Administrador de
vaidades
Pedro
J. Bondaczuk
O papel de um treinador
de qualquer modalidade esportiva de grupo, ou seja, coletiva, extrapola o campo
meramente técnico, notadamente tático. Cabe-lhe outra função tão importante
quanto estas duas, se não mais: a de “administrador de vaidades”. A de disciplinador
do vestiário. A de motivador, que saiba extrair o máximo de cada atleta em
favor do grupo. Isso vale tanto para clubes, quanto, e principalmente, para
seleções nacionais. Verifica-se, por exemplo, no basquete, no vôlei, no rugby,
no baseball e em todos outros esportes coletivos. E, claro, no futebol. Mas
antes de administrar a vaidade alheia, o treinador precisa, óbvio, administrar
a própria.
Poucas atividades,
esportivas ou não, fabricam mais ídolos do que o fascinante “esporte das
multidões”. Muitos e muitos jogadores apenas medianos são alçados à categoria
de craques por ação e obra da mídia. E quando caem do pedestal, ninguém admite
o exagero cometido. Os que exageraram simplesmente se calam a respeito. Talvez
apenas o show-business rivalize com, o futebol no que diz respeito à fabricação
de ídolos, sobretudo os grandes astros e estrelas do rock. As principais
“vedetes” futebolísticas têm suas habilidades exaltadas, não raro com nítido
exagero, pela imprensa esportiva, que as canta em verso e prosa.
Essas figuras
midiáticas são assediadas por apaixonados fãs de todas as idades e condições
sociais e as mais destacadas chegam a ser endeusadas. Poucos, pouquíssimos, não
se envaidecem com isso. Nem sei se existe alguém tão frio, tão realista e ponderado
a ponto de não se empolgar com tanta badalação.
No mundo do futebol esse envaidecimento exagerado é conhecido como
“máscara”. O leitor, com certeza, conhece, ou conheceu, muito jogador, mesmo
que apenas mediano, “mascarado”. Aliás, gente assim há em toda e qualquer
atividade. Pudera! Provavelmente eu,
você, Fulano, Sicrano e Beltrano nos envaideceríamos também em circunstâncias
semelhantes.
O perigo (quando se
trata de modalidade coletiva, como o futebol, em que todas as peças têm
importância) – tanta que se alguma não funcionar, o resultado para o todo pode
ser (e geralmente é) desastroso – é o sujeito, considerado astro, craque ou até
“gênio” pela imprensa e pela torcida, achar que possa ganhar sozinho algum jogo
ou, o que é pior, que tenha condições de vencer “todos” eles, todo um
campeonato, sem a participação de mais ninguém. Muitos acham que sim. Quase
sempre se dão mal.
O maior risco, nesses
casos, é o da “estrela da companhia” exigir determinados privilégios em relação
aos demais integrantes da equipe. Por que isso é arriscado? Por razões óbvias.
Porque seus companheiros podem se ver tentados a boicotá-lo. E esse boicote,
certamente, será prejudicial não apenas ao astro do time, que se verá
impossibilitado de mostrar toda sua habilidade (se a tiver), mas se refletirá
em todo o grupo, que correrá riscos de perder partidas que tinha potencial de
sobra para vencer. As vaidades têm, portanto, que ser muito bem administradas.
Na medida certa, elas podem ser benéficas, caso se trate, só, de autoconfiança,
mesmo que exagerada. Se o principal astro da equipe entender que não joga
sozinho e que todos seus companheiros têm a mesma importância, o grupo todo
tende a se motivar e a render seu máximo. Essa tarefa cabe ao treinador.
Quem já comandou alguma
equipe, quem foi técnico, por exemplo, de algum time de várzea ou mesmo de
futebol de salão, sabe o desafio que essa administração de vaidades significa.
O papel desse comandante é fazer com que todos seus comandados, sem qualquer
exceção, remem, e sempre, na mesmíssima direção. Muitos jogos, e não raro até
campeonatos, são vencidos nos vestiários. Mas muitos são perdidos ali também.
Só quem já esteve em um deles sabe o que se passa lá. Nada do que ocorre nesse
recinto (ou na concentração do clube) vaza para a imprensa. Não sei de nenhum
caso em que os conflitos internos – as ciumeiras, as desavenças, os
antagonismos e às vezes até bofetões entre desafetos – de algum grupo tenham
vindo a público. Rolam boatos, sistematicamente desmentidos. Essa é uma zona secreta,
secretíssima, fechada, fechadíssima, blindada, dos times e/ou seleções.
Já ouvi histórias
incríveis, passadas em vestiários e concentrações, da boca de ex-jogadores, mas
muito tempo depois de supostamente ocorridas, não raro, décadas mais tarde.
Elas soam tão inverossímeis, que chegamos a duvidar que sejam verdadeiras.
Quase sempre lhes damos ó mesmo crédito que às histórias de pescadores. Ou
seja, nenhum. Tudo bem que possa haver exageros em um ou outro caso. Mas não
creio que isso se verifique em todos. Muito jogador, que passou para a história
como herói, foi, na verdade, vilão. E vice-versa. Mas quais são eles em cada
uma dessas situações? Sabe-se lá!!!
No comments:
Post a Comment