Sunday, April 03, 2016

Coração acima da razão

Pedro J. Bondaczuk

O esquecimento é tremenda injustiça que as novas gerações cometem em relação aos idealistas, aos competentes, aos realizadores, aos que dedicam uma vida inteira a alguma causa que beneficie a humanidade, aos abnegados, aos altruístas enfim. Tenho batido insistentemente nessa tecla e nem sempre sou bem compreendido. Não faz mal! Meu leitor assíduo é testemunha do meu empenho para manter viva a memória principalmente dos bons escritores que, tão logo morrem, caem em completo esquecimento, como se nem mesmo tivessem existido. E todos perdem com isso. Aliás, quem perde menos (ou rigorosamente nada) é exatamente o esquecido. Afinal, morto, não lhe faz a menor diferença se for lembrado ou não. Porém as pessoas que estão formando opinião sobre a vida, o mundo e tudo o que nos cerca, perdem preciosas referências, indispensáveis oportunidade de enriquecer suas idéias.

Faço o que faço também pensando na minha própria situação. Ajo assim na esperança (que espero não seja vã) que alguém, algum dia, em algum lugar, em futuro distante, tenha a mesma preocupação em relação à minha obra, resgatando-a e evitando que se perca no vazio, como se nunca houvesse sido produzida e como se eu jamais tenha existido. E, creiam-me, não se trata de vaidade. É questão sumamente prática, além de representar justiça para quem não se omite, mas age sempre, e sempre e sempre enquanto vivo. Se for para ser esquecido, não faz o menor sentido a dedicação, a responsabilidade, o empenho, o sacrifício com a privação de tanta coisa boa que a vida oferece para a produção de alguma obra, literária ou de qualquer natureza.

Por isso, sempre que posso, e utilizando, vez ou outra, como “gancho”, o centenário de nascimento ou de morte de determinado escritor (ou de qualquer grande realizador), trago à baila para as novas gerações, quem foi e, sobretudo, o que fez. Foi o que fiz, por exemplo, nos dias anteriores em relação ao escritor português Vergílio Ferreira, sobre o qual teci alguns comentários e que mereceria muito mais, pela excelência da sua produção. A idéia inicial era a de escrever longo e detalhado ensaio a propósito. Todavia, outros assuntos se impõem e se tornam mais atuais. E não posso frustrar as expectativas dos leitores. Não abandonei, porém, a intenção original, embora me proponha a cumpri-la apenas em ocasião mais oportuna. Tomara que ela surja.

Pesquisando em enciclopédias e no Google para elaborar uma pauta a ser seguida neste ano, encontrei poucos centenários de nascimento e de morte de escritores que ocorrerão em 2016. Provavelmente, deve haver muitos, mas de autores tão “esquecidos”, que nenhuma fonte sequer os menciona. Uma lástima! E, principalmente, enorme injustiça, além de irreparável perda para as novas gerações. Localizei menções de três centenários de nascimento. Um deles, o de Vergílio Ferreira, já abordei, embora, reitero, não da forma que pretendia e que ele merece. Os outros dois que detectei vão ocorrer, apenas, no mês final do ano: o do poeta matogrossense Manoel de Barros, falecido em novembro de 2014 e que completaria cem anos de idade em 19 de dezembro  e o do folclorista, jornalista e escritor Luís Cristóvão dos Santos, falecido em 1997 e que aniversaria no Natal. Se tudo transcorrer como planejo, tratarei de ambos nessa ocasião. Por hoje, fica, apenas, o registro.

Quanto aos centenários de morte, localizei quatro. O primeiro é o do político, escritor, jornalista e médico gaúcho, Ramiro Barcelos. Ele nasceu em 23 de agosto de 1851 e morreu em 28 de janeiro de 1916, aos 65 anos de idade. Tratarei da sua vida e sua obra, portanto, ainda no final do corrente mês. Em fevereiro, vão se completar outros dois centenários de morte: no dia 2, o do escritor, educador e jornalista paraense José Veríssimo (nascido em 8 de abril de 1857) e, no dia 19, o do advogado, romancista e contista Afonso Arinos de Melo Franco (que nasceu em 1º de maio de 1868). Finalmente, a pauta do ano será completada em 6 de outubro, com o centenário da morte do engenheiro, jornalista, professor, contista e teatrólogo Manoel Ferreira Garcia Redondo, nascido em 7 de janeiro de 1854.

O consagrado escritor colombiano Gabriel Garcia Marquez (querido Gabo!!!), ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de 1982, tinha opinião bastante pitoresca sobre essa questão de esquecimento (com, a qual concordo plenamente). O autor de “Cem anos de solidão” escreveu, certa feita: “Lembre-se: é fácil esquecer para quem tem memória, difícil é esquecer para quem tem coração”. Ou seja, para quem não se limita a raciocinar, mas se emociona com os que dedicam a vida para fazer algo que mereça gratidão e eterna lembrança (embora essa “eternidade” seja, óbvio, absoluta impossibilidade para nós, efêmeros humanos). Pois é assim que pauto minha vida. Embora sem abrir mão da razão, priorizo o coração em meu comportamento. Daí empenhar-me para nunca esquecer (e batalhar para que outros jamais esqueçam) aqueles que merecem ser lembrados, mas ás vezes não são.


Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk 

No comments: