Tuesday, September 08, 2015

Embargo redundante


Pedro J. Bondaczuk


Os bastidores da guerra entre o Irã e o Iraque têm muito mais coisas escondidas, jamais sequer insinuadas ao público, do que as manifestações oficiais que se fazem. Muita gente já ganhou fortunas em cima do conflito, não somente com a venda de armamentos aos contendores, mas também com a compra de petróleo em melhores condições todas as vezes que algum deles se vê apertado para fazer caixa que lhe permita sustentar seu esforço bélico.

Quando o escândalo Irã-contras veio à tona, as primeiras revelações permitiram que o observador meticuloso pudesse contar quantos países estavam envolvidos no “affaire”. E estes somaram qualquer coisa em torno de 27.

O embargo de armas proposto pelo governo do presidente Ronald Reagan, portanto, não passa de extemporânea tentativa de expiar culpas passadas. Aliás, por parte dos Estados Unidos e de seus aliados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), essa providência sequer seria necessária.

Caso seja adotada, vai ser redundante, já que está em vigor, ainda, uma determinação nesse sentido (de não vender material bélico para a República Islâmica), imposta em 1980, quando da ocupação, por parte dos fundamentalistas, da embaixada norte-americana em Teerã. Quantos respeitaram a medida? Difícil, senão impossível, de se responder.

Outra pergunta que se faz é sobre a razão de tamanha parcialidade em relação aos iranianos. Afinal, não foram eles que começaram a guerra; os primeiros ataques a navios no Golfo Pérsico foram do Iraque. E se os aiatolás não desejarem manter conversações de paz, é porque sabem que os que mais se batem pela medida são exatamente os que mais lucraram com a guerra.

Depor armas, agora, significaria, para os iranianos, uma capitulação. Eles passaram metade do conflito com um terço do seu território sob ocupação militar do inimigo. Por que o embargo não é, também, proposto contra o Iraque? Quem pode garantir que a aceitação, por parte de Bagdá, do cessar-fogo previsto pela Resolução 598 do Conselho de Segurança da ONU, é sincera? Afinal, os iraquianos violaram diversas convenções internacionais que regulam guerras, como a que proíbe uso de armas químicas; a da proteção à população civil e outras tantas mais.

O açodamento com que a medida é propalada deixa o observador desconfiado que se está fazendo o jogo dos vendedores “freelancers”. Os lucros que estes obtiveram no sete anos de guerra são tão altos, que chegam a ser impossíveis de se contabilizar.

Seria muita ingenuidade achar que uma medida dessa natureza, mesmo envolvendo Estados Unidos e União Soviética, possa surtir qualquer efeito que não seja o incremento do comércio clandestino. O caminho para o fim da guerra no Golfo não passa por aí e as superpotências sabem muito bem disso. Então por que essa política de cinismo e de hipocrisia?

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 23 de dezembro de 1987).


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