Sunday, June 08, 2014

Evasão e repetência


Pedro J. Bondaczuk


Os políticos brasileiros, em especial os candidatos a cargos executivos --- prefeituras, governos de Estado e Presidência da República --- sempre que em campanha, nomeiam, invariavelmente, a educação como sua prioridade. Não estão errados nessa escolha.

Todavia, após eleitos, ou não cumprem suas solenes promessas de palanque, ou mostram que possuem uma visão distorcida, quando não mal intencionada, da questão ou forjam justificativas descabidas para sua falta de competência. Quando investem nesse setor, invariavelmente o fazem no sentido físico. Ou seja, na construção de prédios escolares, não raro superfaturados, deixando de lado o essencial: o ensino.

Sempre se disse que o principal problema educacional brasileiro era a evasão escolar. Não há dúvida de que é algo a ser levado em consideração. Dados de 1988 davam conta que mais de 80% das crianças em todo o País não completavam o primeiro grau.

Informes mais recentes, do Ministério da Educação, que foram repassados este ano ao Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), situam esse percentual em 39%, que ainda assim é alto.

Todavia, um estudo, que acaba de ser divulgado, elaborado pelo Laboratório Nacional de Computação Científica do Conselho Nacional de Pesquisa Científica e Tecnológica, sob a orientação do físico e educador Sérgio Costa Ribeiro, detecta um problema ainda mais grave, raramente mencionado ou levado em conta por políticos, pedagogos e planejadores. Trata-se da repetência. O índice dos que repetem é altíssimo e aumenta de ano a ano. Hoje a taxa situa-se em cerca de 50% já na primeira série do primeiro grau.

Nas escolas particulares, além de se constituir num ônus (muitas vezes intolerável para os pais), a reprovação traumatiza os alunos. Alguns têm toda sua vida modificada em decorrência disso. Adquirem complexos, criam bloqueios e não conseguem, de forma alguma, obter as notas necessárias para passar dde ano. Recebem (e assumem) a pecha de "burros".

Nas unidades públicas, a única diferença é a ausência do prejuízo material, da perda total do dinheiro despendido com as mensalidades. Não são poucos os casos de pais que, após a segunda repetência do menino ou menina, concluem, desalentados: "Filho, você não é bom da cabeça. Não dá para o estudo. É melhor aprender uma profissão que não dependa de diploma e arranjar emprego". E muitas vocações acabam sendo sufocadas dessa maneira.

A culpa, todavia, raras vezes é do aluno. Os autores do estudo supracitado asseguram: "Hoje, parte destas repetências são induzidas pela própria escola com argumentos de que é melhor que o aluno não faça as provas finais porque seus professores já decidiram que ele será reprovado. Uma forma perversa de dizer que o fracasso do aluno é culpa dele, de seus pais, da cor da sua pele ou do nível sócio-econômico de sua família".

Não é por acaso que o Brasil ocupa o último lugar no ranking do ensino básico, que reúne 129 países. Perde para o Gabão, o Haiti e a Arábia Saudita em termos de evasão escolar. A repetência induz à desistência. E o País soma mais alguns pontinhos em seu imbatível recorde mundial de desperdício, ao jogar fora tanto potencial humano.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 23 de setembro de 1994).


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