Ciência e imaginação
Pedro J. Bondaczuk
O
artista é o sujeito que lança mão apenas da imaginação para
criar obras nascidas exclusivamente da sua fantasia, enquanto o
cientista se atém ao concreto, ao comprovável, àquilo que pode ser
racionalizado e repetido quantas vezes se desejar, desde que certas
regras sejam rigorosamente respeitadas, certo? Errado! O que
entendemos por ciência não é mais do que fruto da especulação. O
que hoje é tido como dogma incontestável, amanhã pode estar
totalmente ultrapassado por novas "descobertas", que por
sua vez talvez sejam superadas por outras, e mais outras e mais
outras, em um número de vezes que pode se perder no infinito. Karl
Popper alertou sobre o dogmatismo para quem pretenda ser um
cientista. Afirmou: "As teorias científicas são apenas
invenções humanas e devem estar perpetuamente sujeitas a revisão".
E de fato estão.
Há
somente pouco mais de um século, acreditava-se ainda em geração
espontânea, até que Louis Pasteur demonstrasse que só vida pode
gerar vida. Há 70 anos, a existência de vírus e bactérias não
passava de mera especulação. Ainda hoje se discute se esses agentes
infecciosos são seres vivos, inanimados ou um meio-termo entre os
dois. Como se vê, a ciência, até mais do que a arte, se alimenta
de imaginação. Nutre-se da ilimitada capacidade humana de criar. Ou
de recriar o existente com novas formas. O verdadeiro cientista é o
que mantém a mente sempre aberta para a dúvida. O que nunca aceita
uma evidência como prova definitiva. O que questiona, contesta,
indaga, busca respostas e não aceita nenhuma como sendo a última, a
final, a indesmentível.
Paul
Feyerabend observa que "a ciência só progride transgredindo as
regras impostas pela lógica". É, como se vê, uma atividade
essencialmente transgressora, especulativa, inovadora, não-dogmática
e anarquista em seu sentido mais nobre. É, essencialmente,
"imaginação". Até porque, as limitações dos sentidos
humanos e o curto tempo da existência do homem impedem-no de ter
conhecimento completo, absoluto, positivo sobre qualquer coisa, por
mínima que seja. Desconhece até a própria origem. Como sua mente
inquieta busca explicações para tudo, elabora (o que é bastante
louvável e estimulante) um sem-número de teorias, nenhuma
comprovável, a esse respeito. A mais aceita é a da evolução.
Seria ciência? Seria fantasia? Seria lenda? Seria ficção?
Ciência, no sentido lato do termo, não é. Carece do pressuposto
básico. Não pode ser demonstrada através de experiências
passíveis de reprodução. É, por conseguinte, o quê? Mera
imaginação!
Especula-se,
por exemplo, que esse animal atípico, dotado de consciência, capaz
de mudar o próprio destino e de alterar a natureza, evoluiu de seres
vivos primitivos, que por sua vez surgiram de um acaso ambiental, de
uma "sopa de aminoácidos" em que a Terra original se
transformou em decorrência de sua intensa atividade vulcânica. Que
essas criaturas simples em sua morfologia, unicelulares, através de
sucessivas mutações, foram ganhando complexidade e se adaptando a
um meio "a priori" hostil, até chegar ao estágio atual,
decorrendo, aí, alguns bilhões de anos. Supondo que essa teoria
seja lógica --- obviamente não é --- não há como demonstrar essa
tese mediante reproduções de laboratório. Muito menos o tempo
transcorrido, com teste do Carbono-14 ou sem ele.
Os
pesquisadores até que reproduziram a tal "sopa de aminoácidos".
Mas não conseguiram criar uma única forma que sequer se aproximasse
de um ser vivo. Os adversários das religiões, os que se arrogam a
uma racionalidade que na verdade não possuem, os que negam a
existência de uma inteligência superior, infinita e eterna (deem o
nome que quiserem ao que chamo de Deus), costumam dizer que a
metáfora da Criação, narrada no primeiro capítulo da Bíblia, é
um "conto da carochinha", ingênuo e rústico, voltado para
"mentes ignorantes".
Estes
não devem, todavia, ter lido o relato bíblico. Posto que
metafórico, ninguém jamais, em tempo algum, em qualquer lugar, fez
uma narração com tamanha lógica e sabedoria quanto esta sobre
assunto de tamanha complexidade. E seu autor não contava com a
parafernália de instrumentos e nem com a espantosa soma de
informações ao dispor do homem contemporâneo. Não tinha
biblioteca, arquivos, computadores, etc. O relato em questão é
fruto exclusivo de uma sabedoria superior. Não exclui, em hipótese
alguma, uma explicação dita "científica", se esta for
cabível. Qualquer que tenha sido a origem do homem, a primeira
dessas criaturas inteligentes não deixou vestígios de sua passagem.
Não documentou quando surgiu, já que não dispunha de um sistema de
medição de tempo. Não tinha inventado o alfabeto, que lhe
permitiria um registro escrito do que via ou pensava. Provavelmente
sequer se comunicava oralmente. Tudo isso veio depois. Ninguém
poderá, portanto, saber quem foi e nem quando nasceu.
Prova
de verdade, portanto, sobre a origem do homem, jamais será
conseguida. E não se trata da afirmação de um céptico
empedernido, mas da mínima lógica. Quanto aos demais tipos de
conhecimento, ditos científicos, as dificuldades são iguais ou até
maiores. A imaginação, portanto, é instrumental por excelência do
cientista, da mesma forma que é do artista. A diferença é que este
último o utiliza com muito mais charme e beleza e sem a arrogância
do primeiro.
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