Criação
da ousadia
Pedro J. Bondaczuk
O poder da vontade é praticamente
ilimitado. Ou quase. Claro, refiro-me ao que seja factível, mesmo que
minimamente. Nem tudo é. Há coisas que, por mais que desejemos e nos empenhemos
de corpo e alma para obter, são absolutamente impossíveis. Não é a elas, pois,
que me refiro. Conheço inúmeros exemplos de pessoas feridas pela natureza, que
nasceram com alguma deformidade ou limitação física, ou que ficaram assim em
decorrência de alguma doença ou de acidentes, e que conseguiram reagir e se
tornar “gigantes da espécie”. Desmentiram prognósticos de que seriam
irremediavelmente dependentes de todos, em tudo, superaram limitações,
livraram-se da autopiedade e da tendência natural para a revolta e a amargura
e... realizaram maravilhas, que espantam os incrédulos e, notadamente, os que
nunca tiveram que passar por experiências tão traumáticas como as suas. Foram
vencedoras.
Exemplos de pessoas que, com o
poder da vontade fizeram (e fazem) todos se esquecerem de suas deficiências e
limitações, nem são tão raros. Cito, de passagem, o caso do físico e professor
inglês Stephen Hawking, sobre o qual escrevi inúmeras vezes e cuja inteligência
e lucidez não me canso de admirar e de exaltar. Vítima de doença degenerativa,
há anos imobilizado em uma cadeira de
rodas e que, até para se comunicar, tem que se valer de um sintetizador de
voz, é um dos cérebros mais
privilegiados e lúcidos da atualidade, que não fica nada a dever a Albert
Einstein. É dos raros gênios que nossa espécie já produziu em todos os tempos.
Outra figura humana excepcional
foi, sem dúvida, Helen Keller. Cega, surda e muda, aprendeu a ler mediante a
linguagem Braile, desenvolveu a fala e tornou-se não somente uma das mais
lúcidas, sábias e requisitadas conferencistas, notável professora, com
sensibilidade e bom humor admiráveis. Estes (e outros tantos similares ou
parecidos) são exemplos de grandeza e de superação que mais prezo e que procuro
imitar, por se originar do único tipo de poder que vale a pena possuir e
cultivar: o da vontade!
Essa força miraculosa, capaz de
mover montanhas de problemas e de obstáculos, está ao nosso alcance, dentro de
nós, à espera que a identifiquemos e utilizemos. As dificuldades da vida, como
a instabilidade econômica, a violência urbana, a disseminação da miséria e
problemas familiares e existenciais, levam muitas pessoas a se tornarem
"catastrofistas". A maioria assume renitente e amargo pessimismo e
chega a perder contato com a realidade, desconfiando de tudo e de todos,
incapaz de reagir. Certos indivíduos perdem seus referenciais, isolam-se, ficam
agressivos e cultivam a solidão. Arraigam-se a um individualismo exacerbado,
que descamba para o egoísmo. Agem como se apenas eles tivessem problemas e
culpam o mundo por suas dificuldades e vulnerabilidades. Não se dão conta, mas
estão fechando todas as portas para a felicidade. O que tais indivíduos não
entendem é que são estes obstáculos e desafios (na maioria das vezes sequer tão
grandes) que tornam a vida tão fascinante.
A ousadia para fazer o que
achamos adequado vale, igualmente, para sentimentos. Muitas pessoas são
infelizes e solitárias porque temem se expor. Secretamente, acalentam projetos
de relacionamento. Mas vão adiando sua execução, na medida do seu medo. Nesse
aspecto, não há fórmulas milagrosas e nem respostas definitivas. Para saber se
a convivência com uma companheira vai dar certo ou não, por exemplo, não existe
outro caminho senão tentar. E, como tudo na vida, essa tentativa envolve riscos
de fracasso. Mas tem, também, possibilidades de êxito.
Reitero o que escrevi em recente
crônica: “somos o que mentalizamos. Se nos virmos como fracos, como tíbios,
como doentios e carentes, nos transformaremos nesse estereótipo que criarmos”.
O que cada um de nós tem que fazer é se impor. É provar, se preciso, que o mundo
inteiro está errado em relação à imagem que tem de nós. É não nos deixarmos
abater diante de opiniões e atitudes negativas e preconceituosas alheias. Mas
essa demonstração de força não se pode fazer apenas com palavras, que surtem
ínfimo efeito ou até mesmo nenhum. Exige ação, mesmo que o corpo teime em não
obedecer e a pedir, somente, repouso. Requer energia, tirada não se sabe de
onde, mas que tem que ser encontrada dentro de nós. Impõe, sobretudo, férrea e
inflexível força de vontade.
Temos que ser determinados e ousados. Temos que buscar, em nosso
interior, forças que sequer sabemos que estão lá, mas que estão, à espera de
serem reconhecidas e mobilizadas. É preciso tentar, e tentar e tentar sempre,
sem desânimo e nem esmorecimento. É persistir, mas não loucamente, sem plano e
estratégia. É agir, agir e agir, mas com inteligência e bom senso. É sempre que
se estiver perto de desanimar e desistir de tentar, pensar em figuras
paradigmáticas, como Stephen Hawking e Helen Keller, e seguir seu extraordinário
exemplo, pensando no que elas fariam em idêntica circunstância. Das raras
convicções que tenho na vida, uma se impõe sobre todas as demais: “O ser humano
pode qualquer coisa, desde que tenha vontade”. Tenhamos sempre em mente esta
constatação do polêmico, mas genial, filósofo francês Voltaire: “O sucesso
sempre foi a criação da ousadia”. Ousemos sempre!
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