Espectro da morte
Pedro J.
Bondaczuk
O presidente peruano, Fernando Belaunde Terry,
teve um espectro terrível e assustador a atrapalhar todo o seu mandato
presidencial, que deverá se encerrar em 28 de julho próximo, quando ele vai
entregar o poder a seu sucessor, provavelmente o aprista Alan Garcia.
Sua gestão, por causa desse obstáculo gigantesco, entre
tantos outros que foram desde o econômico ao social, fez com que fosse forçado
a recorrer, muitas vezes, a instrumentos de exceção, como o estado de emergência,
para impedir que o Peru caísse numa completa anarquia. Referimo-nos ao fantasma
do grupo guerrilheiro, de tendência maoísta, “Sendero Luminoso”.
Essa entidade, cruel e fanática, responsável por um clima
de pavor vivido pelos habitantes dos Departamentos de Ayacucho, Huancavélica e
Apurimac, nasceu junto com a eleição de Belaunde Terry, consagrado nas urnas no
dia 18 de maio de 1980, fato que lhe permitiu retornar triunfante ao governo no
dia 28 de julho, 12 anos após ter sido deposto pelo general Juan Velasco
Alvarado.
O Sendero Luminoso foi criado nessa época, pelo
ex-professor de Filosofia da Universidade Nacional de San Cristóbal, Abimael
Guzman. Está completando, portanto, nesta semana, seu quinto aniversário. Junto
com o governo de Terry.
Neste tempo todo conseguiu a nada meritória façanha de
implantar, no Peru, o clima de maior violência política, de morte e de
destruição de toda a sua história. Cinco mil pessoas, pelo menos, já foram
mortas desde que esse “caminho”, que se diz luminoso, mas que, na verdade, tem
conduzido apenas as pessoas ao inferno da incerteza e do medo, foi
compulsoriamente traçado para muitos peruanos.
A violência dos extremistas tem despertado reação de igual
calibre do governo. E, no meio desse fogo cruzado, muitos inocentes têm sido
vitimados, aliás a maioria, contando-se às centenas as pessoas “desaparecidas”,
cujos cadáveres têm aparecido até em depósitos de lixo, dias depois do seu
sumiço, geralmente desfigurados.
Raras são as semanas em que valas comuns, repletas de
restos mortais de peruanos, não são encontradas. O fanatismo e a prepotência
dos discípulos do professor Abimael têm redundado apenas em assassinatos de
jornalistas, desaparecimento de pessoas pacatas (geralmente camponeses), pontes
destruídas ou danificadas, trens descarrilados, estradas interrompidas e
destruição generalizada em instalações governamentais.
Isso, num país pobre, representa uma sangria de verbas
intolerável. É um desperdício de preciosos recursos nacionais, tão parcos e
disputados, capaz de colocar qualquer orçamento em virtual colapso. E de levar,
por conseqüência, qualquer regime ao caos.
A população peruana teve, no mês de março passado, um
motivo a mais de preocupação. É que, nos principais cinemas do país foi exibido
o filme “Os gritos do silêncio”, baseado numa história verídica, ocorrida no
Camboja, nos anos negros em que os Khmers Vermelhos trucidaram um terço da
população cambojana. Assustados, eles puderam ver a semelhança das situações.
Perceberam os métodos de ação idênticos entre os guerrilheiros de Pol Pot e os
senderistas de Abimael Guzman.
O problema todo se resume, hoje, em como acabar com essa
ação niilista. O presidente eleito, Alan Garcia, já mandou o seu recado de que
não vai negociar com o Sendero Luminoso. As forças anti-guerrilha do Exército
mostraram-se impotentes para desmantelar o grupo, um dos mais ativos e
perigosos de toda a América Latina.
O professor Guzman também já avisou que somente vai parar
seus ataques quando assumir, pela força, o poder, o que, é óbvio, jamais vai
ocorrer. Está aí uma terrível situação de impasse. Enquanto isso, o Peru se
debate em problemas sociais tão prementes, os seus deserdados são tão
desvalidos e marginalizados, que o escritor peruano, Manuel Scorza, em seu
livro “Garambombo, o invisível”, criou um líder involuntário para essas massas
subjugadas que pensa ter o dom da invisibilidade, tamanha é a sua
insignificância social...
(Artigo publicado
na página 9, Internacional, do Correio Popular, em 18 de maio de 1985).
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