Tempo livre de verdade
Pedro J. Bondaczuk
O que é, na sua concepção, dispor de “tempo livre”, amável
leitor? Afinal, a falta de momentos em que não haja obrigações a
cumprir é reclamada por quase todos, até pelos que não fazem nada
o dia todo, por todas as semanas, meses e até anos da sua vida.
Há muita gente assim, que é pior do que aquelas plantas parasitas,
que necessitam de hospedeiros para sobreviver. Alguns, é verdade,
são ociosos em decorrência de incapacidade física e/ou mental.
Muitos, todavia, são vagabundos de carteirinha por convicção, por
absoluta opção pessoal.
As pessoas verdadeiramente ativas, que têm ideais, ambições,
projetos e sonhos e que saem em busca da concretização de tudo
isso, reclamam que não dispõem do tal “tempo livre”. Estão
enredadas em imensas teias de compromissos e obrigações, que não
lhes dão, sequer, tempo para respirar.
Quem se planeja devidamente, contudo, consegue multiplicar as horas
de um dia e fazer muito, sem cansaços ou estresse. São raros os que
agem assim? Nem tanto! Conheço muitos que se desdobram e fazem as
coisas com alegria e naturalidade.
Há compromissos tolos que assumimos, muitas vezes impulsivamente,
apenas para sermos simpáticos aos que no-los impõem e que são
verdadeiros ralos por onde se escoa nosso preciosíssimo tempo. E ele
tende a ser irrecuperável ou a nos impor sacrifícios inusitados
para queimar etapas, na tentativa de recuperar o que poderíamos ter
poupado.
Sou um desses sujeitos que detestam dizer não aos outros e que, por
isso, me vejo, volta e meia, metido em armadilhas das quais não
consigo escapar. Vou a festas que não gostaria e não precisaria ir,
a eventos que não me dizem respeito e que nada têm a ver com meus
gostos e minhas atividades, faço favores dos quais nunca terei
retribuição e sequer um formal agradecimento e vai por aí afora.
A idade e a experiência, contudo, vêm me tornando mais atento a
esse desperdício tolo de tempo, fazendo com que seja menos
frequente. Por consequência, já venho conseguindo pôr em andamento
alguns projetos que eram de longo prazo, mas que chegou o momento de
executá-los ou de abandoná-los de vez (para minha extrema
frustração, caso o fizesse).
Um deles, por exemplo, é a redação das memórias, coisa que
cheguei a duvidar que faria, mas que venho fazendo com afinco e
regularidade. Elas irão contar alguma coisa para alguém? Não sei!
Nunca sabemos se nossos atos, ou quais deles, serão eficazes ou não
passarão, também, a entrar no rol das coisas que se caracterizam
como perda de tempo. Aqui conta a questão da confiança.
Confio no meu talento de escritor e na capacidade de observação que
desenvolvi ao longo dos anos. Por isso, estou convicto que minhas
memórias serão atrativas, vão redundar em um ou mais livros e irão
servir de exemplo a muitas pessoas que venham a passar por idênticos
caminhos que passei. Certeza, certeza mesmo, porém, não tenho
nenhuma. Ninguém tem e de nada.
Não respondi, todavia, a pergunta que lhe fiz no início destas
elucubrações: o que é tempo livre? É o repouso? É o lazer? Ou
são aqueles raros momentos de ócio, de explícita preguiça, com
que nos brindamos em determinados domingos e feriados? Não é nada
disso.
Deixo a resposta para esta questão a alguém muito mais experiente,
gabaritado e habilitado do que eu: ao escritor George Bernard Shaw
que, entre tantas outras coisas, conquistou um Prêmio Nobel de
Literatura, o que, por si só, o qualifica e o credencia a opinar
sobre o que quiser: “O tempo livre não significa repouso. O
repouso, como o sono, é obrigatório. O verdadeiro tempo livre é
apenas a liberdade de fazermos o que queremos, mas não de
permanecermos no ócio”.
Pois é, meus amigos, é isso aí. Querem resposta mais clara,
direta, objetiva e convincente do que esta? Tempo livre não é, nem
de longe, o tempo perdido em ociosidade e preguiça. É isso o que
faço neste momento, ao escrever estas considerações que sequer sei
se alguém vai ler, quanto mais apreciar.
Ninguém, absolutamente ninguém me impôs este texto, ao contrário
de tantos outros, escritos para atender obrigações (não raro
contratuais). Ao escrevê-lo, contei com o desejável “tempo
livre”. Creio que a questão ficou mais do que respondida (com a
providencial ajuda, claro, de um decano da Literatura).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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