Cúpula de extremistas
Pedro J. Bondaczuk
As
reuniões de cúpula parece que estão entrando na moda ultimamente, após o
histórico encontro entre o presidente norte-americano, Ronald Reagan, e o líder
soviético, Mikhail Gorbachev, levado a efeito em novembro passado, em Genebra.
Depois desse evento político, já houve outro do gênero dos países da Liga
Árabe. Mais um, este da Conferência Islâmica, desenvolveu-se nesta semana, em
Fez, no Marrocos. E há uma reunião de cúpula programada, ainda sem data definida,
entre todos os presidentes da América Latina, a ser realizada no Panamá, para
discutir a dívida externa da região.
Ontem, conforme informou um jornal da Irlanda, foi marcado mais um
encontro do gênero. Trata-se da "cúpula do terrorismo internacional".
É
evidente que os participantes desse "diálogo" precisarão agir de
forma inversa àquela com que agem os governantes legítimos, que têm se reunido
para tentar solucionar suas controvérsias. O encontro, por razões óbvias, terá
que ser sigiloso, sem nenhuma espécie de promoção ou propaganda, o mais secreto
possível. Caso contrário...Israel e Estados Unidos poderão "estragar a
festa".
Essa
bizarra conferência foi proposta por um dos extremistas mais procurados da
atualidade, com a cabeça a prêmio, depois que o Departamento de Estado
norte-americano ofereceu uma recompensa de US$ 250 mil para quem tiver qualquer
informação sobre o seu paradeiro: o palestino Mohammed Abbas.
Se
o leitor não conseguiu associar esse nome a ninguém, recordamos que essa
"personalidade underground" foi acusada de planejar e coordenar o
barulhento seqüestro do transatlântico italiano Achille Lauro, em outubro
passado. Preso pelos norte-americanos e entregue às autoridades da Itália, o
terrorista foi por elas libertado dois dias depois. A libertação causou uma
crise no governo italiano.
Depois
de permanecer estrategicamente amoitado, por quase noventa dias, agora Abbas
vem de conceder uma entrevista ao jornal irlandês "Irish Times", na
qual faz a ousada convocação. Se a conferência de cúpula será ou não realizada,
dificilmente a opinião pública tomará ciência. Entretanto, poderá desconfiar
que sim se os atos terroristas aumentarem de intensidade, especialmente contra
pessoas e propriedades de Israel e dos Estados Unidos. Afinal, esse encontro,
segundo Abbas, destina-se exatamente a isso. A declarar guerra total a esses
dois países.
Muita
gente (até alguns profissionais de jornalismo) parece estar confundindo as
coisas e achando que os grupos voltados à prática de atos de terror estão
amedrontados diante das tentativas do presidente Ronald Reagan, de dar o troco
aos atentados por eles perpetrados. Lemos estes dias, inclusive, em um
editorial, que após a ação desenvolvida contra os seqüestradores do Achille
Lauro, os seqüestros pararam.
Em
primeiro lugar, isso não é verdade, já que depois dessa operação ocorreu o caso
do Boeing da Egyptair, desviado para Malta e que um comando egípcio
(desastradamente) tentou resgatar. Em segundo, a temporada de caça ainda não
foi aberta. Se o leitor atentar bem, em todos os anos esse tipo de delito
ocorre sempre na mesma época. Acontece, geralmente, do mês de junho em diante,
que é quando começa o verão no Hemisfério Norte e os norte-americanos
"batem asas" rumo ao Oriente Médio e às praias do Mediterrâneo, quando
não para as ilhas gregas.
Raríssimos
foram os casos de seqüestro de avião naquela área fora desse período.
Atualmente é inverno nessa explosiva região e os turistas preferem gozar das
delícias do sol no Brasil, onde de quebra assistem ao maior espetáculo popular
do mundo, que é o nosso Carnaval, além de darem uma "esticadinha"
para os mares do Sul. E como todos sabem, por estes nossos lados, tais
expedientes de violência política são raridades que ocorrem uma vez ou outra, e
assim mesmo praticados por paranóicos, sem nenhuma motivação política. O máximo
risco que os visitantes correm é o de serem assaltados no Rio de Janeiro, mas
esta é uma outra história.
Pode
até ser que, finalmente, Israel e Estados Unidos descubram uma maneira de
neutralizar o terror. Mas se as coisas tiverem um desenvolvimento lógico (e
nesses casos, em geral, infelizmente têm), o que se pode esperar, para o
segundo semestre de 1986, é um aumento desmesurado de atentados, seqüestros e
invasões de embaixadas. Isto com, ou sem, a realização da reunião de cúpula dos
grupos terroristas.
(Artigo
publicado na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 10 de janeiro de
1986)
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