Friday, June 06, 2014

Fases da vida nacional

Pedro J. Bondaczuk

A vida humana é composta, basicamente, de três fases, perfeitamente demarcadas e com características próprias. Todos nos transformamos ao longo do tempo, a ponto de parecermos outra pessoa. Na saída da infância para a adolescência, somos ousados, propositivos, atrevidos até. É quando predominam os hormônios, em detrimento dos neurônios. Na idade madura, nos achamos realistas e tentamos dizer ao mundo a que viemos. Temperamos a ousadia da mocidade com a prudência de quem já viveu o suficiente para entender que mero vigor físico mal direcionado, impulsionado, apenas, pelo entusiasmo juvenil, ou seja, sem estratégia definida e bem planejada, quase sempre nos conduz ao fracasso, quando não ao desastre.  E, na velhice, não raro, entregamos os pontos, ou achando que já fizemos o máximo que poderíamos ou nos dando por vencidos reconhecendo a impossibilidade de conquista do ideal que nos moveu na juventude.

E os países, passam por essas fases? Entendo que sim, guardadas as devidas proporções. Estas considerações vêm a propósito do atual cenário político-social brasileiro. Observo, para quem venha, eventualmente, a ler estas reflexões num futuro distante, que redijo este texto em 5 de junho de 2014, há uma semana, portanto, da abertura da Copa do Mundo, que volta a ser disputada no Brasil, após 64 anos da realização do outro Mundial que promovemos em nossos domínios. O cenário daquele tempo era completamente diverso do que se desenha agora, e em todos os aspectos, quer esportivos, quer não.

Em 1950, a situação, dos dias que precederam o início do evento, era completamente diversa da que se verifica hoje. Naquela oportunidade, nosso país “quebrou o galho” da Fifa, para que não se passassem outros quatro anos sem Copa, já que ela deixara de ser disputada em 1942, auge da Segunda Guerra Mundial, e em 1946, quando o mundo tentava se recuperar da estúpida e dantesca devastação causada pelo conflito. A Europa não estava em condições de organizar o evento, atolada até o pescoço em problemas atinentes á reconstrução. Os Estados Unidos não se interessaram em assumir essa responsabilidade, até porque o que chamamos de futebol e eles chamam de “soccer” não era o esporte mais popular (ainda não é, mas na ocasião era muitíssimo menos) do país. E o Brasil, estava em condições de fazer isso? Nadava em dinheiro? Ora, ora, ora. Claro que não! Era ainda muito mais pobre e problemático do que é hoje. Todavia, organizou, e viu ser realizada, uma Copá do Mundo pelo menos digna, que só não foi próxima da perfeição, coroada de pleno êxito, porque no terreno desportivo ocorreu o tal do “Maracanazo”.

Contudo, na ocasião, não houve manifestações populares, conforme se ensaiam agora. E olhem que havia infinitamente mais motivos, então, do que há hoje. Levando em conta a época, proporcionalmente, as despesas com o Mundial foram bem mais representativas do que as de agora. Ou vocês pensam que construir um estádio como o Maracanã, que até a recente reforma era o maior palco de futebol do mundo, com capacidade para abrigar 200 mil pessoas, saiu barato? Para a ocasião, teve um custo proibitivo. A economia nacional era infinitamente mais medíocre do que a dos nossos dias. Porém, reitero, não houve multidões nas ruas cobrando as autoridades da época. Os setores de Educação e Saúde eram melhores do que são hoje? Ora, ora, ora. O dinheiro investido na promoção da Copa não seria melhor aplicado caso fosse investido nessas áreas? É evidente que sim. Mas... ninguém protestou.

Isso não quer dizer que as manifestações atuais não sejam legítimas. São, com as devidas ressalvas. São desde que sejam ordeiras e pacíficas, sem a presença de vândalos, de arruaceiros, de integrantes do crime organizado (fala-se da participação de membros do nefasto e ilegal PCC nas passeatas), de mascarados, de blackbloks, de agitadores profissionais das extremas direita e esquerda que atentem contra as instituições. São se forem  espontâneas, não comandadas por políticos oportunistas e covardes, escondidos sob a capa do anonimato, querendo se aproveitar dos holofotes da mídia internacional, que nunca se importou com a realidade do nosso país e que, mesmo sem motivos (ou com eles, não importa) se esmerou em nos denegrir há já tanto tempo.

Só pessoas muito ingênuas acreditam que se não houvesse Copa, todo o dinheiro investido na sua promoção iria para a Saúde e para a Educação, entre outras áreas. Ademais, o problema desses dois setores não é, sequer, a falta de recursos, mas sua péssima aplicação. Basta consultar os números. Mas suponhamos que faltem alguns bilhões de reais para a excelência dessas áreas. Alguém acredita que se o Mundial de 2014 não fosse realizado no Brasil, esse dinheiro iria mesmo para Educação e Saúde? Por que não foi, então, desde 1950? Passamos 64 anos sem promover Copa, mas esses setores sempre estiveram como estão. Aliás, as coisas já foram muito piores. Trata-se, pois, de argumento inconsistente, de sofisma, que não resiste à mínima análise lógica.

Há suspeitas de desvio de verbas para bolsos de espertalhões, mediante superfaturamento de obras (de estádios, aeroportos, meios de transporte etc.) e outras tantas mazelas que infelizmente se tornaram práticas comuns em nossa sociedade. Isso sim tem que ser devidamente apurado e, caso se comprovem tais fraudes, que os que as praticaram sejam rigorosamente punidos pelas leis. E que, sobretudo, o que eventualmente tenha sido surrupiado seja devidamente devolvido aos cofres públicos. Mas é mister, também, que os que se excederem, nas manifestações, que depredarem patrimônio público e privado, que saquearem e que agredirem quem não concorde com suas ações, paguem por seus delitos. E, principalmente, que indenizem os prejudicados.       .      
  
O filósofo Will Durant, no livro “Filosofia da vida”, escreveu: “A mocidade propõe, a maturidade dispõe, a velhice se opõe. A mocidade domina nos períodos revolucionários; a maturidade, nos períodos de reconstrução; e a velhice, nos períodos de estagnação”. Convenhamos, não vivemos nenhuma etapa revolucionária. Aliás, estamos fartíssimos de “revoluções salvadoras”, que nos atrasaram e desgraçaram por tanto tempo. A época atual também não é de estagnação. O Brasil está longe de ser um país envelhecido, esclerosado e sem energia. Reputo este período como o de maturidade nacional. Estamos, nestas mais de duas décadas posteriores à ditadura militar, num processo de reconstrução: da dfemocracia, das instituições e da própria sociedade. Mostremo-nos, portanto, maduros, equilibrados e responsáveis, sem o atrevimento inconsciente e sem rumo da juventude, mas sem a acomodação da velhice.

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