Anseio justo, mas inoportuno
Pedro J. Bondaczuk
A
declaração unilateral de independência da Lituânia completou, ontem, o primeiro
mês, com ambas as partes mantendo-se irredutíveis em suas posições. Sem
descartar a legitimidade da reivindicação lituana, uma coisa não se pode negar.
A tentativa de secessão não poderia ocorrer num momento mais inoportuno, quando
as superpotências estão empenhadas em delicadas negociações, objetivando
estruturar a nova arquitetura européia. A questão, no nosso entender de
importância secundária, (tanto no contexto da Europa quanto, principalmente, no
mundial), vem dispersando forças e energia de um dos principais arquitetos
destes novos tempos: o presidente soviético Mikhail Gorbachev, que além de tudo
vê a instabilidade de seu próprio cargo se tornar maior.
A
Casa Branca percebeu bem essa situação. Daí a cautela de Washington no trato
desse delicadíssimo tema. O presidente George Bush (como de resto todos os
dirigentes ocidentais) não esconde suas simpatias pelo sonho autonomista dos
lituanos. Todavia, como estadista que é, não pode colocar as preferências
pessoais acima dos interesses do seu país e dos aliados. Para o mundo, é
importante que o Leste europeu consolide as incipientes democracias que
surgiram em fins do ano passado. Que, consolidando as reformas políticas, se
verifiquem as mudanças econômicas, na direção de uma economia de mercado,
sepultando de vez o sistema falido das economias centralizadas e planificadas.
Que o processo de reunificação das Alemanhas, que sempre se soube que um dia
ocorreria, se dê sem traumas e sem que se desestabilize o frágil sistema de
segurança européia.
Todos
estes são temas delicadíssimos, que envolvem muito mais gente do que os 3,8
milhões de lituanos e interesses bem mais elevados do que as pretensões
autonomistas desse povo. Pode parecer uma colocação cínica, mas ela é,
sobretudo, realista. Seria uma estupidez sacrificar-se coisas fundamentais em
troca de algo que pode esperar. Até porque, no momento, a Lituânia não teria condições
de caminhar com seus próprios pés. Precisaria de uma injeção maciça de capitais
para se tornar um país viável.
Só
o fato de ter que comprar seu petróleo a preço de mercado, sem os subsídios que
recebe de Moscou atualmente, já seria suficiente para arrebentar sua economia,
que já não é das mais sadias. É tolice colher frutos de uma árvore antes que
eles estejam maduros e prontos para a colheita. a independência da Lituânia,
possivelmente, virá, mas no seu tempo certo. No contexto de uma nova Europa,
que vai substituir o confronto e a desconfiança que imperaram ao longo de
séculos, pelo entendimento e cooperação. Esta era está, ao que tudo indica,
bastante próxima, desde que tolas precipitações não venham a estragar um
trabalho diligente e cheio de paciência de muitos anos.
(Artigo
publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 12 de abril de
1990)
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