Luta
de xiitas rivais
Pedro J. Bondaczuk
O Irã, passados oito anos do fim da sua monarquia, e
quase o mesmo tempo de uma sangrenta e feroz guerra contra o Iraque, demonstra
uma vitalidade impressionante. Observadores estimam que o conflito do Golfo Pérsico
já tenha produzido em torno de dois milhões de vítimas diretas, entre mortos e
feridos. Dessas, a maior parte é persa, com certeza, já que o território da
República Islâmica permaneceu ocupado em cerca de um terço de sua área pelo
adversário até meados de 1982 e sua Força Aérea perde, em quantidade, na
proporção de oito para um, para a iraquiana. Em qualidade, nem dá para
comparar.
As aeronaves iranianas são, ainda, os antigos F-4
norte-americanos, desgastadas pelo uso e, em geral, sem peças de reposição.
Ainda assim, tendo a opinião pública mundial contra si, as duas superpotências
também, e contando, somente, com a ajuda “subterrânea” conseguida a peso de
ouro no mercado informal de armamentos, o país reverteu a situação a seu favor.
De invadido, passou a invasor. Da defensiva, passou
a atacar. Não deixa de ser louvável, portanto, o espírito de luta desse povo,
em geral classificado, na grande mídia impressa internacional, como sendo mero
fanatismo.
Mas o mais notável é que, mesmo essa sociedade
nacional sendo considerada uma ditadura dos aiatolás, as suas instituições
básicas, bem ou mal, vêm funcionando. Por exemplo, hoje o Irã realiza a
terceira eleição parlamentar desde a proclamação da República.
Anteriormente, ocorreram outras duas, para a presidência.
Quantos países há, por aí, que têm essa mesma preocupação? Poucos, não é mesmo?
E nenhum deles está vivendo o drama de uma chuva contínua de mísseis sobre o
seu território, esses mensageiros da morte, que ceifam, indistintamente,
pessoas de todas as categorias sociais e graus de instrução.
No entanto, na maioria dos Estados, há, hoje em dia,
ou um ditador com cadeira cativa no poder (estima-se que haja mais de 70
ditaduras no mundo), ou políticos que engendram manobras prorrogacionistas,
visando a aumentar o prazo do mandato que o povo lhe concedeu, por expedientes
nem sempre justificáveis.
O Iraque, enquanto isso, permanece com o mesmo
governante desde o início da guerra, o general Saddam Hussein. Recebe o
respaldo das ricas monarquias do Golfo, que financia o seu esforço bélico. É
abastecido por armas moderníssimas pela União Soviética, França e outras
potências da Europa Ocidental. E nem assim vem conseguindo dobrar a resistência
iraniana, mesmo usando armamentos proibidos por convenções internacionais (como
os gases tóxicos, por exemplo) sob o olhar complacente dos que erguem um dedo
em riste para os aiatolás, só porque eles lhes cortaram os privilégios que o xá
lhes havia outorgado.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do
Correio Popular, em 8 de abril de 1988)
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