Wednesday, December 31, 2014

Crises e messianismo


Pedro J. Bondaczuk


A fulminante ascensão política do candidato independente à presidência do Peru, Alberto Fujimori, veio mostrar um dos lados mais perversos gerados por uma crise econômica em determinado país: o messianismo. Situações desesperadoras tendem a abrir um vácuo no poder, geralmente preenchido por aventureiros, com propostas vagas, que não resistem à mínima análise quando não sem nenhuma. As pessoas se deixam levar por suas esperanças e perdem contato com a realidade. Passam a acreditar em soluções miraculosas, enunciadas pomposamente nos palanques, sem atentar para o fato de que, se as coisas fossem tão fáceis como esses demagogos querem dar a entender, alguém já teria lançado mão de tais medidas "salvadoras" para se perpetuar na história.

Adolf Hitler, na Alemanha, foi um fruto típico da hiperinflação germânica da década de 1920. E nem é preciso pesquisar muito para se encontrar uma fartura de exemplos semelhantes. Parece que o Peru está para embarcar nesta onda. O eleitorado está em vias de deixar de lado uma proposta consistente, lógica e factível, apresentada à sociedade pelo escritor Mário Vargas Llosa, para ir atrás de vagas promessas de alguém que até ontem era desconhecido. Tudo ía muito bem com a campanha do candidato centro-direitista, que parecia prestes a colher uma das vitórias mais amplas, expressivas e sobretudo fáceis, já obtidas em eleições presidenciais no Peru, prescindindo até mesmo de um segundo turno, até que o consagrado romancista começasse a detalhar seu futuro programa de governo. Bastou somente que ele levantasse a hipótese da implantação de um plano de austeridade, semelhante ao do Brasil, para que o eleitorado vacilasse.

Compreende-se o temor dos peruanos, que empobreceram muito durante a decepcionante gestão de Alan Garcia, cansados de tantas privações e sofrimentos. Nestes momentos, porém, é que se precisa usar mais a cabeça. É em tais ocasiões que não se pode deixar levar "pelo canto da sereia", que costuma ser aliciador e doce, mas extremamente perigoso. Fujimori pode até ser um fenômeno de comunicação, mas objetivamente nâo expôs qualquer solução para os problemas que afligem a população do seu país. Não apresentou nenhum projeto consistente para debelar uma inflação que se aproxima dos 3.000% anuais, para acabar com um desemprego ao redor de 16% da mão-de-obra ativa ou pôr fim à violência guerrilheira, que em somente dez anos ceifou ao redor de 16 mil vidas.

Ainda há tempo dos eleitores refletirem sobre o futuro. No segundo turno, os programas tenderão a ficar mais claros, já que a disputa vai se restringir a somente dois candidatos, e não mais a nove, como ocorreu no primeiro. É importante, no instante do voto, que cada eleitor seja, sobretudo, realista e não se deixe enganar por palavras bonitas, mas despidas de qualquer conteúdo prático.


(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 24 de abril de 1990)

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