Wednesday, June 18, 2014

Sementes de urtiga

Pedro J. Bondaczuk

Os bombardeios norte-americanos realizados na segunda-feira, contra as cidades líbias de Trípoli e de Benghazi, estão produzindo as primeiras reações de represália contra bens e cidadãos dos Estados Unidos, em várias partes do mundo. Os britânicos, por terem apoiado, material e moralmente essa ação militar, por extensão, também estão sendo alvos de hostilidades, em especial na tensa região do Oriente Médio.

Os extremistas parecem, dessa maneira, estar atendendo à convocação do “doutrinador” da Líbia, coronel Muammar Khadafy, para darem o revide aos ataques da Sexta Frota. Lamentavelmente, como sempre acontece quando dois povos se desentendem, pessoas alheias aos acontecimentos estão pagando pelo que não fizeram.

Na terça-feira, um norte-americano morreu baleado em Cartum, no Sudão, no auge de uma manifestação contra a atitude de Ronald Reagan. Ontem, um automóvel de um cidadão desse país, foi incendiado, no centro de Tunis, por um coquetel molotov.

Mas o incidente mais grave, relacionado com a Líbia, ocorreu no Líbano, ontem, onde três reféns britânicos – um jornalista e escritor que estava a serviço das Nações Unidas e dos professores universitários – pessoas, portanto, completamente desvinculadas da política, foram assassinados na região das montanhas que circundam Beirute.

Imagine o leitor o desamparo desses três homens, isolados numa terra que não é a sua (onde estavam a serviço), indefesos e manietados e entregues à sanha vingadora de alguns fanáticos! Calcule o desespero de outros estrangeiros seqüestrados nesse país. Tente compreender o medo, a insegurança e o desamparo que eles sentem, sem que nada ou ninguém possam vir em seu socorro. Será que Reagan não pensou neles?

Fatos, como estes, desgraçadamente, deverão repetir-se, doravante, com maior intensidade do que antes. Não porque o coronel líbio, Muammar Khadafy, não foi morto, como parece ter sido o objetivo do bombardeio realizado contra o seu quartel fortificado de Bab-el-Azziz, ou contra a sua residência em Trípoli.

Se fosse, as coisas poderiam ser, até, bastante piores, porquanto estaria sendo fabricado um mártir para espicaçar o desequilíbrio e o fanatismo daqueles que fazem da violência seu instrumento de reivindicação. É evidente que, por mais grave que seja o atual incidente, em pouco tempo ele irá se esvaziar, por si só.

Teremos os protestos, ameaças e condenações de sempre, nos próximos dias, a exemplo do que sempre aconteceu em outros incidentes de igual e até de maior porte do passado e tudo irá voltar à normalidade. Mas até que isso aconteça, centenas de inocentes serão colhidos por bombas, seqüestros e outros atos de violência. E nada de realmente prático e producente será feito. Quem lhes devolverá a vida?

Existem hoje no mundo milhares de campos de refugiados, abrigando milhões de pessoas que perderam tudo o que possuíam. São cambojanos, coreanos, chineses, vietnamitas, palestinos, salvadorenhos, etíopes, sudaneses etc. É gente de todas as nacionalidades e procedências, vítima da brutalidade e que conheceu apenas uma linguagem desde que nasceu. Ou seja, aquela expressada pelo ódio, motor que impulsiona essas pessoas, que não têm mais nada a perder, a revidar violências sofridas.
Enquanto existirem tantos indivíduos sem terem sequer uma pátria para amar, intoxicados de ressentimentos e sonhando com um pedaço de chão que lhes pertença, não será culpando esse ou aquele líder que não nos seja simpático ou bombardeando esta ou aquela cidade dos territórios que eles controlam que o terrorismo será contido.

A tese da punição, para servir de exemplo aos pretensos patrocinadores do terror, não passa de balela. Vários Estados dos Estados Unidos têm pena de morte para seus criminosos. Muitos aplicam essas sentenças fatais sem nenhuma parcimônia. Nem por isso, porém, os índices de criminalidade baixaram. Afinal, de uma semente de urtiga, jamais haverá de nascer uma rosa. Assim como a paz não nasce da violência.

Quanto ao efeito prático, é tão condenável explodir uma discoteca e matar dois cidadãos, quanto bombardear duas cidades, atingindo pessoas que não têm a mínima chance de defesa. Numericamente, inclusive, a segunda atitude é bem mais criminosa. Ou será que algum ser humano é mais valioso do que outro?

(Artigo publicado na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 18 de abril de 1986).


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