Saturday, June 14, 2014

Lá se foi o primeiro degrau

Pedro J. Bondaczuk

A Seleção Brasileira subiu o primeiro dos sete degraus que é desafiada a subir, caso pretenda conquistar sua sexta Copa do Mundo. Presumo que pretenda, e muito. Venceu a equipe da Croácia por 3 a 1, não sem antes dar um susto daqueles na torcida. Digamos que “tropeçou”, logo ao dar o primeiro passo no início da “subida”. Caiu e esfolou os joelhos. Culpa, provavelmente, da tensão da estréia, levando em conta a juventude e a inexperiência do grupo nesse tipo de competição e ainda mais disputada no Brasil. É certo que no banco tinha dois profissionais experientíssimos: Luiz Felipe Scolari e Carlos Alberto Parreira. Mas a Seleção teve tempo de se recuperar, dar a volta por cima e superar o primeiro obstáculo.

Há quem atribua o êxito brasileiro a um polêmico pênalti assinalado pelo árbitro japonês a nosso favor. Discordo. E discordo com base na mesmíssima imagem dos 99% que se dizem convictos de que o apitador errou. Houve ou não houve a mão do zagueiro croata no ombro do Fred dentro da área? “Ah, esse contato não foi suficiente para derrubar o centroavante”, argumentam – não sem dose cavalar de arrogância – os que fazem o possível e o impossível para desmerecer a vitória brasileira. Vocês têm certeza disso? Baseados no quê? Na imagem? Mas esta mostra, nitidamente, o contato. “O Fred, ao sentir a mão no ombro, se jogou”, insistem os 99% que acham que não foi pênalti. E fez muito bem em se jogar. Eu, no lugar dele, faria o mesmo. Mas, insisto, não houve o contato? Quanto à suficiência ou não para causar a queda, só quem pode saber, óbvio, é quem o sofreu. Ou seja, é o Fred.

Já vi penalidades máximas muito mais absurdas do que esta serem assinaladas, sem causarem um milésimo do escândalo que esta causou. Meu próprio time, a Ponte Preta, sofreu inúmeras vezes com lances parecidos e ninguém (não raro, nem nossa torcida) reclamou. Que os croatas reclamem, é compreensível. Estão na deles. Mas que a crônica esportiva brasileira desmereça a vitória dos comandados de Felipão por causa desse lance, é muito para a minha cabeça. Agindo assim, deu corda para que a imprensa internacional, nada simpática a qualquer coisa que se refira ao Brasil (salvo raríssimas e honrosíssimas exceções), fizesse o barulho que fez e está fazendo e desse a entender que esta Copa está “armada” em favor dos pentacampeões mundiais, como se eles precisassem disso para a conquista do hexa.

A Seleção Brasileira jogou bem? Depende. Se forem considerados os quinze minutos iniciais, até tomar o gol e pouco depois desse “acidente” (pois para mim ficou claro que Marcelo não queria empurrar a bola contra a própria meta), claro que não. Os garotos não conseguiram controlar os nervos e tremeram na base face à responsabilidade da estréia. Eu tremeria. Você não? Mas na partida inteira, considerada em seu conjunto, a Seleção fez para o gasto. Ou vocês acham que a Croácia jogou melhor? Atribuir a vitória brasileira somente ao suposto erro de arbitragem (supondo que o japonês errou mesmo) é imensa sacanagem. Sacanagem com o Neymar, que nos momentos decisivos, apareceu e decidiu. Sacanagem com o Oscar, que calou a boca dos “milhões” de técnicos de botequim que defendiam sua saída da equipe para dar lugar ao William. Sacanagem com Luiz Gustavo, quase impecável na proteção à zaga. Sacanagem com David Luís, com sua vitalidade e entusiasmo.

Todo esse barulho feito em torno da atuação do árbitro japonês pode ter conseqüências muito ruins para a Seleção Brasileira. Pode, por exemplo, predispor os apitadores que vão mediar os próximos jogos do Brasil a errarem a nosso dano, a pretexto de evitarem erros que passem a impressão de que esta copa está “armada” para que conquistemos o hexa. Como a de 1966, na Inglaterra. Ou como a escandalosa ‘mandracagem” de 1978 em favor da Argentina. Essas sim foram “armadas”. Caso fosse anulado algum gol legítimo da Croácia, o que não aconteceu, a gritaria até que seria compreensível. Mas... nosso adversário não conseguiu vazar Júlio César nenhuma vez. Seu único gol foi acidental e feito por nosso lateral.

Ademais, o Brasil venceu por 3 a 1 e não por 2 a 1. “Ah, mas o pênalti desestabilizou os croatas”. Quem disse? O fato deles não terem feito nenhum gol (já que o único da sua seleção foi o do Marcelo) deve ser atribuído à instabilidade, devido ao suposto erro da arbitragem, ou a incompetência dos seus atacantes? É uma questão sumamente subjetiva. Os dotados do tal complexo de vira lata, de que Nelson Rodrigues tanto tratou, apostarão na primeira hipótese. Eu apostarei na segunda (e tenho o mesmo direito à opinião que os que acham que o pênalti não existiu e que ele determinou a vitória brasileira). Vão discordar de mim? Discordem à vontade. Mas discordem com argumentos e não com sofismas ou palavrões. De qualquer forma, com dificuldades ou não, o primeiro degrau rumo ao hexa foi superado. Que venham os outros seis.


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