Violência
urbana
Pedro J. Bondaczuk
A vida no Brasil, pelo menos nas grandes
aglomerações urbanas, vale muito pouco. É a conclusão que se tira de um estudo
feito pelo Instituto de Economia Mundial, da França, que vai ser publicado na
edição de outubro próximo da revista Conjuntura Econômica, órgão da Fundação
Getúlio Vargas.
A principal constatação desse trabalho é a de que a
violência mata, nas cidades de grande porte do País, duas vezes mais do que nos
Estados Unidos, embora os norte-americanos levem a fama de violentos. A
liderança, no incômodo ranking do homicídio, nas metrópoles brasileiras, é
detida pelo Rio de Janeiro.
O citado relatório dá conta de que ali, em um ano,
são assassinadas, em média, 56,4 pessoas por 100 mil habitantes. A cifra, impressionante,
fala por si própria. Apenas no período compreendido entre 1985 e 1991, o número
de assassinatos na capital fluminense superou as baixas ocorridas no Vietnã e
as verificadas na guerra civil da Bósnia. Mas São Paulo não fica muito atrás.
Apresenta, também, um índice elevadíssimo de mortes violentas. Esse fenômeno,
aliás, é característico dos nossos tempos. Não se limita às duas maiores
cidades brasileiras, e muito menos ao País. É mundial.
As causas são múltiplas, envolvendo desde o consumo
e tráfico de drogas, à solidão que afeta as pessoas e tira o seu equilíbrio.
Torna-as arredias e desconfiadas. Suprime-lhes as perspectivas, as nulifica e
oprime. Daí para a violência é só um passo.
O próprio conceito de vida urbana precisa ser
repensado. A atual concentração de pessoas em espaços restritos é irracional.
Todavia, é uma tendência cada vez mais acentuada dos nossos tempos. No início
deste século, eram poucas, cerca de três a quatro dezenas, as cidades com mais
de um milhão de habitantes. Hoje, passam de 100, algumas com populações
equivalentes à de países de porte médio, como é o caso da capital mexicana, que
abriga, em sua área metropolitana, 23 milhões de indivíduos.
É uma sandice, mas poucos se dão conta disso. O
desconforto e a quantidade de problemas que surgem em mega-comunidades desse
tamanho são proporcionais à sua quantidade de habitantes. O escritor espanhol
Antonio Gala, em entrevista publicada pelo jornal "O Globo", em 11 de
julho de 1993, constata: "Vivemos um momento em que as cidades se tornaram
inimigas, em que a sociedade que nós mesmos formamos passou de aliada a hostil,
em que a solidão nas grandes cidades é maior do que nunca. Eu acho que se a
solidão manchasse não haveria no mundo água suficiente para lavar a sua mácula".
Como se vê, a questão é mais complexa do que alguns
procuram dar a entender e, por isso, não comporta soluções simplistas, como
grandes aparatos policiais, o armamento da população e outras medidas, algumas
necessárias, embora paliativas e outras que somente agravam o problema.
Quando se fala do Rio de Janeiro, suas autoridades
reagem, acusando a existência de uma campanha
para deslustrar sua imagem. Balela. Os números estão aí para mostrar que
a violência se tornou insustentável na eterna "Cidade Maravilhosa",
pela qual temos (todo brasileiro tem) um especial carinho em virtude da sua
beleza, do seu charme e da sua importância na economia, nas artes e na história
do Brasil.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 29 de setembro de 1994).
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