-americano observou a nosso respeito: “O Brasil tem, em larga medida, algumas das vantagens e dos problemas dos Estados Unidos. Como os EUA é um país extraordinariamente rico que se permite o luxo de fazer certas extravagâncias”.

Extravagante não é bem o termo mais apropriado para classificar as atrocidades econômicas e sociais que se cometem por aqui. É um absurdo um país como este conviver com taxas de inflação mensais acima de 20% por tantos anos. Mas o combate a este flagelo econômico passa muito mais pela vontade e competência políticas do que por decisões técnicas.

Os governos, salvo raras e honrosíssimas exceções, não merecem a credibilidade da população. Foram tantos e quantos as aventuras, experiências e atos de corrupção, desde o encilhamento do fim do século passado, aos sucessivos choques no período da Nova República, que a palavra dos governantes desperta, hoje, incredulidade, quando não debochadas gargalhadas. E isso é gravíssimo, convenhamos.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 25 de março de 1993).


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