Um grande debate
nacional
Pedro J. Bondaczuk
Houve tempo em que os
programas de TV, de cunho político, principalmente os que apresentavam
entrevistas, isto é, mostravam uma imagem estática e até imprópria para o
vídeo, eram considerados desperdícios de tempo. Por razões muito especiais, que
não cabe aqui assinalar, o País vivia em estado letárgico, como que
desinteressado da própria sorte. Ou então, certamente não acreditando naquilo
que as figuras públicas tinham para dizer.
Atualmente, e isto de
uns quatro anos para cá, a situação está diferente. Os programas de entrevistas
alcançam excelentes índices de audiência, às vezes, até, comparáveis aos dos
grandes shows e das transmissões esportivas. O que mudou? Foram os políticos,
agora com mensagens novas, num momento muito especial da vida nacional? Foram
os canais de TV, que entregaram as entrevistas a apresentadores mais argutos, que
perguntam às autoridades o que o povo deseja saber? Foram os telespectadores,
que despertaram de um longo sono letárgico para a dura realidade da nossa
autogestão? Provavelmente, os três.
É bom que se afirme
que, até 1980, era praticamente vedado o acesso de políticos às emissoras de
televisão. A Lei Falcão agravou isso, em vésperas de eleições, determinando que
a campanha gratuita dos partidos fosse feita mediante simples “slides”
mostrando fotos (idênticas às exigidas em documentos), acompanhadas, apenas, de
um breve enunciado dos respectivos currículos.
Um dos grandes
precursores, para que tal situação começasse a mudar, foi, sem dúvida alguma, o
apresentador e crítico de TV Ferreira Netto
Esse jornalista, que além de extraordinário faro para notícias, de uma
argúcia muito grande ao entrevistar seus convidados e de uma imagem bonachona,
muito do agrado do telespectador médio, sempre foi um perito em pautar seus
programas. Por isso, seus convidados, via de regra, eram figuras sobre as quais
sevoltava o foco da curiosidade popular.
Nos três canais em que
passou (isso sem contar a extinta TV Tupi_, Ferreira arrebanhou uma surpreendente
audiência, levando-se em conta, principalmente, o horário em que suas
entrevistas iam ao ar, geralmente em alta madrugada. Ele foi o primeiro a
promover um debate político na TV em véspera de eleições. Aberto o caminho,
outros vieram no seu encalço, o que não é demérito algum.
Hoje, praticamente
todos os canais têm algum programa onde a vedete não é a figura do
entrevistador (como muitas vezes ocorria no passado), mas quem sempre deveria
ser, ou seja, o entrevistado. A Rede Bandeirantes, por exemplo, tem o “Canal
Livre”, às segundas-feiras e a “Crítica e Autocrítica”, aos domingos. Na
Record, Alberto Helena Junior, todas as noites, entrevista alguma personalidade
política, nos três níveis administrativos, ou seja, municipal, estadual ou
federal. Convidados, também, não faltam na caçula das nossas emissoras, a Rede
Manchete, que além do “Debate” das sextas-feiras, ainda leva ao ar, aos
domingos, comandado por outro precursor desse tipo de programação, o jornalista
Roberto D’Ávila, o “Diálogo”. Na Rede Globo, diariamente, logo pela manhã, no
“Bom Dia Brasil”, alguma personalidade do mundo político ou da área
administrativa dá o seu recado. E a Rádio e Televisão Cultura não deixa por
menos, apresentando vários programas desse tipo, dos quais destacamos, tanto
pela sua concepção quanto pela forma dinâmica de apresentação, o “Vox Populi”.
O comando de bons
entrevistadores (Ferreira Netto, Alberto Helena Junior, Belisa Ribeiro, Roberto
D’Ávila, apenas para mencionar alguns) é, sem dúvida, um dos fatores do sucesso
das entrevistas de cunho político. Mas temos de levar em conta, também, o nível
mais elevado de conscientização popular. Hoje o brasileiro demonstra maior
desejo de saber o que se passa com o seu país, quais os problemas que terá pela
frente, o que precisará fazer para que a nação retome o caminho do
desenvolvimento e se solidifique como uma sociedade,equilibrada, justa e
ordeira.
Os canais de televisão
(assim como outros meios de comunicação) apenas refletem o que pensam os
brasileiros (embora alguns obstáculos, que preferimos não abordar nestas
considerações, impeçam esses pensamentos de serem retratados com maior
fidelidade). Com todos os viciosa e defeitos, fartamente apontados, ainda assim
a TV brasileira evoluiu para algo mais nobre do que mero instrumento de
recreação acessível e barata a quase todas as camadas. Junto com um maior
entendimento dos objetivos nacionais, por parte da classe política, esse hoje
indispensável veículo de comunicação também passou a entender que está na hora
de assumir um novo papel.
Uma nação não é
composta apenas de território,governo e povo. Precisa ter um conjunto de
objetivos que uma a todos, num esforço comum, para a sua consecução. E os deste
país começam a se delinear (embora ainda confusamente na cabeça de alguns,
ainda impressionados por vazias pregações de grupos radicais, eu pretendem
desvirtuar nossos anseios e desviar essa sociedade dos rumos que ela traçou).
Esses programas, que felizmente estão se tornando rotina na televisão, de forma
serena, equilibrada e sensata, levam o brasileiro a repensar seu futuro. A
conhecer, analisar, debater e escolher caminhos. A transformar um país bastante
jovem e promissor, numa autêntica nação.
(Comentário
publicado na página 18, editoria de Artes, do Correio Popular, em 27 de abril
de 1984).
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