Tomando o bonde no estribo
Pedro J.
Bondaczuk
As autoridades comunistas de linha-dura da Alemanha
Oriental tentaram, mesmo diante das evidências de que estavam remando contra a
correnteza da história, conservar o país como ele sempre foi nos últimos 40
anos. Ou seja, um dos Estados mais fechados, inclusive do próprio Leste
europeu.
Mesmo após o início do êxodo em
massa de seus cidadãos para o Ocidente, a liderança do PC de então, sob a
batuta um tanto esclerosada – ou pelo menos defasada – de Erich Honecker, ainda
buscou “tapar o sol com a peneira”.
As fugas, por exemplo, foram
atribuídas a hipotéticas campanhas de aliciamento partidas da Alemanha
Ocidental. A cúpula partidária não teve isenção suficiente para fazer uma
autocrítica serena e equilibrada, fanatizada que sempre esteve pela ideologia,
ao ponto de perder o senso de realidade. E deu no que deu.
Ontem, a Alemanha Oriental
amanheceu como um autêntico barco à deriva num mar tempestuoso, caracterizado
por manifestações em massa e por descontentamento generalizado. Sem gabinete,
já que anteontem os 44 membros do governo chefiado pelo primeiro-ministro Willi
Stoph – inclusive ele próprio – renunciaram. E sem Politburo, que é o principal
órgão decisório do país, este último dissolvido e horas depois reestruturado
pelo novo homem-forte alemão oriental, Egon Krenz.
Mas a melhor novidade para
aqueles que esperam ver um mundo pacificado, com o sepultamento definitivo das
seqüelas deixadas pela Segunda Guerra Mundial, foi a indicação de Hans Modrow
para ser o novo premier.
O líder do PC de Dresden sempre
foi visto pelos reformistas locais como a grande esperança nacional. Mesmo
antes das reformas empreendidas por Mikhail Gorbachev na União Soviética – a
glasnost e a Perestroika – terem se popularizado no Leste europeu, ele já as
defendia tenazmente, sendo malvisto pela cúpula de então.
Sua escolha, portanto, é um
indicativo mais do que certo de que as coisas vão mudar de fato, doravante, na
Alemanha Oriental, que se somará à Polônia e à Hungria como uma sociedade
socialista que soube se reciclar na hora certa.
Finalmente, os alemães orientais
estão conseguindo tomar seu lugar no “bonde da história”, mesmo que pendurados,
à última hora, em seu estribo. Em comentários anteriores, quando Honecker
esbravejava e ameaçava mundos e fundos, nós prevíamos esse desenrolar para os
acontecimentos. Apenas não esperávamos que as coisas viessem a acontecer com
tamanha velocidade.
O drama que se desenrola na
“galáxia vermelha” está adquirindo características tão excitantes, que
politicamente já é, de longe, o fato mais importante de 1989, marcado por
tantos acontecimentos de destaque, tendentes a balizar a última década deste
turbulento século XX.
(Artigo publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 9 de
novembro de 1989).
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