Monday, June 23, 2014

Água fria na fervura

Pedro J. Bondaczuk

O pronunciamento do ministro da Fazenda, Eliseu Resende, no Senado, quando foi sabatinado por cerca de seis horas, se na afastou de vez a crise política que estava se desenhando desde a demissão de Paulo Haddad, no dia 1º, pelo menos jogou água gelada na fervura.

Alguns, mais afoitos, chegaram a cogitar da substituição do presidente Itamar Franco, antecipando o processo sucessório, como se com isso estivessem prestando um serviço ao País. Tais inconseqüentes pensam que tudo não passa de um jogo. Esquecem-se que há milhões de vidas envolvidas no processo. Que o Brasil carece de uma diretriz, que há muito tempo não tem, e de tranqüilidade para trabalhar e retomar o difícil processo de desenvolvimento, após 14 longos e perdidos anos de recessão.

É verdade que Itamar Franco precisa medir suas palavras. Tem que entender que hoje não é mais um simples parlamentar, mas o presidente de todos os brasileiros. E não somente dos que o apóiam, mas também dos que se lhe opõem.

Nessa condição, pela própria natureza da função que exerce, e em decorrência da armadilha deixada pela Constituição de 1988 – eminentemente parlamentarista, para um regime presidencialista – se requer dele diplomacia, tato, prudência e enorme capacidade de liderança. Não se pode afirmar que o político mineiro (que na verdade é baiano) não possua essas virtudes. Todavia, se as tem, e não há porque duvidar que tenha, as esqueceu em Juiz de Fora.

Mas a recíproca é verdadeira. Não é da competência de nenhum grupo parlamentar, ou empresarial, ou sindical, ou seja lá do que for, cercear os atos do presidente naquilo que é a sua legítima atribuição, como a escolha ou a demissão de ministros.

Neste aspecto, Itamar foi coerente com o que sempre afirmou. Desde que assumiu o cargo, disse, em várias oportunidades, e reiterou, sempre que provocado, que no momento em que qualquer de seus auxiliares não merecesse mais a sua confiança, seria imediatamente demitido. Foi o que ocorreu com Paulo Haddad.

Não se entra no mérito da questão sobre se a troca foi justa ou injusta. Essa é atribuição exclusiva do presidente e, convenhamos, a demissão não merecia tanto barulho. Até porque, quando da escolha do agora ex-ministro, ainda para o recriado Ministério do Planejamento, as críticas se sucederam.

O interessante é que, os mesmos que criticaram a indicação, em outubro, trataram Paulo Haddad como se fosse um salvador da pátria, sem o qual o País entraria em caos, quando da sua saída. Incoerência! Incoerência pura!

Coincidência ou não, a tentativa de desestabilização de um governo por si só frágil e inseguro, começou quase que simultaneamente com o início da pífia campanha para o plebiscito. Há quem queira “passar o carro na frente dos bois”, indiferente se este é o não o melhor caminho para o País.

Eliseu Resende, em seu depoimento no Senado, apenas confirmou o que todos sabiam, mas muitos se faziam de desentendidos. Ou seja, que em momento algum se cogitou de choques, congelamentos, prefixações, maxidesvalorizações e tantas outras bobagens típicas de tecnocratas que entendem que o País é um laboratório para testar suas teorias estapafúrdias.

Neste ínterim, muitos encheram seus bolsos com o que não lhes competia, mas a economia brasileira viveu outro de seus cíclicos terremotos, embora este sismo tenha sido, felizmente, de baixa intensidade.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 12 de março de 1993).


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