Sandinistas na berlinda
Pedro J. Bondaczuk
A derrubada de um avião
particular norte-americano, do tipo C-123, em território nicaragüense, ocorrida
no início deste mês, começa a produzir os esperados e naturais desdobramentos
políticos nos Estados Unidos, quando falta menos de um mês para as importantes
eleições legislativas nesse país.
Hábeis parlamentares
democratas procuram explorar a questão em seu favor e a demonstrar que o
governo do presidente Ronald Reagan, através da Agência Central de Inteligência
(CIA), de funcionários governamentais e de entidades particulares está violando
uma determinação legal, que proíbe a Casa Branca de prestar assistência direta
aos anti-sandinistas.
Os dois mais conceituados
jornais norte-americanos, o “The New York Times” e o “The Washington Post”,
publicaram, ontem, extensas matérias a propósito, fundamentando as acusações do
senador John Kerry a esse respeito. Essa aventura, precipitada e até mesmo
desastrada, pode, portanto, ter um preço muito alto para os republicanos, nas
urnas, no próximo mês e tornar bem mais difíceis os dois derradeiros anos de
gestão de Reagan.
Da
próxima eleição, com certeza, irão emergir os prováveis postulantes à Casa
Branca em 1988. Os democratas, há tempos afastados do poder, sabem que terão
que fazer, doravante, uma campanha muito mais agressiva e prematura do que a
desenvolvida pelo seu candidato presidencial em 1984, Walter Mondale, que além
de tudo tinha, contra ele, o ônus da participação na desastrada administração
de Jimmy Carter.
A
partir de agora, tudo o que eles acharem de errado, ou de irregular, no atual
governo, certamente vão explorar até as últimas conseqüências. E nenhum tema,
hoje em dia, presta-se melhor para exploração contra Reagan do que a maneira
com que ele vem conduzindo a crise centro-americana.
A
oposição está batendo, há tempos, na tecla de que, a prosseguir na atual
marcha, mais dia menos dia vão colocar os Estados Unidos numa outra guerra, a
exemplo da do Vietnã, só que desta feita bem no fundo do seu quintal. Insiste
em afirmar que a intervenção direta de tropas norte-americanas na Nicarágua é
apenas uma questão de tempo, principalmente em virtude da manifesta
incompetência dos mercenários somozistas, financiados pela Casa Branca, em
exercerem pressão efetiva sobre os sandinistas.
O
que o observador estranha é que, mesmo se dizendo contrários a essa escalada
militar na América Central, os democratas tenham cedido, em duas oportunidades
neste ano, sobre a questão e aprovado a ajuda militar solicitada por Reagan aos
rebeldes nicaragüenses, no valor de US$ 100 milhões. Houve, aí, no mínimo, uma
dissintonia entre o discurso e a prática.
De
qualquer maneira, não tenham dúvidas, essa será a principal temática a ser
explorada, já a partir de julho de 1987. A tese não-intervencionista conta com
relativo respaldo entre o eleitorado norte-americano. A prova disso foi o
sucesso da turnê do presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, no primeiro
semestre deste ano, por várias cidades dos Estados Unidos. E, a menos que ele
cometa outra imperdoável gafe, como a inoportuna visita que fez ao Cremlin, em
maio de 1984, certamente terá a pressão sobre o seu regime diminuída já a
partir do próximo ano.
Basta,
somente, que saiba ganhar tempo, com muita astúcia e cautela, para conseguir sobreviver
politicamente e até servir de cabo eleitoral para eleger um próximo presidente
norte-americano. Do Partido Democrata, naturalmente.
(Artigo
publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 16 de outubro de
1986).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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