Wednesday, September 23, 2015

Acordei, dia desses, com determinada música no ouvido, que insistia em vir à memória com força, o dia todo, sem parar. Não se tratava de nenhum rock, ou aché ou algum desses tantos ritmos exóticos (quando não ridículos) e caricatos da moda. Era melodia antiga, antiqüíssima, de 1951, quando eu era um menino de oito anos de idade, com a cabeça cheia de sonhos e o coração repleto de poesia. Aos poucos, também a letra foi desfilando, nítida, completa, inteira, na memória, como se eu a tivesse ouvido na véspera. Tratava-se de um baião, mas não de Luiz Gonzaga, como poderia se pensar, mas de Hervê Cordovil, e que fez estrondoso sucesso na época, gravado por um monte de cantores (não mencionarei nenhum, para não cometer injustiças). Ouvi-a uma quantidade de vezes sem fim no rádio e nunca me enjoei dessa música. A letra, em sua singeleza e brejeirice, é um delicado poema de amor, delicioso para os ouvidos de quem, como eu, ama profundamente a poesia. Não tem, como as de hoje, nenhuma alusão escatológica, que deixe nem que remotamente implícito (como as atuais deixam) que o amor não passa de mera relação sexual. Passa, evidentemente. É muito mais do que isso!!! Pobre de quem não tem esse entendimento. E são muitos que não o têm, creiam-me!!! Sintam o lirismo, o encanto, a brejeirice e o frescor da letra do baião “Esta noite serenou”:

“Morena quem te contou
que esta noite serenou?
Eu, deitado no teu colo,
sereno não me molhou.

 Se caísse chuva forte, morena,
eu talvez não sentiria.
Teu amor é uma guarita, morena,
onde eu me esconderia.
Tão bom, tão bom, tão bom.

Se fizesse muito frio, morena,
eu talvez não sentiria.
Eu deitado no teu colo, morena,
teu amor me aqueceria,
tão bom, tão bom, tão bom”.


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