Wednesday, September 09, 2015

Justo tributo a uma “fênix” das artes cênicas

Pedro J. Bondaczuk

A importância de William Shakespeare é tão grande, notadamente para a dramaturgia mundial, que ele “ganhou”, em fins do século passado, uma espécie de “templo”, onde sua memória é reverenciada e onde suas geniais peças são representadas pelas melhores companhias teatrais inglesas. Trata-se do “The New Globe Theatre”, que hoje é uma espécie de ponto turístico de Londres, visitado por turistas do mundo todo, inclusive pelos que nunca pisaram em um teatro em suas vidas, mas que sabem, mesmo que apenas por alto, quem foi o ilustre dramaturgo ao qual ele é dedicado. A idéia dos promotores dessa oportuna homenagem foi a de reproduzir, com a maior fidelidade possível, a casa de espetáculos original, da era elisabetana, com esse mesmo nome (sem o “New”, evidentemente), da qual o bardo inglês, inclusive, foi um dos sócios.

Os “The Globe”, tanto o original, quanto o “genérico”, têm suas histórias marcadas por obstáculos e tragédias. O primeiro deles foi construído em 1599, no “borough” (uma espécie de distrito) de Southwark, em uma área que era chamada de Bankside. Localizava-se na margem esquerda do Rio Tâmisa e aproveitava a estrutura inacabada do que foi o primeiro teatro de toda a Inglaterra, construído ali pelo ator James Burbage em 1576, mas que foi demolido, por ordem das autoridades londrinas, em 1598, quando teve a licença cassada pelo risco que apresentava à segurança dos espectadores (pelo menos esta foi a razão alegada). Pois bem, da ruína do que era conhecido, apenas, como “The Theatre” brotou o primeiro “The Globe”.

Durante catorze anos, as coisas transcorreram normalmente no local. O teatro manteve-se como uma das principais, se não a principal casa de espetáculos de Londres. Ali foram encenadas algumas das principais peças de Shakespeare, como “Hamlet” e “Reri Lear”, entre tantas outras. Outras companhias teatrais também encenaram produções, de outros autores, que não o bardo inglês, sem nenhum problema. Mas... em 1613 ocorreu um acidente, que poderia ter se tornado uma tragédia (felizmente não se tornou). O “The Globe” foi completamente destruído por um incêndio. Seu teto de palha pegou fogo, durante uma encenação da peça Henrique VIII. Foi atingido pela munição de um canhão utilizado em cena. Dezenas de pessoas, entre atores e público presente, se esforçaram para tentar apagar as chamas. Não conseguiram. Em menos de duas horas, o “The Globe” foi completamente destruído.

Sua reconstrução, no entanto, se deu em questão de meses, e nesse mesmo ano, em 1613. Ele permaneceu em atividade pelos próximos 29 anos, até 1642. Mas... nessa ocasião, a Inglaterra foi abalada por imensa ebulição política. Foi palco de sangrenta guerra civil, que propiciou a ascensão ao poder dos puritanos, liderados por Oliver Cromwell. E estes viam no teatro nada mais do que algo “satânico”, fonte de corrupção moral e de maus costumes. Ah, esses fanáticos!!! Tendem a confundir, invariavelmente, “alhos com bugalhos”. Cromwell, primeiro, determinou o fechamento sumário do “The Globe”. Dois anos depois, em 1644, todavia, determinou sua completa demolição, o que de fato foi feito.

A idéia de “ressuscitar” o velho teatro surgiria, apenas, três séculos e cinco anos após sua definitiva destruição. Foi em 1949, quando o diretor e produtor norte-americano, Sam Wanamaker, fidelíssimo admirador da obra teatral de William Shakespeare, visitou Londres. Porém, da idéia inicial à sua efetiva concretização passou um tempo enorme. O projeto foi posto em execução somente em fins dos anos 80 e início dos 90 do século passado. O local escolhido para a obra fica a somente 200 metros do “The Globe” original, em que Shakespeare atuou por tantos anos. Foram feitas meticulosas pesquisas arquitetônicas para que o novo teatro fosse o mais próximo possível daquele da era elisabetana. Mas...

Isso mesmo, houve novo “mas” nessa história. Em 1993, Sam Wanamaker faleceu. Porém, a essa altura, o esqueleto do “The New Globe” já estava de pé. Pensou-se, primeiro, em abandonar o projeto, o que seria uma pena. Não se abandonou (felizmente). E assim, três anos depois, o teatro foi finalizado e reaberto, com pompa e circunstância. A reinauguração oficial deu-se em 1997, com um espetáculo de gala. A casa de espetáculo, que apesar de guardar as características arquitetônicas da original, do século XVII, é uma moderna e confortável construção, foi batizada, oficialmente, como “Shakespeare's Globe Theatre”. Nada mais justo para um gênio, questionado estupidamente por muitos, que estão ávidos por “surfar” em sua fama. É um oportuníssimo tributo a essa autêntica “fênix” da arte dramática, que conseguiu “renascer” depois de uns dois séculos de completo esquecimento.


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