É como fazer amor
Pedro J. Bondaczuk
Fazer
poesia é como fazer amor. Na verdade, essa afirmação sequer é
minha. É do escritor Cesare Pavese. Todavia, compartilho da sua
opinião. Daí incorporá-la às minhas próprias “verdades”, às
raras convicções que tenho (ou que julgo ter), até por experiência
própria.
Sinto
um êxtase, muito parecido com o do orgasmo, quando consigo escrever
um verso perfeito, não importa se rimado ou não, mas com ritmo e
musicalidade e que expresse, com exatidão, determinada emoção que
pretenda perenizar. Parece tarefa fácil, não é verdade? Mas não
se engane a esse propósito, caro leitor.
Agradar
a si mesmo é muito mais difícil do que se possa supor ou, ao menos,
admitir. Na maioria das vezes, queremos expressar determinada emoção,
realçar um certo afeto e para tanto valemo-nos de palavras
cuidadosamente escolhidas, precisas e até “cirúrgicas”, além
de metáforas que à primeira vista nos parecem, no mínimo,
adequadas para aquele contexto, mas que... Bem, quando lemos e
relemos o que foi escrito, nos resta o gosto amargo da frustração.
Constatamos
que o que foi dito não foi bem o que pretendíamos dizer. E isso
pode se repetir uma, dez, cem, mil, milhões de vezes. Claro que não
admitimos esses fracassos de expressão para ninguém e não raro nem
para nós mesmos. Mas lá no fundo da alma, secretamente, a
frustração está ali, nos incomodando.
Há
ocasiões em que simplesmente rasgamos, com furor, o que foi escrito
e que nos parecia tão belo e verdadeiro após a conclusão, ou
apagamos da telinha, caso o poema tenha sido redigido no computador.
Nem sempre agimos assim.
Há
casos em que, lido muito tempo após haver sido produzido, o texto,
que à primeira leitura nos desagradou, soa-nos verdadeiro e até
genial. É que então já nos esquecemos o que, de fato, queríamos
expressar. O poema, dessa forma, ganha perenidade e até foros de
sinceridade.
Contudo
poesia, para adquirir validade e satisfazer seus objetivos deve ser
feita coletivamente. Não na redação, claro. Explico. Ela requer,
além da ação de escrever, de quem a faz, do poeta, cumplicidade de
quem a lê.
Tem
que despertar, se não idêntico, pelo menos sentimento parecido ao
que a ensejou e que tivemos ao compô-la. Se quem ler nossos versos
não sentir coisa alguma, além da sensação de enfado e de perda de
tempo, teremos fracassado em nossa missão. E como fracassamos nesse
mister!
Mas
como saber se houve, de fato, reciprocidade de emoções e afetos
entre quem escreveu e quem se limitou a ler o escrito? Não há como!
Resta-nos, apenas, vaga suspeita a propósito. Até porque, nunca
sabemos em que mãos nosso poema irá cair. E dependendo de qual,
tanto pode gerar profunda empatia, como ser fator até de ridículo
para nós.
Na
verdade, a citação de Cesare Pavese, que mencionei acima, deixa
isso implícito. O que o escritor italiano escreveu tinha um
complemento, que não mencionei antes. Literalmente, escreveu o
seguinte: “Fazer poesia é como fazer amor: nunca se saberá se a
própria alegria é compartilhada”.
Eureka!
Está aí a chave que faltava para abrir o cadeado do entendimento!
Por maior que seja a satisfação proporcionada pela redação de
versos que aparentem ser perfeitos, sempre restará uma pontinha de
dúvida em nosso espírito quanto aos efeitos que causarão e,
portanto, um gosto amargo de frustração. Se formos hipersensíveis,
o desgosto será intenso. Se autoconfiantes e seguros da nossa
capacidade, será tão pequeno a ponto de se tornar imperceptível.
Não
raro fazemos amor com determinada mulher que em tudo nos agrada.
Deliramos quando em seus braços e somos conduzidos, em êxtase, ao
paraíso. Suas reações são, em tudo, no sentido de nos dar a
certeza da reciprocidade.
Acreditamos,
pois, que nossa alegria e gozos são compartilhados. Lá um belo dia,
porém... descobrimos que a tal da reciprocidade era uma farsa. Que a
parceira a que julgávamos satisfazer plenamente “fingia”
orgasmos, que nos pareciam tão reais, mas que sequer existiam.
Todos? Algum? Qual? Fica a dúvida.
Num
piscar de olhos, nossa autoconfiança e picardia vão para o espaço.
Nessas circunstâncias, inclusive, não são raros os casos de
irreversível impotência. O mesmo ocorre (guardadas as proporções,
claro) com o poeta quando não encontra reciprocidade do leitor. Às
vezes torna-se impotente, posto que espiritualmente. Cruz credo!
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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