Problemas para Rajiv
O primeiro-ministro
indiano, Rajiv Gandhi, após as duas recentes vitórias eleitorais que obteve
recentemente (uma em dezembro, confirmando o seu gabinete e a outra há duas
semanas, nos pleitos realizados em 11 dos 22 Estados da Índia, nos quais venceu
em 8 unidades da Federação), tem pela frente dois grandes problemas a resolver.
Ambos são extremamente delicados, por envolverem questões bastante explosivas:
a da divisão de castas e a do separatismo.
O
primeiro problema foi registrado no Estado ocidental de Gujarat (local onde o
premier obteve um espetacular resultado eleitoral neste mês), motivado pelo
descontentamento da população com a providência governamental que permite um
maior acesso dos “intocáveis” ao ensino superior.
Para
compreender essa questão é preciso que antes se entenda como funciona a divisão
de castas na religião hinduísta, proibida pela Constituição, mas que persiste
na prática. Os Vedas, livros sagrados que datam de milênios, dividiam todas as
pessoas em quatro classes perfeitamente definidas: a superior, composta pelos
sacerdotes védicos; a dos “xátrias”, ou guerreiros; a dos “vaisyas”, ou
comerciantes e agricultores e a dos “sudras”, onde ficam os “párias”,
considerados impuros e obrigados, durante toda a vida, a servir às categorias
superiores. A eles está destinado o trabalho braçal.
O
indivíduo que nasce numa casta, só pode casar com alguém pertencente a ela e
morre obrigatoriamente nela, não podendo jamais passar para outra.
Embora
desde a independência estejam sendo feitos esforços enormes para acabar com
essa discriminação, os resultados até aqui, nesse sentido, são inexpressivos.
Por causa da abertura de novas vagas nas escolas superiores aos “intocáveis”, a
capital de Gujarat está em polvorosa, com enormes conflitos de rua,
responsáveis pela morte de muitas pessoas.
Afinal,
Ahmedabad não é uma cidadezinha qualquer, facilmente controlável. Trata-se de
uma metrópole de mais de 2,8 milhões de habitantes, localizada às margens do
Rio Sabarmati, que desemboca no Golfo de Cambay, no Noroeste da Índia. Foi
necessária, até, a intervenção do Exército para serenar os ânimos.
É
de se estranhar, sobretudo, tamanha intolerância numa localidade que há anos
abrigou (e ouviu a pregação de não violência) de um dos homens mais tolerantes
que o mundo conheceu neste século, o Mahatma Gandhi. Mas acostumes arraigados
há pelo menos seis milênios não se mudam por simples decretos. E Rajiv terá que
usar de toda a sua diplomacia para contornar esse impasse.
Outra
questão que o jovem estadista terá que resolver é a exigência dos “sikhs”, do
Punjab, por maior autonomia. E principalmente evitar que os radicais do Partido
Akali Dal, que lutam pela independência da região e criação de um país chamado
Khalistão, ganhem espaços. Especialmente após a invasão do Templo Dourado de
Amritsar, o santuário mais sagrado do sikhismo, ocorrida em 6 de junho do ano
passado e da morte do líder separatista, Jarnail Singh Bindrawale.
Rajiv,
mostrando todo o seu ânimo conciliador, não teve dúvidas e foi ao Punjab ouvir
pessoalmente os reclamos dos "sikh“", mesmo tendo sido eles os
autores do assassinato de sua mãe, Indira Gandhi, em 31 de outubro de 1984. O
premier indiano, assim, com muito talento (que deixaria cheio de orgulho o seu
avô e ex-primeiro-ministro Jawaharlal Nehru), vem adotando uma tática de
franqueza e de respeito pelos adversários, conquistando as simpatias até dos
que não concordam com a sua linha de ação.
Está
aí um exemplo para muitos governantes do Terceiro Mundo, que preferem protelar,
ou esconder, as questões mais prementes, ao invés de procurarem,
democraticamente, conciliar conflitos!
(Artigo
publicado na página 19, Internacional, do Correio Popular, em 24 de março de
1985).
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