Pedro J. Bondaczuk
O Uruguai perdeu, ontem, um de seus homens públicos mais combativos e brilhantes: Wilson Ferreira Aldunate, que morreu, aos 69 anos de idade, vítima de um câncer no pulmão. Político de trajetória vitoriosa, não conseguiu realizar, todavia, seu maior sonho, que era o de presidir o país.
Nesse aspecto, assemelhou-se ao nosso Ruy Barbosa, que ocupou diversos postos de destaque na época da Monarquia e da República, mas jamais logrou ser presidente. Mesmo depois das memoráveis campanhas civilistas que empreendeu, que, no entanto, não conseguiram vencer os poderosos “coronéis” detentores de “votos de cabresto”.
Aldunate esteve em duas oportunidades na iminência de conseguir a máxima magistratura uruguaia. A primeira foi em 1971, quando venceu todos os seus oponentes, mas acabou vencido pelo sistema eleitoral vigente, que contemplava uma espécie de sublegenda.
Os vários candidatos do mesmo partido poderiam somar seus votos ao daquele que tivesse melhor performance nas urnas. Dessa maneira, regras inadequadas, e não condizentes com a democracia, derrotaram-no na ocasião.
Sua segunda chance poderia acontecer nas eleições presidenciais de 1984, quando da redemocratização do Uruguaio. Mas os militares tinham uma birra contra o político blanco que, aliás, passou metade da sua vida no exílio. Pesava, sobre ele, uma absurda proibição: a de não poder retornar ao país, mesmo na oportunidade em que se cantava, em verso e prosa, a existência de um processo de abertura que, no fim das contas, iria desembocar, de fato, na devolução do poder aos civis.
Aldunate achou isso absurdo. Afinal, era uruguaio e devia lealdade, tão somente, à sua pátria, e não a corporações, grupos ou fosse lá o que fosse. Num determinado dia, reuniu 300 compatriotas de coragem, convocou a imprensa, fretou um navio e partiu de Buenos Aires, onde estava exilado, Rio da Prata afora, rumo à terra natal.
Foi um tremendo estardalhaço (e nós registramos nesta página e comentamos o fato, na oportunidade). O barco foi ameaçado, até, de afundamento. No fim das contas, o líder do Partido Nacional foi preso e impedido de disputar as eleições presidenciais.
Wilson Ferreira Aldunate foi solto, apenas, quatro dias depois da votação. Mas seu ato de coragem impediu que os militares fraudassem o processo de abertura em andamento., como se temia, em muitos círculos locais e do exterior.
Foi um grande homem, este Aldunate, do mesmo porte de um Artigas, herói nacional do Uruguai. Esta mesma América Latina, que produz os Pinochets, Stroessners e Noriegas, portanto, às vezes, também, dá oportunidade para o surgimento de líderes com essa grandeza. Seus compatriotas, certamente, jamais haverão de esquecer seu nome e sua coragem.
(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 16 de março de 1988)
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