Como extrair o melhor
de Shakespeare
Pedro
J. Bondaczuk
As peças de William
Shakespeare foram escritas para serem encenadas no palco e não para serem
livros. Certo? Creio que certíssimo!!! A
conclusão me parece lógica e, mais do que isso, óbvia. Não fosse assim, as
histórias que contou seriam redigidas em forma de romance e não de peças
teatrais, concordam? Todavia, há tamanho conteúdo filosófico e comportamental
nas falas que criou para seus personagens, que a melhor maneira de aproveitar a
genialidade do bardo inglês é a de apreciá-lo duplamente. Ou seja, assistindo a
encenação de suas peças e, posteriormente, lendo-as. Contudo, essa leitura não
pode ser feita com toda a atenção concentrada exclusivamente no enredo. Para
isso, para apreciar apenas a história, o ideal é assistir sua representação no
teatro. Porém, para extrair toda a sabedoria e beleza de suas observações, nada
como a leitura. E acompanhada de uma caneta ou lápis, para grifar as principais
citações. Creiam-me, estas não faltam. Pelo contrário, abundam.
Raramente encontrei em
peças de outro autor teatral tanta coisa que me fez refletir, sobretudo sobre
amor, ciúmes, traição, vida, morte, e vai por aí adiante. Nesse aspecto,
Shakespeare é imbatível. Confesso (e essa confidência não fiz para ninguém, até
hoje, pela certeza de ser incompreendido), que pela primeira vez que li um
livro do bardo inglês, detestei. Achei-o monótono, empolado, repetitivo e até
um tanto piegas. Só que, quando fiz essa primeira leitura, eu nada entendia da
vida e muito menos de literatura. Pudera! Tinha, apenas, treze anos de idade.
Tudo começou a mudar sete anos depois, quando tive a oportunidade de assistir,
pela primeira vez, a uma peça de Shakespeare, encenada em um teatro de São
Paulo. E foi, justamente, “Romeu e Julieta”.
Após essa experiência,
lembrei-me que tinha esse livro e que o havia detestado quando o tinha lido. O
que fiz? Decidi fazer a releitura (hábito que adquiri desde então e que
mantenho até hoje). Só que, ao contrário do que havia feito antes, quando todo
o foco da minha atenção se concentrara no enredo, passei a analisar o conteúdo
das “falas”. Cada uma que eu desconfiava haver uma mensagem de vida, li e reli
várias vezes, meditando a respeito. Só então consegui testemunhar a genialidade
de Shakespeare. Depois disso, adquiri os livros de várias outras peças, até
poder contar com a totalidade de sua obra teatral. Nem todas as peças eu pude
ver encenadas no teatro, até porque, muitas delas nunca o foram (pelo menos não
em São Paulo, onde eu residia).
Eu andava um tanto
envergonhado por haver detestado “Romeu e Julieta” quando a li pela primeira
vez, mesmo que isso tenha acontecido quando eu tinha só treze anos de idade.
Cheguei a contestar, intimamente, apenas por isso, meu bom gosto literário, mesmo
que tivesse me retratado sete anos depois. Esse sentimento íntimo, todavia,
mudou em 2012. Foi quando li, no portal da Editora Saraiva, matéria assinada
por Andréia Silva, publicada em 6 de julho daquele ano, tratando do lançamento
do livro “Quem escreveu Shakespeare?”, do professor norte-americano James
Shapiro. Ele estava no Brasil para participar da décima edição do Festival
Literário Internacional de Parati e aproveitou a ocasião para fazer esse
lançamento editorial. Recorde-se que esse escritor é tido e havido como um dos
maiores especialistas no mundo da obra do bardo inglês.
E por que me conformei
com o “pecado mortal” literário da minha adolescência ao ler a citada matéria?
Porque constatei que aquela primeira impressão que tive há tanto tempo e que
tanto me envergonhou, não era exclusivamente minha. O ilustre professor
confidenciou à Andreia Silva: “Quando li, eu detestei Shakespeare”. Eureka! Eu
não estava sozinho! Estava na companhia de um dos mais ilustres e acatados
mestres de literatura. E mais, especialista na obra de Shakespeare. Outra
coincidência, foi a idade em que Shapiro leu, pela primeira vez, uma obra do
genial dramaturgo (e detestou-a). “Eu tinha 13 anos quando estudei Romeu e
Julieta. Eu não entendi, não gostei. Mas resolvi que estudaria Shakespeare de
novo”, disse Shapiro. Ou seja, agiu exatamente como eu, sem tirar e nem pôr.
Andreia Silva
esclareceu o que foi que fez o ilustre professor mudar de idéia; “O
encantamento de Shapiro com as histórias do autor de Otelo, Rei Lear, Hamlet,
entre outros, deu-se quando ele assistiu às peças durante uma temporada com o
irmão em Londres. ‘Foi quando eu experimentei Shakespeare’”. Na citada matéria
do portal da Editora Saraiva, escrita após descontraído bate papo entre a
autora e o professor norte-americano, foi levantada a questão da (para mim)
estúpida dúvida sobre a autoria das peças e sonetos do bardo inglês, aliás,
tema de seu livro. E Shapiro declarou: “Não entendo essa ideia de que as
pessoas comuns não possam ser extraordinárias. 99,9% das pessoas
extraordinárias são comuns”. E não são?!
O curioso é que esta é
a mesmíssima opinião expressada pela doutora Mara Narciso, ao comentar um dos
meus textos sobre o genial dramaturgo. E sem ler a matéria de Andréia Silva, o
que não me admira e nem me surpreende levando em conta a inteligência e a
sensibilidade da nossa colunista do Literário.
Shapiro arrematou, em tom de brincadeira, a conversa: “Meu trabalho é
tornar doloroso para essas pessoas pensarem dessa forma”, Tomara que consiga.
Burrice também tem limites! Ou deveria ter... Claro que foi Shakespeare quem
escreveu Shakespeare!!!!
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