Operação aérea não é nem um
pouco precisa
Pedro J. Bondaczuk
A
tão apregoada "operação cirúrgica" dos duros e sistemáticos
bombardeios aéreos de 28 dias contra o Iraque mostra-se uma grotesca farsa,
mera peça de propaganda, já que está muito longe de ser o primor de precisão
que se divulgou, ao confundir alvos civis com militares, destruindo ambos
indiscriminadamente.
À
medida em que a guerra do Golfo Pérsico evolui e mais informações, de fontes
dignas de crédito, procedem de território iraquiano, isto vai se tornando cada
vez mais claro. O cenário de terra arrasada em que se transformou esse outrora
progressista país árabe mostra que as forças aliadas, lideradas pelos Estados
Unidos, extrapolaram em muito o mandato que lhes foi conferido pela comunidade
internacional. Comprova que o objetivo da Operação Tempestade no Deserto não é
somente o de libertar o território kuwaitiano. Sua meta é a de lançar o Iraque
muito aquém da Idade Média.
O
que se está fazendo é lançar toda uma comunidade nacional no mínimo um século
para trás em termos de condições de vida. Prova disso é a sistemática
destruição de bens econômicos, culturais e até religiosos desse povo. A perda
de pontes, usinas elétricas, rodovias, instalações de petróleo e outras
precisará de décadas de sacrifícios e investimentos para a reconstrução.
Seu
bombardeamento, portanto, não se destina à mera expulsão iraquiana do Kuwait,
razão de ser das resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Não se
concebe a tremenda matança que se verifica entre a população civil, punida
duplamente: pelo fato de ter um tirano no poder e por não ter forças para
derrubá-lo.
O
objetivo dessas ações parece ser o de colocar diante do povo desse país uma
opção terrível: depor Saddam Hussein ou desaparecer. Mas o Ocidente é o grande
culpado pelo fortalecimento desse líder, ao armá-lo até os dentes, de olho
apenas nos seus petrodólares, sem atinar para as conseqüências que esse
armamentismo poderia trazer, como de fato trouxe.
No
atual estágio da guerra, é muito contestável se o conflito terá seqüência ou
não com o ditador ou sem ele. Os estragos feitos em apenas 28 dias no país são
de tal magnitude, que os iraquianos pouco têm a perder agora. E é proverbial a força que o desespero costuma
conferir a quem se sinta contra a parede.
Por
causa do que vem acontecendo no Iraque é que tantos jornalistas veteranos,
escolados com aquilo que geralmente ocorre num "front", vêm se
rebelando contra a censura imposta ao noticiário pelos "donos da
festa". A ausência do olhar vigilante e atento da imprensa enseja os
excessos que vêm sendo cometidos.
Muitas
das ações militares, sob o pretexto de serem partes de uma estratégia,
extrapolam todos os limites da humanidade e da legalidade. Até para guerrear
existem leis e convenções. E os massacres a civis, como a destruição, ontem, de
um abrigo antiaéreo em Bagdá, que causou a morte de pelo menos 500 pessoas, só
podem ser caracterizados como crimes de guerra.
(Artigo
publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 14 de fevereiro
de 1991).
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