Sunday, December 24, 2017

Reformas atropeladas


Pedro J. Bondaczuk


As reformas constitucionais, indispensáveis para que o País tenha um Estado enxuto e eficiente e sobrem, dessa forma, recursos para investimentos em áreas essenciais, como educação, saúde e segurança pública (nesta ordem de prioridades), avançam aos "trancos e barrancos", ao sabor dos acontecimentos.

Ora parecem que vão finalmente sair do papel, ora empacam de novo, ora as negociações voltam quase que à estaca zero, como se os congressistas tivessem todo o tempo do mundo para modernizar a nossa arcaica legislação e pôr ordem no caos estatal. Mas não têm, obviamente.

Crise sobre crise --- muitas das quais forjadas ou no mínimo forçadas para desviar a atenção da sociedade da morosidade dos trabalhos do Congresso --- têm interrompido as votações de emendas de grande relevância, que precisam ser negociadas, renegociadas, discutidas, barganhadas, tendo como pano de fundo a máxima franciscana --- deformada de maneira cínica na vida política brasileira --- do "é dando que se recebe".

O ano começou com as discussões, um tanto quanto fora de propósito, da reeleição. Depois de um enorme dramalhão, com ameaças de partidos que compõem a base de sustentação política do governo de fazer espetaculosas rupturas (que não se configuraram), a emenda foi finalmente votada e aprovada. Sabe-se lá às custas de quantas e quais concessões.

Decidida essa questão, que não merecia o espaço que ganhou na imprensa, pela sua irrelevância, nem o tempo que consumiu no Congresso, eleitas as mesas da Câmara e do Senado, após um suspense digno do mestre nesse tipo de história, Alfred Hitchcok, pensava-se que o caminho estivesse finalmente livre para o debate sério, equilibrado e sobretudo técnico das reformas: previdenciária, administrativa, fiscal, política... Pensava-se...mas não era bem assim.

Eis que veio a lume, como que tirado da cartola de um sádico mágico, o escândalo dos precatórios. Foram semanas e mais semanas de pirotecnia verbal, de denúncias bombásticas sem as competentes provas, de ameaças a políticos, banqueiros, "laranjas" e "bananas" e sabe-se lá que frutas mais, e de lances até circenses que ocuparam as manchetes, concentrando as atenções gerais.

A população assistiu a tudo entre atônita, revoltada e céptica quanto a se a Comissão Parlamentar de Inquérito, criada para investigar o caso, iria redundar em punição a quem quer que fosse, por parte do Judiciário, que é a quem compete punir, ou não. E apostava na negativa. Hoje já há quase certeza de que a CPI vai "terminar em pizza, com sobremesa de marmelada". Desconfia-se que tudo não tenha passado de um jogo de cena de potenciais candidatos, com vistas às eleições de 1998.

Quanto às reformas? Vão mal. O acordo para a elevação do teto dos deputados e ministros, que gozem de aposentadorias (prematuríssimas e descabidas) de R$ 10.800 (já alto demais) para R$ 21.600 (absolutamente imoral), se não inviabiliza o projeto --- e até apressa, provavelmente, sua aprovação --- decepciona, irrita, revolta e desencanta o cidadão.

O primeiro limite já representava quase cem salários mínimos. O segundo... A emenda da previdência está para ser reformulada pelo Senado, devendo retornar à Câmara para começar tudo de novo...Da fiscal, nem se falou ainda. Sobre a política, fantasia-se, mas não existe nada concreto. Em suma, em três anos, pouquíssimo foi feito em termos de reforma, embora tenha se falado demais sobre o assunto. Infelizmente, este é o Brasil...

(Texto escrito em 13 de abril de 1997, publicado como editorial na Folha do Taquaral).


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