Monday, October 10, 2016

Homem permanece insensível aos sofrimentos numa guerra


Pedro J. Bondaczuk


O ex-secretário de Estado norte-americano, John Foster Dulles, que ocupou este cargo durante a gestão do presidente Dwight David Eisenhower, disse que "o mundo nunca terá uma paz duradoura enquanto os homens reservarem para a guerra as mais elevadas qualidades humanas".

A tecnologia mais sofisticada, a soma de recursos de maior porte, as maiores inteligências do Planeta estão hoje empenhadas não em pesquisar, financiar e desenvolver máquinas, sistemas e idéias tendentes a tornar a vida dos povos melhor, mas para a supressão dela.

Pretexto para guerrear nunca faltou e jamais irá faltar. Conflitos de interesse são comuns nesse animal que usa o dom de pensar, a qualidade de consciência, como um ato de permanente suicídio.

Nos 15 mil anos de história que têm alguma espécie de registro, a humanidade viveu em paz algo em torno de 5%. Ainda assim, diante de tanta desgraça, ruína moral e destruição, não aprendeu nada. O conflito do Golfo Pérsico, travado pretensamente em nome de princípios elevados --- nenhum guerreiro, como Átila, Gengis Khan ou Hitler, jamais disse que sua guerra não foi por alguma causa nobre --- revela algo muito mais assustador do que aquilo que pôde ser constatado em conflitos anteriores: a insensibilidade humana diante dos sofrimentos alheios.

Raramente se ouviu, ou se leu em algum lugar em seus 38 dias de duração, alguma opinião neutra, despida de sectarismo acerca desse drama. Os piromaníacos, os partidários de Tanatos, mitológico deus grego da destruição, preponderaram e invariavelmente na mídia.

As análises feitas em torno do conflito focalizaram o aparato bélico empregado, ou existente em ambos os lados, a televisão tratou os bombardeios contra Bagdá como espetáculo pirotécnico --- houve até quem dissesse publicamente que as cenas eram "maravilhosas" --- se falou do aspecto econômico, do político, do ecológico, mas nunca do ético.

Não se condenou, a não ser marginalmente, de passagem, a supressão de vidas inocentes, de pessoas alheias aos acontecimentos, que nada têm a ver com as ambições desmedidas e insensatas dos políticos, mas que somente querem paz e tranqüilidade para trabalhar e prosperar.

Tomou-se partido, de acordo com a eficiência da propaganda deste ou daquele lado, como se pudesse existir "razão" em meio à irracionalidade do assassinato consentido. Quando um não quer, dois não brigam. Ambas as partes estão erradas.

Não se pode falar, portanto, em "nova era", numa ordem mundial mais justa e evoluída, com a mentalidade predominante. Até porque, o dinheiro empregado nesta loucura, nesta histeria coletiva, daria para alfabetizar um bilhão de analfabetos do mundo, alimentar os 500 milhões de famintos, prover moradia aos 100 milhões que vivem ao relento e ainda, de quebra, erradicar para sempre as principais doenças epidêmicas. E há ainda quem ache que o homem é um animal racional...

(Artigo publicado na página 18, Internacional, do Correio Popular, em 24 de fevereiro de 1991).


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