Crise
econômica vem de longe
Pedro J. Bondaczuk
O presidente Mikhail Gorbachev apostou todo o seu
destino enquanto homem público, toda a sua carreira política, na Perestroika.
Frisou, em inúmeras oportunidades, que sabia das dificuldades que iria enfrentar
e que tinha consciência dos adversários que teria de superar, não mediante a
violência, mas através de seus argumentos.
Objetivamente, o que ele pretende resvala para o
terreno da utopia. Deseja fazer a fusão de métodos capitalistas na gestão da
economia – com a implantação de um sistema de mercado – com postulados
socialistas, no que diz respeito à distribuição de riquezas.
Aparentemente, é uma tarefa irrealizável.
Assemelha-se a misturar água e óleo. Todavia, nem todos pensam dessa forma.
Gente muito experiente e tarimbada, como Hermann Kahn, por exemplo, muito
popular em fins dos anos 60 pelos seus exercícios de futurologia, achava tal
fusão não apenas possível, como desejável.
Numa entrevista que concedeu, em fevereiro de 1977,
o gênio do Instituto Hudson afirmou: “A longo prazo o mundo será quase todo, ou
todo socialista. Um bom capitalismo produz o socialismo”. Evidentemente, não o
comunismo. E não é este que Gorbachev pretende conservar. Muito pelo contrário,
seu empenho é o de ser coveiro desse sistema, que levou o seu país ao atual
estado de desorganização e caos.
Os críticos do presidente soviético ou têm má
memória ou são muito mal intencionados. Tanto os conservadores comunistas
quanto os ditos reformistas radicais querem somente o poder a qualquer custo,
sem se importar com as conseqüências de suas ações.
O líder do Cremlin assumiu uma massa falida ao
ascender ao cargo máximo da URSS, em março de 1985. Não foi ele, portanto, nem
seu projeto de mudanças que afundaram a nação. Desde o início dos anos 70, a
economia nacional já dava sinais de exaustão em virtude, tanto de uma gestão
desastrada e incompetente dos cardeais do Partido Comunista, quanto dos gastos
insuportáveis na corrida armamentista nuclear com os Estados Unidos.
Em 1985, portanto seis anos antes da atual crise, o
economista soviético Georges Sokoloff constatou, no estudo “As Fontes do poder
Soviético, a Economia, a População e os Recursos”: “Apesar dos seus
investimentos e esforços notáveis, a União Soviética conserva uma economia subdesenvolvida.
A estrutura do seu comércio exterior com o Ocidente lembra um país em vias de
desenvolvimento. Esta impressão é confirmada pelo crescimento rápido de sua
dívida externa em divisas conversíveis desde que o poder decidiu abrir a
economia para atenuar as insuficiências do seu patrimônio nacional. Para
compreender essa situação é preciso considerar a enorme sangria que representa
a busca da parida militar com os Estados Unidos”.
Quando Gorbachev assumiu, a crise já era gravíssima.
Ele pegou nas mãos uma autêntica bomba de tempo que iria explodir a qualquer
momento. O desmonte do sistema centralizado de gestão econômica era algo que
sequer poderia ser cogitado no país, sob pena de quem ousasse fazer isso acabar
parando em algum manicômio.
O presidente soviético, todavia, ousou, movido por
um empenho sincero em salvar o país da falência, não somente em planejar isso,
mas em tentar executar. Entre continuar alimentando uma mentira triunfalista, e
salvar a URSS, optou pelo gesto patriótico, mesmo consciente dos riscos que
estava correndo.
(Artigo publicado na página 15, Internacional, do
Correio Popular, em 24 de abril de 1991)
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