O mutante esporte das
multidões
Pedro
J. Bondaczuk
O futebol mudou, e
muito, nos últimos anos. As mudanças ocorreram em praticamente todos os
aspectos da modalidade. O material esportivo, para a sua prática, por exemplo,
modernizou-se e hoje é cientificamente planejado para que os jogadores mostrem
toda sua eficiência e habilidade sem que nada os atrapalhe. Os campos são cada
vez melhores, com gramados que são como que tapetes naturais. Isso, claro, nos
centros de elite. No Brasil... bem, a coisa não é bem assim. A expectativa,
porém, é que as coisas melhorem, até como legado dessa Copa do Mundo tão cara.
Tomara que os R$ 8 bilhões investidos em doze arenas sirvam para alguma coisa
que não somente para a disputa deste Mundial.
Até as regras do
futebol sofreram modificações (sobre as quais já tive oportunidade de tratar em
comentário anterior), apesar de poucos se darem conta. A mudança mais profunda,
no entanto, refere-se aos praticantes da modalidade (sobre o que comentarei com
mais detalhes e vagar oportunamente). Até não faz muito, por exemplo, a estatura
dos futebolistas pouco importava. O garoto que fosse um tantinho mais alto do
que a média era aconselhado a praticar basquete. Os baixinhos tinham vez e,
aliás, até contavam com a preferência dos clubes e treinadores, desde que,
claro, fossem de fato habilidosos. Hoje, jogadores com 1,78 metro são
considerados “baixos”. Raros conseguem oportunidades até nas chamadas
categorias de base. Por isso, poucos, pouquíssimos chegam a se
profissionalizar. São, na atualidade, exceções. não a regra. O futebol hoje em dia
é muito mais físico, muito mais força do que técnica ou tática. Isso vale tanto
para clubes, quanto, e principalmente, para seleções. Basta atentar para as 32
equipes nacionais que disputam a presente Copa. São uma coleção de “gigantes”.
É certo que os
jogadores considerados os mais talentosos do mundo, ou seja, Lionel Messi,
Neymar Junior e Cristiano Ronaldo, entre outros, não são propriamente de porte
avantajado. Como Ronaldinho Gaúcho, ´Romário e Ronaldo não eram. Como Andres
Iniesta não é. Muito pelo contrário. Todos os citados podem ser considerados,
se não nanicos, pelo menos baixinhos (ou quase) para os padrões atuais. Há quem
entenda que por isso é que são o que são. Ou seja, os mais habilidosos entre
milhares e milhares de outros jogadores. Creio que extrair essa conclusão é
forçar demais a barra. Não vejo razão para a estatura (no caso a baixa) ser
fator determinante de habilidade. Todavia, coincidência ou não, não há, no
momento, nenhum grandalhão que ameace, sequer de longe, a hegemonia técnica dos
tidos e havidos como melhores do mundo.
As mudanças nos
equipamentos dos atletas também foram muitas. Aliás, foram radicais. Não faz
muito, as chuteiras eram desconfortáveis, pesadas, feias e mais atrapalhavam do
que ajudavam no desempenho: na perfeição
de um passe, no domínio de bola e nos passes e nos chutes a gol. Hoje são
leves, praticamente “vestem” os pés e permitem máxima eficiência dos atletas no
jogo. E são multicoloridas. Chuteiras pretas são, cada vez mais, peças raras. E
a bola, então? Era um horror! Era de couro e, quando encharcada, em dias de
chuva, parecia feita de chumbo. Que diferença em relação às de hoje, sintéticas
e uniformes! Nenhum jogador pode usar,
como desculpa para não jogar bem, eventual inadequação dos equipamentos essenciais
de sua profissão.
Os goleiros, não faz
muito, não contavam com qualquer proteção manual. Usavam umas joelheiras
ridículas, parecidas com as utilizadas nos jogos de hóquei, que atrapalhavam, e muito, seus movimentos,
Era comum ver vários deles, se não a maioria, com mãos deformadas, com dedos
tortos em decorrência de inúmeras fraturas.
Hoje, os goleiros contam com luvas que, a exemplo das chuteiras, lhes
permitem exercer todo seu potencial defensivo, caso o possuam, sem receio de
contusões e nem de que as bolas deslizem por entre suas mãos.
As camisas, por sua
vez, são menos pesadas, mais absorventes e justas, como se fossem a própria
pele dos atletas. Houve tempos em que os uniformes dos clubes eram “limpos”. Ou
seja, contavam, na parte da frente, apenas com seus distintivos e, na
posterior, só com os números, e que eram de 1 a 11. Recorde-se que não havia
substituições. Propagandas não eram admitidas. Hoje, as camisas estão repletas
de logomarcas de patrocinadores que ajudam, e muito, nas despesas das
agremiações, mas descaracterizam aquele que é o principal símbolo dos clubes.
Há propaganda na frente, nas costas, nas mangas, além de nos calções e meias. E
os números são uma pafernália infernal, imitando, nesse aspecto, as numerações
do basquete ou do futebol americano. Se bobear, breve haverá publicidade,
também, na testa dos jogadores. Mesmo os campos evoluíram em vários aspectos:
transformaram-se em estádios, que viraram, recentemente, ou estão virando,
arenas, substituindo rústicas arquibancadas primeiro de madeira e depois de
cimento, por cadeiras razoavelmente confortáveis para os torcedores. Claro que
isso ocorre apenas com as praças esportivas dos clubes de elite, daqui e de
outras tantas partes do mundo.
Ainda há inúmeros
campos de futebol que são como pastos: mambembes, desconfortáveis e, sobretudo,
inseguros. Aliás, estes são a imensa maioria. Basta acompanhar, por exemplo, os
campeonatos brasileiros das séries D e C, quando não da B e alguns até da A,
entre outros. Há aqueles em que grama é raridade. São cheios de buracos,
verdadeiras armadilhas para contundir tanto craques quanto cabeças de bagre,
indiferentemente. Sem falar nos morrinhos “artilheiros”, tormentos de todas as
defesas, principalmente dos goleiros.
As traves, antigamente,
eram meros caibros, de formato quadrado, portanto com quinas, capazes de
provocar sérias contusões no infeliz que se chocasse com elas. Lembro-me de um
jogo, pelo Campeonato Paulista, (não me recordo envolvendo quais times), em que
o travessão quebrou no meio, ante uma bomba de um dos atacantes. Provavelmente estava
apodrecido de tanto tomar chuva e sol. Teve que ser trocado, para que a partida
tivesse sequência. Felizmente, não machucou ninguém. Hoje isso já não acontece
sequer no mais mambembe dos campos de várzea. Viram quanto assunto o futebol,
essa modalidade mutante, suscita, dentro e fora dos gramados? Daí não ser de se
estranhar que apaixone tanto, e tanta gente, ao redor do mundo.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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