Sunday, June 15, 2014

O que conta é bola na rede

Pedro J. Bondaczuk

O futebol é um esporte, e, sobretudo, um jogo, bastante simples. Consiste em fazer a bola entrar mais vezes na meta adversária e impedir que o oponente faça o mesmo em suas redes. Quem conseguir isso será o vencedor. Todavia, para que tal ocorra, inventam-se táticas e mais táticas. Há toda uma teoria em torno da modalidade, cuja invenção é atribuída aos ingleses. Não sei se alguma delas, ou se todas, ganham jogos. Muitos acham que sim. Eu, da minha parte, tenho lá minhas dúvidas. As estratégias que, guardadas as proporções, simulam as que até não muito eram adotadas por generais à frente de seus exércitos em campos de guerra, variaram e variam ao longo do tempo. Nenhum estrategista, no caso o chamado “técnico de futebol”, jamais inventou uma tática absoluta, infalível, que garantisse a vitória sempre, em todo e qualquer time e em todas as circunstâncias. Ela não existe, claro.

No duro, no duro, o sucesso ou o fracasso dependem é da habilidade dos jogadores, tanto dos que defendem sua meta, quanto dos que atacam a adversária. No entanto... Criam-se teorias às vezes tão complicadas como a que Albert Einstein estabeleceu na Física, ou seja, a da Relatividade. Não faz muito, quando comecei a acompanhar futebol, ainda na minha tenra infância, a estratégia dominante era a que ficou conhecida como WM. A razão desse nome era óbvia. As colocações dos jogadores em campo, vistas do alto, formavam essas duas letras. O W era a postura das defesas e, por conseqüência o M, a dos ataques. Trocando em miúdos, não passava do ultra conhecido e manjado 4-3-3 que algumas equipes, e não tão raras assim, ainda adotam, posto que com múltiplas variações.

O que mais tem mudado nas táticas é o que se refere às funções dos jogadores. Não faz muito, por exemplo, o papel dos laterais era o de meramente defenderem. Quando Newton Santos, no jogo de estréia do Brasil, na Copa de Mundo de 1958, contra a Áustria, passou do meio de campo, em uma arrancada sensacional e fez um dos três gols brasileiros, foi um escândalo. Uns criticaram sua “ousadia” e outros viram nela possível inovação. Hoje, quem joga nos lados do campo da defesa tem que ter pulmões de aço. Precisa atacar e defender o tempo todo, dependendo das circunstâncias de jogo. Há, é verdade, técnicos que preferem que os laterais se limitem apenas a defender. Mas... Com o surgimento dos chamados “alas” extinguiram-se os pontas. Qual seria a função de Garrincha hoje? Não faço a menor idéia.

A polêmica mais recente, envolvendo táticas, refere-se à supressão do centroavante clássico, aquele fixo, que fica no meio da zaga adversária, cuja função é a de servir de pivô e, claro, a de arrematar para gol todas as vezes que surgirem brechas para tal. O Barcelona, no auge, abriu mão dessa figura, Passou a adotar o que se convencionou chamar de “falso 9”. A Seleção espanhola conquistou seu primeiro, e único, título mundial, em 2010, na África do Sul, com essa estratégia, Deu certo na ocasião, mas seu técnico, Vicente Del Bosque, resolveu mudá-la, aqui no Brasil. E, logo na estréia... deu-se mal. Sua seleção foi humilhada pela da Holanda, sofrendo  vexatória goleada, por 5 a 1. Claro que a contundente derrota não pode ser atribuída a isso, ou somente a isso. Mas os teóricos defensores do “falso 9”, insinuam que sim.

Deve-se olhar, todavia, para o lado vencedor. A Holanda valeu-se do centroavante convencional, incumbindo da tarefa o já veterano, mas ainda eficiente, Van Persie, que se destaca na Liga Inglesa, agora defendendo as cores do Manchester United (time até recentemente “bicho-papão” não somente da Inglaterra, mas da Europa). Foi ele que deu início à goleada, ao empatar o jogo, que terminaria com placar atípico, com um dos mais belos gols já marcados em copas do mundo. O que deu errado para a Espanha – embora o único gol espanhol tenha surgido de um pênalti duvidoso sobre seu camisa 9 tradicional, o brasileiro Diego Costa – deu certo, muito certo para a Holanda.

Mano Menezes tentou implantar na Seleção Brasileira essa tática consagrada pelo Barcelona. Deu certo em alguns jogos e não funcionou em tantos outros. Da minha parte, sou adepto do centroavante tradicional, embora cada vez mais escasso nos gramados brasileiros. Atribuo a maior parte da culpa dessa escassez aos treinadores das várias equipes de base. Em vez deles se preocuparem com a formação de atletas, se preocupam em vencer competições da categoria cujas conquistas não levam a lugar nenhum, optando, para isso, por cerradas táticas defensivas. Isso tem resultado na formação de excelentes defensores, mas de quase nenhum e eficiente atacante, desses chamados, metaforicamente, de “matadores”.

Apesar da escassez de centroavantes, confio no titular da camisa 9 da Seleção Brasileira, ou seja, em Fred. A única coisa que temo nele não se refere à sua eficiência na função, mas à sua fragilidade muscular, que volta e meia o tem afastado por longos períodos dos gramados. Entendo que ele, em boa forma física, tem plenas condições de manter a tradição brasileira de contar com eficientes centroavantes, desde Leônidas da Silva, passando por Ademir de Menezes, Mazola, Vavá, Dadá Maravilha, Reinaldo, Roberto Dinamite, Sérginho Chulapa, Romário, Ronaldo, Adriano e Luiz Fabiano, entre tantos e tantos outros.

Pelo menos no jogo de estréia do Brasil, contra a Croácia, Fred cumpriu bem seu papel. É certo que pegou poucas vezes na bola. Mas protagonizou o lance agudo e decisivo da partida, o pênalti que sofreu – que para 99% das pessoas não existiu, mas que, insisto, reitero e mantenho cada vez mais convicto minha opinião, houve  Afinal, as táticas são importantes? Talvez tenham lá sua importância, mas não entendo que sejam essenciais. O que conta, de fato, é o talento dos onze jogadores de uma equipe. Se este existir, não importa a estratégia que for adotada – se WM, se 4-2-4, 4-3-3, 5-3-2, 4-5-1, “carrossel holandês” ou qualquer outra que se invente – a vitória e o título dificilmente deixarão de vir. Até porque, queiram ou não, futebol é, em última análise, bola na rede dos adversários e nenhuma em nossa. Ou estou errado?


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