Sunday, June 22, 2014

Espectro da morte


Pedro J. Bondaczuk


 O presidente peruano, Fernando Belaunde Terry, teve um espectro terrível e assustador a atrapalhar todo o seu mandato presidencial, que deverá se encerrar em 28 de julho próximo, quando ele vai entregar o poder a seu sucessor, provavelmente o aprista Alan Garcia.

Sua gestão, por causa desse obstáculo gigantesco, entre tantos outros que foram desde o econômico ao social, fez com que fosse forçado a recorrer, muitas vezes, a instrumentos de exceção, como o estado de emergência, para impedir que o Peru caísse numa completa anarquia. Referimo-nos ao fantasma do grupo guerrilheiro, de tendência maoísta, “Sendero Luminoso”.

Essa entidade, cruel e fanática, responsável por um clima de pavor vivido pelos habitantes dos Departamentos de Ayacucho, Huancavélica e Apurimac, nasceu junto com a eleição de Belaunde Terry, consagrado nas urnas no dia 18 de maio de 1980, fato que lhe permitiu retornar triunfante ao governo no dia 28 de julho, 12 anos após ter sido deposto pelo general Juan Velasco Alvarado.

O Sendero Luminoso foi criado nessa época, pelo ex-professor de Filosofia da Universidade Nacional de San Cristóbal, Abimael Guzman. Está completando, portanto, nesta semana, seu quinto aniversário. Junto com o governo de Terry.

Neste tempo todo conseguiu a nada meritória façanha de implantar, no Peru, o clima de maior violência política, de morte e de destruição de toda a sua história. Cinco mil pessoas, pelo menos, já foram mortas desde que esse “caminho”, que se diz luminoso, mas que, na verdade, tem conduzido apenas as pessoas ao inferno da incerteza e do medo, foi compulsoriamente traçado para muitos peruanos.

A violência dos extremistas tem despertado reação de igual calibre do governo. E, no meio desse fogo cruzado, muitos inocentes têm sido vitimados, aliás a maioria, contando-se às centenas as pessoas “desaparecidas”, cujos cadáveres têm aparecido até em depósitos de lixo, dias depois do seu sumiço, geralmente desfigurados.

Raras são as semanas em que valas comuns, repletas de restos mortais de peruanos, não são encontradas. O fanatismo e a prepotência dos discípulos do professor Abimael têm redundado apenas em assassinatos de jornalistas, desaparecimento de pessoas pacatas (geralmente camponeses), pontes destruídas ou danificadas, trens descarrilados, estradas interrompidas e destruição generalizada em instalações governamentais.

Isso, num país pobre, representa uma sangria de verbas intolerável. É um desperdício de preciosos recursos nacionais, tão parcos e disputados, capaz de colocar qualquer orçamento em virtual colapso. E de levar, por conseqüência, qualquer regime ao caos.

A população peruana teve, no mês de março passado, um motivo a mais de preocupação. É que, nos principais cinemas do país foi exibido o filme “Os gritos do silêncio”, baseado numa história verídica, ocorrida no Camboja, nos anos negros em que os Khmers Vermelhos trucidaram um terço da população cambojana. Assustados, eles puderam ver a semelhança das situações. Perceberam os métodos de ação idênticos entre os guerrilheiros de Pol Pot e os senderistas de Abimael Guzman.

O problema todo se resume, hoje, em como acabar com essa ação niilista. O presidente eleito, Alan Garcia, já mandou o seu recado de que não vai negociar com o Sendero Luminoso. As forças anti-guerrilha do Exército mostraram-se impotentes para desmantelar o grupo, um dos mais ativos e perigosos de toda a América Latina.

O professor Guzman também já avisou que somente vai parar seus ataques quando assumir, pela força, o poder, o que, é óbvio, jamais vai ocorrer. Está aí uma terrível situação de impasse. Enquanto isso, o Peru se debate em problemas sociais tão prementes, os seus deserdados são tão desvalidos e marginalizados, que o escritor peruano, Manuel Scorza, em seu livro “Garambombo, o invisível”, criou um líder involuntário para essas massas subjugadas que pensa ter o dom da invisibilidade, tamanha é a sua insignificância social...

(Artigo publicado na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 18 de maio de 1985).


Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk            

No comments: