No devido contexto
Pedro
J. Bondaczuk
A
reforma constitucional, como já havia ocorrido antes com as “Diretas
já” ou com a Constituinte, vem sendo colocada pelos políticos e
por setores da mídia como a “salvação da lavoura” no País.
Esse comportamento é muito do nosso feitio, tendo em vista a baixa –
diríamos baixíssima – politização da grande maioria dos
brasileiros.
Não
se trata de prática nova. A leitura de textos políticos do século
passado mostra que essas expectativas exacerbadas e sua exploração
para acalmar descontentamentos sempre estiveram presentes na vida
nacional, variando de assunto.
Nos
tempos de Brasil colônia, a independência era colocada como o
grande tema, o ato que iria trazer prosperidade e, consequentemente,
felicidade a todo o povo. Não trouxe. Não, pelo menos, para a
maioria. Claro que foi importante a obtenção da autonomia. Mas a
questão não foi colocada no devido contexto. E tome frustração.
Após
a abdicação de Dom Pedro I em favor de seu filho, menor de idade,
em todo o turbulento período da Regência, em que por muito pouco o
País não se fragmentou em pequenas e inexpressivas republiquetas, a
maioridade de Dom Pedro II passou a ser a palavra de ordem.
Tempos
depois, a proclamação da República foi colocada como a palavra
mágica. E continuamos, anos afora, com a elite nos enganando e nós
nos deixando enganar e gostando. Reformar a presente Constituição
não deixa de ter a sua importância. Afinal, os constituintes de
1986 elaboraram um autêntico “monstrengo”, fruto dos “centrões”
da vida, dos mais variados lobbies, dos interesses conflitantes que
os políticos tentaram satisfazer etc.
E
de tanto querer agradar a todo o mundo, acabaram não agradando a
ninguém. Elaboraram um texto constitucional prolixo, confuso,
contraditório, que em alguns casos descambou para o ridículo. O que
se conseguiu foi, apenas, tornar o País ingovernável, ou quase.
Não
há como negar a necessidade de reformas na Constituição, agora
através de emendas. Os parlamentares jogaram fora a oportunidade de
uma revisão simples, tranquila e sem complicações, que deveria ter
sido feita no ano passado, mas não foi. Mas o processo é colocado,
principalmente pelo governo, como crucial.
Coloca-se,
para a opinião pública, que se não ocorrer este ano, logo no
primeiro semestre, o País vai afundar no poço de outra de suas
eternas crises – que os mais politizados sabem, e muito bem, em que
se originam.
Dão
a entender que se o texto constitucional for reformado, da noite para
o dia teremos um novo país. As hordas de famintos serão
substituídas por multidões bem alimentadas e felizes. Haverá
emprego, com remuneração justa e decente, para todos os
trabalhadores (quando se sabe que, dada a modernização das empresas
e o despreparo da mão de obra, a maioria jamais conseguirá obter
colocação fixa, tendo que se contentar com a economia marginal).
Nossos hospitais públicos vão rivalizar com os do Primeiro Mundo em
termos de condições e de bom atendimento. Nossas escolas serão
padrões de excelência educacional. Ora, ora, ora…
O
pior é que a principal das reformas, o âmago do problema, que é o
nó político, sequer vem merecendo menção. Concordamos com Luiz
Alberto Bahia, que no artigo “Democracia Ignorada”, publicado no
caderno Brasil 95 do jornal “Folha de S. Paulo” em 11 de setembro
do ano passado, advertiu: “Nenhum processo democrático decisório
ganhará raízes, na estima popular, se a representação mandatária
não for disciplinada por uma prática partidária, simplificada
quanto ao número de partidos e aberta à grande participação de
todos, mediante a vida política diária”.
Alterar
a Constituição, com critério e competência, é importante. Mas
não é, por si só, salvo-conduto da felicidade coletiva.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 12 de
fevereiro de 1995).
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