Com fracassos e sucessos,
superamos 1986
Pedro J. Bondaczuk
O
ano de 1986, se é verdade que trouxe muitas decepções para a população
brasileira, não foi aquela catástrofe que os "profetas do caos"
prognosticaram em dezembro de 1985. A inflação não chegou ao assustador patamar
de 500%, a recessão não voltou a imperar e na média de sucessos e fracassos, os
primeiros prevaleceram sobejamente. É verdade que o Plano Cruzado não conseguiu
se sustentar pelo tempo desejável, porque o governo, temeroso de perder as
eleições de 15 de novembro passado, não fez os ajustes necessários em tempo
hábil. Não deixa de ser também real que o anúncio de medidas impopulares foi
feito de maneira inábil e em tempo inoportuno. Mas 1986, ainda assim, não foi o
desastre que todos esperavam.
A
sociedade brasileira, como um todo, ainda está possuída por uma enorme
"sinistrose", um pessimismo imenso, ditado pelos anos de crise
econômica que acabamos de atravessar. Veja-se, por exemplo, os boatos que estão
circulando por aí, dando conta de um recrudescimento inflacionário, de
dificuldades no plano externo com a nossa alentada dívida para o sistema
financeiro internacional e com as expectativas de um novo período recessivo. No
entanto, tudo isso não passa de bobagem. As autoridades de Brasília estão
conscientes que o Brasil só tem um caminho para ser uma Nação viável: crescer!
E
crescimento foi o que não faltou nos derradeiros 365 dias. O nosso Produto
Interno Bruto pode até mesmo emplacar uma espetacular taxa de crescimento de
12%, que somada aos quase 9% de 1985, nos dará mais de 20% em somente dois
anos. Isso, sem "milagres", sem coelhos tirados da cartola e nem
investimentos com o dinheiro alheio. É verdade ainda que essa evolução foi
suficiente para pelo menos atender o crescimento da demanda. Nos meses em que o
Plano Cruzado, embora um tanto cambaleante, se sustentou, o que mais se viu foi
escassez de produtos, muitos deles essenciais. Podemos, de imediato, chegar a
duas conclusões diferentes: ou o nosso setor produtivo não teve competência
para cumprir o seu papel no momento em que mais se fez necessário, ou o
processo de sabotagem das medidas estabilizadoras foi mais amplo do que se
pensou.
Decepções
nós tivemos praticamente em todos os setores. A começar pela nossa seleção de
futebol, que pagou duramente pela desorganização existente na CBF, que não se
cansou, no correr de 1986 inteiro, de dar mostras de sua inaptidão (que se veja
a enorme confusão em que se acabou transformando o nosso principal campeonato).
Não houve qualquer critério, nem na escolha do técnico, nem na preparação da
equipe e muito menos em sua organização. Todo o mundo quis ser um pouquinho
vedete, colher as vantagens do sucesso antes mesmo de ganhar qualquer coisa. O
que se viu foi aquela enorme frustração na partida contra a França, onde até
penalidades máximas os nossos craques conseguiram errar, demonstrando uma falta
de equilíbrio emocional contundente.
Mas
a principal decepção do ano foi mesmo no plano político. A campanha eleitoral
mais cara da nossa história, que andou girando pelos US$ 200 milhões, foi
caracterizada pelas mesmas e surradas táticas politiqueiras dos nossos raros
períodos democráticos. Ao invés de programas, de idéias, de soluções, nossos
candidatos nos trataram com uma falta de educação cívica assustadora.
Xingamentos, acusações acerca de corrupção e de oportunismo e ataques de
caráter pessoal de toda a sorte abundaram, em detrimento de um debate sério,
ponderado e competente. Por isso (e não somente por causa do voto do
analfabeto), os sufrágios brancos e nulos foram tão numerosos em todo o País.
Mas
no processo eleitoral houve também um fato saudável e que deve ser destacado: a
própria realização do pleito. A oportunidade da população conhecer de perto os
políticos que terão a responsabilidade de gerir esta Nação nos seus diferentes
níveis de poder. Argumenta-se que mais uma vez o povo errou na escolha (embora
as opções que lhe foram apresentadas não fossem muitas). Este erro, entretanto,
não invalida a prática democrática. Ela deve ser repetida sempre e sempre. Uma
hora a gente acerta. O exercício consciente do voto não deve ser encarado
jamais como uma obrigação, dessas chatas, que poucos gostam de fazer. É um
direito, um privilégio, uma oportunidade de participação.
Se
as perspectivas iniciais para 1987 apresentam-se tão assustadoras quanto as do
final do ano passado, elas não são motivos para desespero. Com nosso trabalho,
com o exercício de nossa cidadania, com nossa vigilância constante sobre os
representantes que escolhemos, conseguiremos alterar a situação. Faremos uma
travessia sem maiores turbulências no caminho dos próximos 365 dias. O que não
podemos é nos omitir, esperando que outros façam "milagres" por nós.
Soluções miraculosas não existem. Problemas só são resolvidos com trabalho
sério, persistente, quotidiano e competente. E é isso que certamente todos nós,
brasileiros, iremos fazer para construir, não somente um 1987, mas todo um
futuro de prosperidade, de paz e de solidariedade em nosso País.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 28 de dezembro de 1986)
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