Saturday, June 07, 2014

Bolo volta a crescer


Pedro J. Bondaczuk


O clima no País, após a eleição de Fernando Henrique Cardoso para a Presidência, logo no primeiro turno, com uma votação espetacular, é de esperança, quase que de otimismo. Ao fator da vitória do introdutor do Plano Real, homem de reconhecido talento de negociador e de bagagem cultural indiscutível, sima-se um panorama internacional favorável à retomada do desenvolvimento econômico brasileiro, que acontecerá, fatalmente, caso haja senso de oportunidade e o momento propício não venha a ser perdido por ausência de visão.

Há consenso entre os economistas, não importa de que tendência – se ortodoxos, heterodoxos, hetero-ortodos ou orto-heterodoxos – de que a recessão, de triste memória e que se mostrou sobretudo desastrosa no aspecto social, é coisa do passado.

Entendem esses técnicos que, doravante, a economia nacional irá crescer de maneira segura e contínua, pelo menos até 2005. As controvérsias residem somente no que diz respeito às taxas desse crescimento e à destinação que se deve dar ao seu fruto.

Alguns, mais eufóricos, chegam a prever uma evolução anual do Produto Interno Bruto em 9%, 10% e até 13% (como a China). Outros, mais moderados, estimam que gire ao redor de 6%, o que é razoável se for levado em conta que, mesmo com inflação elevada, o PIB cresceu, no ano passado, mais de 5%.

A expectativa generalizada é a de que o Plano Real vá ter os ajustes que se fazem necessários para que não se transforme em mero “cabo eleitoral” de Fernando Henrique, o que seria trágico.

Findas as eleições, esfriado o calor das campanhas, amainadas as paixões, pode-se dizer, com tranqüilidade, que doravante o programa de ajuste perde a necessidade de ser vinculado a fulano, sicrano ou beltrano. Hoje é um projeto sem donos, nacional, do todos os brasileiros, que de uma forma ou de outra contribuíram para o seu relativo sucesso. Mesmo os que tentaram sabotar a nova moeda, em virtude da perda do lucro inflacionário, posto que forçados, deram sua parcela de contribuição.

Admitindo um novo e saudável surto desenvolvimentista, é preciso que desta vez não se incorra no mesmo erro da época que se convencionou chamar de “milagre econômico” – que para seus defensores, mereceu a designação e para a maioria se tornou uma expressão de ironia para um monumental fiasco – quando se dizia que era necessário primeiro fazer o “bolo da riqueza” nacional crescer, para só então distribuir as fatias entre os responsáveis por esse desenvolvimento.

O País desenvolveu-se. Causou admiração e inveja no mundo pelas altas taxas de crescimento que ostentou. Mas na hora da divisão...Bem, nem é preciso reiterar o que aconteceu.

O Brasil atual é a sociedade mais perversa do mundo em termos de distribuição de renda. Pouquíssimos detêm a quase totalidade do que foi gerado no período desenvolvimentista. A maioria da população, se não está na indigência (e o pior é que está), sobrevive com migalhas microscópicas do tal “bolo”.

Que desta vez a divisão seja simultânea ao crescimento e proporcional à participação de cada um nele. Até para o mercado consumidor expandir-se na mesma proporção do aumento vegetativo da população e não se restringir aos mesmos 18 milhões a 20 milhões, que há mais de uma década constituem a categoria dos que têm acesso ao consumo.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 12 de outubro de 1994).


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