Surpresas
do presente
Pedro J. Bondaczuk
A vida lhe dá uma infinidade de
presentes diários – e quanto mais anos você tem, mais os recebe –
e você, além de não agradecer, e sequer se dar conta dessas
dádivas, ainda tem o desplante de desfiar imensos rosários de
queixas e lamentações, dando a entender que vive sendo punido. Vá
ser mal-agradecido lá na Cochinchina!!!
Só o fato de despertar, a cada
manhã, vivo, com um dia inteiro ao seu dispor, para preencher com
ideias e realizações, já é um imenso privilégio. Muitos sequer
despertam. Claro que você não reconhece isso. Acorda azedo e
mal-humorado, dando coices em todo o mundo, como um cavalo xucro que
ainda não foi domado. Pensa nas inúmeras “chatices” que terá
que enfrentar, a escola, o trabalho, as obrigações, com pouquíssimo
tempo para diversão.
Esquece-se, todavia, que essas
coisas que você considera tão chatas, são um privilégio que
muitíssimos, mundo afora, não têm. Como eles ficariam felizes se
tivessem! Há mais de um bilhão de desempregados, somando-se todos
os países da comunidade internacional, que não têm a menor noção
de como farão para se sustentar e garantir o sustento dos que deles
dependem. O que essas pessoas não dariam para terem isso que você
considera “chatice”?!
Ademais, você trabalha em um
escritório confortável, com ar-condicionado, escrivaninhas modernas
e computadores de última geração. O esforço que despende é
ínfimo, quase uma brincadeira perto de tantos e tantos e tantos
outros trabalhadores. A imensa maioria dos que têm emprego exerce
tarefas perigosas, insalubres, braçais e com remuneração dezenas
de vezes menor do que a sua. Qual o motivo da sua reclamação? Você
trocaria sua “chatice” pela dessa gente toda? Duvido!
Você acha chato estudar. Não
sabe, todavia, (ou se sabe, é muito mais egoísta e burro do que
parece), que há, no mundo, mais de um bilhão de analfabetos. Que
futuro essas pessoas podem esperar? Estão condenadas, sem remissão,
à miséria, ao “apartheid” econômico e social, à nulidade, ao
inferno na Terra.
Faculdade, como a sua? Nem
pensar! Esse contingente imenso se daria por extremamente satisfeito
se conhecesse, pelo menos, o alfabeto do seu idioma. Se conseguisse
juntar as letras e formar as palavras mais simples. Se pudesse ler
nem que fossem as placas das ruas ou os nomes e anúncios das lojas.
Se lograsse a imensa “façanha” de “desenhar” seus nomes,
mesmo que mediante garranchos.
Você se queixa do pouco tempo
que dispõe para “diversão”. Mas o que você vê de tão
divertido nas baladas que freqüenta, nos estádios de futebol a que
comparece, nas conversas vazias e sem nenhum conteúdo com os amigos
– que só têm caraminholas na cabeça e dois únicos pares de
neurônios no cérebro – e nas outras tantas bobagens que você
classifica como sendo “lazer”? Bilhões de pessoas, mundo afora,
não têm acesso sequer a isso. E se tivessem o tempo livre que você
tem, não o desperdiçariam dessa maneira inconseqüente e tola.
Mas você recebe outros tantos
presentes diários da vida e sequer percebe. Os belos dias de sol,
por exemplo. Milhões de pessoas no mundo vivem em lugares em que
essa luz e esse agradável calor são raridades. E, ainda assim,
agradecem por isso. Mesmo os dias de chuva são bênçãos
inquestionáveis, embora você não os considere assim. Há regiões,
densamente habitadas, do Planeta, em que chove reles dez dias por
ano. Que festa os moradores desses locais não fariam se tivessem
mais dias como estes dos quais você não raro reclama! Em Lima, por
exemplo, não chove há já quatro anos.
Poderia passar horas e mais horas
desfiando lista interminável de presentes que a vida lhe dá, todos
os dias, mas não o farei. Deixarei a tarefa ao seu cargo, ao seu
raciocínio, caso você tenha um mínimo de sensibilidade e
inteligência para pensar, nem que seja uma única vez, nisso. Vamos
lá, exercite seu par de neurônios!
Mas lhe darei, de graça, sem
cobrar coisa alguma (aliás, como a vida o faz com os presentes que
dá) alguns conselhos úteis, que você pode ou não seguir. O
problema é só seu. Não tenho nada com isso.
Não fique com essa lenga-lenga
de se referir, a toda hora, ao passado que, dada sua falta de
memória, você acha que foi muito feliz. Provavelmente, nem foi.
Mesmo que tenha sido, porém, passou. Jamais você irá recuperar
esse tempo.
Não fantasie muito, também, o
futuro, pois você nem mesmo sabe se terá um. Seu tempo pode estar
se esgotando sem que você tenha a menor suspeita. Viva o presente.
Faça, a cada dia, o melhor que puder. Aproveite cada segundo, mas
com qualidade, sem queixas, reclamações ou grilos. .
Tempos atrás, li, em uma das
colunas que Paulo Coelho publicou no jornal “O Globo”, o
seguinte, que o escritor caracterizou como “provérbio do
Ciberespaço” (mas que suspeito tenha sido escrito por ele):
“O passado é história,
O futuro é mistério.
O agora é uma caixa de
surpresas.
Por isso, nós o chamamos de
presente”.
Entendeu a mensagem,
cara-pálida?!
(Crônica escrita em resposta às
queixas de uma pessoa pessimista, que encara a vida como castigo, e
não como o privilégio que é).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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