Afinal uma atitude de racionalidade
Pedro J. Bondaczuk
O
novo presidente sul-africano, Frederick de Klerk, iniciou o seu governo de uma
maneira bastante positiva, embora hostilizado pela oposição radical de
extrema-direita. Em primeiro lugar, abriu a possibilidade de haver pelo menos
um princípio de pacificação nacional, ao garantir aos negros que fatalmente vai
conceder alguma espécie de direito político a eles. É claro que isto ainda não
é o ideal. Afinal, eles são a esmagadora maioria da população do país e não têm
nenhuma espécie de representação. Nem no Parlamento e nem em qualquer outro
cargo governamental.
O correto seria os negros terem direito a voto, como
qualquer outro cidadão. Que ninguém fosse discriminado por nada. Quer pela cor,
quer por sua ideologia, quer por sua condição social ou crença religiosa. Isto
e somente isto pode ser chamado de democracia.
Mas para um país onde o “apartheid” predomina já por
40 anos, não deixa de ser um passo bastante promissor o dado pelo novo
presidente. Principalmente quando ele garantiu que manifestações de caráter
pacífico não mais seriam reprimidas pela polícia. E, o que é melhor, no
primeiro teste prático, cumpriu o que prometeu.
Nos últimos três dias, os sul-africanos puderam
presenciar algo que já havia sido esquecido por eles: três marchas de protesto,
nas três cidades mais importantes da África do Sul, Capetown, Pretória e
Johannesburgo, respectivamente, sem que se verificassem as deprimentes cenas de
selvajaria, por parte das forças de segurança, com as quais, desgraçadamente, o
mundo se acostumou.
Sem o típico festival das bombas de gás
lacrimogêneo, da pancadaria com cassetetes contra manifestantes indefesos,
quando não de chicotadas, num acinte à dignidade das pessoas. Sem notícias de
prisão de jornalistas ou agressões a cinegrafistas de televisão. Sem informes
de mortos, feridos e de prisões em massa.
Não se pode, portanto, deixar de assinalar esse
importante ponto em favor de de Klerk e torcer para que ele não pare por aí. Os
próprios sul-africanos, certamente, verão os benefícios dessa atitude em
pouquíssimo tempo, caso os negros tenham, realmente, seus direitos
reconhecidos.
Os ódios acumulados através de décadas vão ceder
lugar à cooperação. Os ressentimentos vão cicatrizar. A tensão irá desaparecer.
A África do Sul voltará a conviver com a comunidade internacional, da qual está
segregada, exatamente por adotar uma política segregacionista.
E o progresso que o país experimentar será tal, que
mesmo os brancos mais radicais vão se arrepender de não terem tomada uma
atitude desse porte antes. Muito antes de 1989. Tomara que tudo não venha a se
reduzir, porém, a um mero ensaio.
(Artigo publicado na página 11, Internacional, do
Correio Popular, em 16 de setembro de 1989).
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