Que se salve o Rio
Pedro J. Bondaczuk
A
cidade do Rio de Janeiro, ex-capital federal, cantada e decantada em verso e
prosa pelas suas belezas naturais e pela alegria do seu povo, está de novo nas
manchetes internacionais. Esta inserção, todavia, não se dá em decorrência do
Carnaval, que ainda está relativamente distante, tido e havido como a maior
festa popular do Planeta.
Não ocorre por causa dos seus magníficos museus, da
sua esplêndida biblioteca nacional, ou das suas casas de espetáculo. Nem por suas
praias, onde desfila, sob o sol, a beleza brasileira. Não se verifica, também,
por causa da festa do futebol, num Maracanã lotado, com multidões coloridas
torcendo pacificamente por seus clubes. A violência nos estádios matou o
esporte.
O Rio de Janeiro está nas manchetes nacionais e
internacionais em virtude de uma guerra civil não declarada. Por causa do crime
organizado que se entrincheirou nos morros que cercam a cidade, fazendo 1,5
milhão de reféns, num mega-seqüestro sinistro, digno de figurar no Guiness, o
badalado livro dos recordes mundiais.
Exagero? Quem achar que seja, que vá conferir por
sua conta e risco. A violência, na ex-capital federal, atingiu o limite do
tolerável. As autoridades mostram-se absolutamente incapazes de garantir a
segurança de quem quer que seja. Até mesmo a própria, já que várias delegacias
se transformaram em trincheiras, repletas de barricadas, para resistir a
ataques de marginais, que se sucedem, para libertar companheiros de crime que
estejam presos ou vingar alguma morte.
A corrupção e o medo espalharam-se pelo Rio como
metástases, ramificações malévolas de um câncer. Traficantes e bicheiros
ameaçam, corrompem, conspurcam, subornam e matam impunemente e seu atrevimento
não tem mais limites.
A violência urbana, na ex-Cidade Maravilhosa, ceifa
mais vidas, hoje, do que as perdidas em Sarajevo, na Bósnia, em plena guerra
civil. Uma eleição para a escolha de deputados estaduais e federais teve que
ser anulada por causa de fraudes.
Os bandidos, mostrando absoluto desprezo pela ordem
constituída, chegam a ameaçar de morte os juizes que procediam à recontagem de
votos. Que tremenda tragédia se abateu sobre a população carioca, tão alegre,
versátil e hospitaleira, no passado, e hoje à mercê do medo e da incerteza!
Daí a certeza de que uma intervenção federal na
cidade está tardando em demasia. No pé em que as coisas estão, o Rio de Janeiro
deixou de ser capital de um Estado, para se transformar num império de
traficantes, de ladrões e de seqüestradores.
Torna-se indispensável uma “cirurgia radical”. Urge
a restauração da autoridade, mesmo que para isso seja preciso o recurso à
força. Requer-se uma ação decisiva e fulminante, que quebre a espinha dorsal do
crime organizado e coloque os seus chefões atrás das grades.
Os turistas, que sempre foram fonte importante de
renda para a cidade – e para o País – cancelam viagens, por temor da violência.
Importantes instituições financeiras internacionais mudam suas sedes para
outros lugares. Empresas fecham suas portas, sem condições de operar. Na medida
em que o poder dos narcotraficantes cresce, as perspectivas da população se
reduzem.
Políticos irresponsáveis tentam “tapar o sol com a
peneira” e passar uma falsa impressão de normalidade, mediante, inclusive,
caras campanhas institucionais na televisão. Melhor fariam se investissem esses
recursos no aparelhamento da polícia, no treinamento dos agentes da lei e num
salário digno a eles, que lhes permitisse resistir às tentações de suborno.
O Rio de Janeiro tem jeito! Mas é preciso que o
governo desperte de sua letargia e resolva agir. Faz-se urgente a restituição,
à cidade, do seu “status” de maravilhosa e sua devolução aos legítimos donos: a
laboriosa e honesta população carioca, com sua alegria contagiante e todo o seu
decantado “fairplay”.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, da Folha do
Taquaral, em 29 de outubro de 1994).
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