Saddam ganha solução honrosa
Pedro J. Bondaczuk
O
presidente iraquiano, Saddam Hussein, recebeu de bandeja, embrulhada para
presente, a solução honrosa de que precisava para se redimir de seu maior erro
político --- que foi a invasão e anexação do Kuwait --- das mãos do líder
soviético, Mikhail Gorbachev, e tratou de aceitar.
Antes,
todavia, deu um susto no mundo todo, que aguarda ansioso o fim dessa guerra
estúpida e sem propósito --- como todas, aliás, costumam ser. Num discurso
proferido pela Rádio Bagdá, horas antes do chanceler de seu país entregar a
resposta positiva do seu governo aos dirigentes do Cremlin, em Moscou, ele
havia dito, num árabe elegante, poético e recheado de expressões retóricas, que
estava disposto a lutar até o fim.
Esse
pronunciamento, aliás, causou confusão no mundo todo, entre estadistas,
jornalistas e analistas político-militares. Pareceu entrar em contradição com a
ação posterior, de aceitação do plano soviético. Puro engano de quem analisa os
fatos apressadamente.
No
momento em que falou pelo rádio, Saddam não poderia dizer aos iraquianos, de
forma alguma, que seu país aceitava se retirar incondicionalmente do Kuwait.
Isso afetaria o moral de seus soldados no front e é preciso não se esquecer que
a proposta não foi formulada pelo principal inimigo do Iraque, o presidente
norte-americano George Bush, mas pelo dirigente de um país que não está na
guerra.
Para
todos os efeitos, a luta continua, enquanto a Casa Branca não aceitar os termos
do plano. Bush intimou o Iraque a começar a retirada hoje.
Mais
uma vez, esse homem controvertido, que sonha em ser um novo Nasser, mostrou
autoconfiança, argúcia e principalmente muito sangue frio. Fez jus, portanto, à
classificação que lhe foi dada por um psiquiatra norte-americano, logo no
início da crise, no ano passado, como sendo uma pessoa dotada de
"inteligência perversa", muito longe de ser o louco que muitos
disseram que ele é.
Sua
aceitação à proposta de Gorbachev coloca Bush contra a parede, apesar das suas
ameaças e ultimatos. A despeito do presidente norte-americano argumentar que o
projeto de retirada é inaceitável, dificilmente continuará contando com o apoio
--- a não ser daqueles dirigentes políticos que nunca raciocinaram com suas
cabeças, mas sempre entenderam que "o que é bom para os Estados Unidos é
bom para seus países" --- da comunidade internacional para continuar a
guerra.
Seu
desejo --- e obviamente o de israelenses, sauditas, egípcios, kuwaitianos e dos
emirados do Golfo --- é o de depor Saddam. Este, porém, parece ter aprendido a
lição deixada pelo velho conselheiro de Luís XIII, cardeal Richelieu, que disse
certa vez: "A habilidade de um estadista reside em desarmar os
acontecimentos e armá-los em seu favor".
(Artigo
publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 23 de fevereiro
de 1991).
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