Pedro J. Bondaczuk
A forma como nós, humanos, nos relacionamos com o mundo em que vivemos, e com tudo e todos que nele estão é mediante nossos sentidos. Até aí, limitei-me a agir como aquele personagem de Eça de Queiroz no romance “O primo Basílio”, o Conselheiro Acácio, useiro e vezeiro em dizer obviedades. Isso que afirmei qualquer criança recém alfabetizada sabe de sobejo. E vai além, identifica quais são esses sentidos: visão, audição, olfato, tato e paladar. Mas... teríamos apenas estes?
Não haveria nenhum outro, não catalogado pelos biólogos, ou pelo menos não caracterizado como tal? Há e ele é muito mais sofisticado do que esses cinco. Qual é? É a intuição!!! Este é o tão citado (e pouco compreendido) sexto sentido. Sua principal característica é o caráter premonitório que tem. Ou seja, nos “avisa” sobre algum perigo (iminente ou remoto, concreto ou potencial) antes que os outros cinco sejam acionados e nos previnam a propósito. Age, pois, antes que vejamos, ouçamos, cheiremos, apalpemos ou mesmo degustemos (no caso de alguma substância venenosa que estejamos prestes a ingerir) o que tende a colocar nossa integridade física e até nossa sobrevivência em risco.
Por que trago este assunto à baila, num espaço destinado à Literatura? Calma, eu explico. Estou fazendo pesquisas a respeito para compor um personagem de um conto já esboçado que pretendo escrever. E quero que, entre outras características, ele seja um sujeito altamente intuitivo, mas, sobretudo, verossímil, dessas pessoas comuns que a gente encontra em toda e qualquer parte. Por que? Porque o segredo da boa ficção está na verossimilhança. Personagens e enredos excessivamente fantasiosos arruínam um bom conto, uma boa novela, um romance promissor e, pior, fazem o autor cair em descrédito.
É mister que se destaque que a intuição, fruto dos instintos e não da razão, não nos serve apenas para nos livrar de perigos ou de determinadas encrencas que, mesmo que não ameacem nossa integridade física, são chatíssimas, são fontes de aborrecimentos perfeitamente evitáveis. Ademais, é uma espécie de “start”, de ponto de partida para descobertas e criações. O filósofo Immanuel Kant observou, com pertinência, a respeito: “Todo o conhecimento humano começou com intuições, passou daí aos conceitos e terminou com idéias”. Como se vê, não conseguimos aprender coisíssima alguma de nada sem atendermos aos avisos dessa espécie de voz interior que antecipa os acontecimentos. O notável economista Joseph Alois Schumpeter escreveu, do alto da sua experiência de homem bem sucedido: “O bom êxito de tudo depende da intuição, da capacidade de ver as coisas de uma forma que depois se apresenta como verdade, embora não possa ser estabelecida no momento, e da compreensão do fato essencial, descartado o acessório, embora não se possa descrever os princípios que o levaram a tal prática”.
Já me dei muito bem, e também muito mal, em decorrência desse sexto sentido. Fiz coisas que a razão me dizia que estavam acima do meu alcance, mas que essa “vozinha” secreta me cochichava, “vai, Pedro, que dá” e que acabaram dando certo. Em contrapartida, meti-me em monumentais encrencas, que poderia evitar, mas não evitei por não dar ouvidos à intuição que me incitava a pular fora daquelas situações, aparentemente tranqüilas, benignas e vantajosas, mas que, no final das contas, revelaram-se insidiosas armadilhas, nas quais caí por ceticismo aliado a uma teimosia de jumento.
É verdade que a razão também nos adverte dos riscos, pelo menos dos mais óbvios. Todavia, não nos sugere qual deva ser nosso procedimento face a determinados perigos. Tudo bem, isso é perigoso, mas o que fazer? Fugir? Enfrentar? E nesse segundo caso, como? Qual a estratégia a ser adotada? A razão raramente (salvo uma ou outra exceção) nos sugere isso. Por que? Porque é analítica. Porque é lógica. E há situações em que a solução possível é fora da convencional. Requer certa dose de ousadia e, principalmente, de instinto. O escritor e ensaísta francês, Joseph Joubert, concluiu, com base na sua experiência: "A razão pode advertir-nos do que é preciso evitar; só a intuição nos diz o que há que fazer". Por isso, é uma imensa tolice não lhe darmos ouvido.
E se (ou quando) não lhe dermos, não teremos justificativa válida. O escritor e especialista em desenvolvimento pessoal, Shakti Gawain, lembra: “A maioria de nós está em contato com nossa intuição quer saibamos disto ou não, mas normalmente temos o hábito de duvidar dela ou contradizê-la tão automaticamente que nós nem percebemos que ela tem falado”. A falha, portanto, nunca está nela, mas sempre em nós.
É nossa arrogância, em nos julgarmos autossuficientes (que de fato nem somos) que nos mete em confusões que não precisávamos nos meter. Quase sempre o argumento que usamos (para nós mesmos) para duvidar da intuição é a sua aparente “falta de lógica”. Muitas vezes ela parece, mesmo, absurda, fora de propósito e dos padrões convencionais com que estamos acostumados a raciocinar. A maioria das descobertas, todavia, aparenta, a princípio, ser ilógica. Porém... nem tudo o que aparenta, é. Não há quem nunca não tenha ouvido, ou mesmo dito, que “as aparências enganam”. E como enganam!
O matemático e físico francês, Jules Henri Poincaré, constatou: "Provamos através da lógica, mas descobrimos a partir da intuição". E vocês querem pessoa mais habilitada para tratar desse assunto do que um cientista com sua habilidade e sua reputação?! Não serei eu que me atreverei a contestá-lo. Até porque, a experiência me provou que, muitas vezes, a intuição extrapola toda a minha cartesiana lógica. É nosso sexto sentido que nunca falha. Falhamos nós quando relutamos em lhe dar ouvidos, ou quando não lhe damos de maneira alguma, por arrogância, ou por teimosia, ou, pior, por ambas.
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