Monday, October 23, 2017

Palavras mágicas



Pedro J. Bondaczuk



A reforma fiscal pretendida pelo governo do presidente Fernando Collor, que apesar de intensamente debatida por mais de sete meses, na verdade é pouco conhecida do grande público quanto ao seu alcance e conseqüências, se tornou o novo “mantra”, a nova palavra mágica, o mais recente “abre-te Sésamo” para a solução de todas nossas crises e a retomada do desenvolvimento econômico, com justiça social.

Antes dela, foi a Constituição vigente, que foi apresentada à população como a chave de um novo milagre. Conseguiu-se, com isso, todavia, apenas gerar a maior das frustrações nacionais dos últimos tempos.

Já se tornou tradição, ao longo da história brasileira, esse tipo de comportamento. Quando o Brasil ainda era colônia de Portugal, a alegação, para justificar o atraso desta complexa sociedade era a falta de independência. Pois bem, em 1822 ela veio e em menos de nove anos, em 7 de abril de 1831, já com a imagem desgastada, o imperador Dom Pedro I abdicou em favor de seu filho menor de idade.

O País atravessou todo o período de regência falando da “maioridade” de Dom Pedro II. Sempre que alguma crise política adquiria maiores proporções – e estas não faltaram – os políticos vinham a público para reivindicar a antecipação da maioridade do jovem imperador, como panaceia para todos os males. E o povo, despolitizado – a despolitização popular sempre foi uma tradição nacional – acreditava no que lhe diziam.

Depois da maioridade, já quando o monarca estava em avançada idade, depois de meio século de governo, a palavrinha mágica que passou a freqüentar a imprensa foi “República”. Centenas de outras mais vieram em sucessão, como o “Encilhamento”, iniciado pelo então ministro da Fazenda, Ruy Barbosa, em 17 de janeiro de 1890 de resultados desastrosos.

Para quem não se recorda, este foi o apelido dado a um processo que se caracterizou por vendas de ações ao público de empresas que ainda sequer existiam, para obter capitais que permitissem sua constituição. O termo foi extraído do turfe e fazia analogia com o ato de encilhar um cavalo antes da corrida.

Encilhamento”, portanto, significava pôr arreios num fogoso corcel, no caso o Brasil, para que este disparasse rumo ao desenvolvimento. Foi um desastre, um dos maiores golpes já dados no público. A maioria das “empresas”, na verdade apenas um nome, jamais chegou a ser constituída.

Outras palavras mágicas mais freqüentaram as manchetes, sempre com o caráter de “salvação da Pátria”. Foram os casos do “Estado Novo”, dos “50 anos em 5”, da “vassoura” de Jânio, apenas para citar alguns.

Antes que a reforma fiscal – ou pelo menos o projeto já entregue ao presidente Collor – passe a ser encarada como “salvação da lavoura”, é indispensável, portanto, que alguns de seus aspectos, tendentes a espoliar ainda mais a já sofrida população, sejam analisados com atenção e inteligência para evitar novas e dolorosas frustrações.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 8 de julho de 1992).



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