Embargo redundante
Pedro J. Bondaczuk
Os bastidores da guerra entre o Irã e o Iraque têm muito
mais coisas escondidas, jamais sequer insinuadas ao público, do que as
manifestações oficiais que se fazem. Muita gente já ganhou fortunas em cima do
conflito, não somente com a venda de armamentos aos contendores, mas também com
a compra de petróleo em melhores condições todas as vezes que algum deles se vê
apertado para fazer caixa que lhe permita sustentar seu esforço bélico.
Quando o escândalo Irã-contras veio à tona, as
primeiras revelações permitiram que o observador meticuloso pudesse contar
quantos países estavam envolvidos no “affaire”. E estes somaram qualquer coisa
em torno de 27.
O embargo de armas proposto pelo governo do
presidente Ronald Reagan, portanto, não passa de extemporânea tentativa de
expiar culpas passadas. Aliás, por parte dos Estados Unidos e de seus aliados
da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), essa providência sequer
seria necessária.
Caso seja adotada, vai ser redundante, já que está
em vigor, ainda, uma determinação nesse sentido (de não vender material bélico
para a República Islâmica), imposta em 1980, quando da ocupação, por parte dos
fundamentalistas, da embaixada norte-americana em Teerã. Quantos respeitaram a medida?
Difícil, senão impossível, de se responder.
Outra pergunta que se faz é sobre a razão de tamanha
parcialidade em relação aos iranianos. Afinal, não foram eles que começaram a
guerra; os primeiros ataques a navios no Golfo Pérsico foram do Iraque. E se os
aiatolás não desejarem manter conversações de paz, é porque sabem que os que
mais se batem pela medida são exatamente os que mais lucraram com a guerra.
Depor armas, agora, significaria, para os iranianos, uma
capitulação. Eles passaram metade do conflito com um terço do seu território
sob ocupação militar do inimigo. Por que o embargo não é, também, proposto
contra o Iraque? Quem pode garantir que a aceitação, por parte de Bagdá, do
cessar-fogo previsto pela Resolução 598 do Conselho de Segurança da ONU, é
sincera? Afinal, os iraquianos violaram diversas convenções internacionais que
regulam guerras, como a que proíbe uso de armas químicas; a da proteção à
população civil e outras tantas mais.
O açodamento com que a medida é propalada deixa o
observador desconfiado que se está fazendo o jogo dos vendedores “freelancers”.
Os lucros que estes obtiveram no sete anos de guerra são tão altos, que chegam
a ser impossíveis de se contabilizar.
Seria muita ingenuidade achar que uma medida dessa
natureza, mesmo envolvendo Estados Unidos e União Soviética, possa surtir
qualquer efeito que não seja o incremento do comércio clandestino. O caminho
para o fim da guerra no Golfo não passa por aí e as superpotências sabem muito
bem disso. Então por que essa política de cinismo e de hipocrisia?
(Artigo publicado na página 12, Internacional, do
Correio Popular, em 23 de dezembro de 1987).
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