Ocidente fez Saddam ser forte
Pedro J. Bondaczuk
A
população iraquiana jamais conheceu a autêntica democracia ao longo da
acidentada trajetória desse país neste século, desde que o Iraque foi
desmembrado do Império Otomano, quando de seu colapso, e se tornou
independente. Quando seu território não foi submetido a intervenções
estrangeiras --- e só a Grã-Bretanha promoveu duas, na Primeira e na Segunda
Guerra Mundial --- o seu povo teve que suportar monarcas tirânicos, que jamais
souberam o que eram direitos humanos, sem qualquer reação dos autoproclamados
"paladinos da justiça" do Ocidente em sua defesa. Derrubada a
monarquia, sucederam-se os ditadores militares, que nunca admitiram sequer a
existência da palavra oposição.
Nesse
contexto todo, até se entende o apoio dado agora pelos iraquianos ao general
Saddam Hussein. Ele, pelo menos, deu um objetivo, posto que megalomaníaco,
acenou para o povo com uma pretensa grandeza, prometendo dar ao país um papel
de liderança no mundo árabe, que ele nunca teve, embora às custas de muito
sangue.
Desde
que o atual presidente chegou ao poder, em 16 de julho de 1979, com a renúncia
do general Ahmed Hassan Ali-Bakr, o Iraque teve, praticamente, apenas dois anos
e dois meses de paz. A violência, portanto, é rotina na vida dos seus
habitantes.
O
tempo restante foi gasto em combater o Irã e com a invasão do Kuwait, que
redundou na atual guerra do Golfo Pérsico. É necessário que se frise que o
fenômeno Saddam Hussein é fruto exclusivo de erros das próprias potências
mundiais, que hoje querem posar de guardiãs da liberdade, já que há ingênuos
suficientes que acreditam nisso.
Quando
o regime do xá Rheza Pahlevi começou a entrar em colapso, nenhuma chancelaria
ocidental teve competência para perceber que sua queda era questão de tempo. Ao
invés de apoiarem a oposição moderada iraniana, deixaram-na na mão, confiantes
de que a polícia secreta do ditatorial monarca daria conta do recado. Mas não
deu.
Os
aiatolás assumiram o poder e devolveram o Irã à Idade Média. E, o pior,
desestabilizaram todo o Golfo Pérsico. Quando o rei Faiçal II do Iraque foi
derrubado e morto, em 1958, as potências do Ocidente, mergulhadas nas picuinhas
de "guerra fria" com a União Soviética, não tiveram sensibilidade
para influenciar a elite pensante iraquiana no sentido de estabelecer uma
democracia nesse país e fazer dele o fator estabilizador da região.
Afinal,
naquele tempo o petróleo dessa nação árabe ainda não pesava na balança
energética mundial, como agora. E os pseudo-estadistas ocidentais sempre foram
imediatistas. Assim que Saddam mostrou sua ambição expansionista, atacando o
Irã enfraquecido pelo caos revolucionário, em 20 de setembro de 1979, ninguém
se manifestou para devolver o ditador à realidade.
Ao
contrário, os propalados "justiceiros" armaram-no até os dentes, a
ponto do Iraque ser hoje a quarta mais poderosa força armada do mundo. E depois
de Hussein, que outro monstro os incompetentes políticos, que querem impor uma
"nova ordem mundial", irão criar?
(Artigo
publicado na página 18, Internacional, do Correio Popular, em 15 de fevereiro
de 1991).
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