Choque dentro do governo
Pedro J. Bondaczuk
O ministro da Fazenda,
Fernando Henrique Cardoso, foi brilhante, ao anunciar seu plano de
estabilização econômica, o primeiro a aplicar um choque “dentro” do governo, ao
invés de subverter as regras vigentes na sociedade.
Expôs
com clareza e concisão, de forma incansável – foram incontáveis as entrevistas
que concedeu a jornais e emissoras de rádio e televisão – as diretrizes
propostas, que do ponto de vista técnico, são rigorosamente corretas. Não se
valeu de linguagem cifrada e nem lançou mão daquela arrogância pedante com que
seus antecessores se dirigiam à sociedade quando do anúncio dos pacotes
anteriores.
Fernando
Henrique Cardoso falou, falou e falou, com uma paciência de Jó, respondendo,
com respeito e com clareza, a todas as perguntas, mesmo as mais ingênuas e
óbvias, feitas pelos repórteres. Se o plano vai ou não dar certo, dependerá do
comportamento dos políticos.
Os
governadores, os prefeitos e principalmente os congressistas precisam deixar de
lado, neste momento, suas ambições eleiçoeiras e pensar no País. Nos 34 milhões
de indigentes, que hoje já não são somente descamisados, mas não têm um teto
para lhes cobrir a cabeça e, o que é pior, a garantia do próprio alimento que
lhes mantenha a vida.
Não
se trata de uma questão de governo, de partido ou de ideologia. Caso a economia
seja saneada, a inflação contida e o Brasil volte a crescer, com a geração de
milhares de novos empregos, o êxito não será de Fernando Henrique, do
presidente Itamar Franco ou do partido x ou y. O sucesso será de toda a
sociedade. O País estará rompendo o círculo vicioso do subdesenvolvimento e
estabelecendo o círculo virtuoso do crescimento econômico, como o deputado José
Serra costuma afirmar.
À
imprensa cabe, mais uma vez, o papel que os meios de comunicação vêm exercendo
tão bem nos últimos tempos: o de investigar falcatruas, denunciar negociatas,
trazer a público sabotagens contra a economia popular, atuar como os olhos,
ouvidos e a voz da cidadania.
O
próprio ministro da Fazenda deixou claro que seu plano não é uma panacéia para
todos os nossos males. Trata-se de um primeiro passo, que convém ser seguido de
muitos, muitíssimos outros.
Fernando
Henrique ressaltou, num dos seus inúmeros pronunciamentos: “Não haverá mágica,
não haverá tiro certeiro”. Aliás, não se conhece na história o caso de nenhum
país, em qualquer época que seja, que tenha logrado vencer a inflação mediante
decreto.
Trata-se
de uma tarefa espinhosa, frustrante, cheia de idas e vindas, que demanda tempo
e exige empenho de todos os agentes econômicos. O ministro goza de
credibilidade que nenhum dos seus antecessores teve e se comprometeu a não
esconder nada dos brasileiros, e a falar com franqueza dos obstáculos que
certamente irá enfrentar.
Tomara
que não venha a frustrar, mais uma vez, as expectativas da população, tão
desencantada com tudo o que vem acontecendo desde o início da década de 80.
Pressões dos que fazem da vida pública um trampolim para satisfazer interesses
pessoais ou de grupos, certamente virão.
Boicote
dos dogmáticos e daqueles que fazem das ideologias uma espécie de “mantra”
sagrado é também previsível. Oxalá Fernando Henrique supere tudo isso. Pois,
como ele próprio assinalou, “pressões representam o gosto da vida”.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 16 de junho de 1993).
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