Sem medo da vida
Pedro
J. Bondaczuk
Todas as coisas, na vida, como
já dizia Eclesiastes, têm o seu tempo certo. Inclusive as que
escapam à nossa competência, como o nascer e o morrer... É
necessário que tenhamos uma postura de permanente participação,
sempre, a cada momento, enquanto tenhamos um sopro vital, por menor
que seja, e nunca se restringir à mera contemplação.
Individualmente, não somos nada.
Poucos animais na natureza
são, fisicamente, mais dependentes do que o homem. Mas nenhum opera
as maravilhas de que ele é capaz, quando se prepara adequadamente e
quando manifesta sua vontade e suas aptidões através de atos. É
tolice esse mito da juventude, de que esta seja a fase mais criativa
e produtiva da vida.
Até se explica essa postura,
que não foi, de forma alguma, imposta pelos jovens. Ocorre que em
certa fase da vida brasileira, a taxa de natalidade por aqui era
muito elevada. O País era um dos que tinham o maior contingente
mundial de pessoas entre zero e 21 anos, que chegou a representar, em
determinado período, de 70% a 75% do total da população. Os homens
de negócio viram nesse mercado enorme um bom filão para auferir
grandes lucros. E com razão. Do resto, a propaganda e a publicidade
se encarregaram..."Business", como diriam os
norte-americanos...
Com isso, criaram-se modas e
modismos voltados exclusivamente, ou quase, para essa faixa de
brasileiros. Ocorre que esses jovens cresceram, amadureceram e
inverteram o perfil etário do Brasil. Hoje, o patamar dos idosos é
o que mais cresce. E crescerá muito mais nos anos vindouros. Logo,
estejam certos, a indústria e o comércio vão atentar para esse
fenômeno. E toda a propaganda e publicidade estarão voltadas (e a
inversão já está começando) para os cidadãos de maduros para
velhos, que eufemisticamente são chamados de integrantes da "3ª
idade".
Assim é a vida. Cada fase
dela tem suas vantagens e desvantagens. E mesmo que não tivesse, o
controle do processo de envelhecimento não está em mãos humanas. É
um ciclo biológico inevitável. De nada adiante se rebelar contra
ele.
O Marquês de Maricá,
conhecido por seus aforismos, citados em profusão nos antigos
almanaques de laboratórios – hoje desaparecidos – tem um que
fala a esse respeito. Diz: "Os velhos ruminam o pretérito, os
moços antecipam e devoram o futuro". Tanto um, quanto o outro,
estão errados. Ambos deveriam viver o aqui e o agora na sua
plenitude. Ruminar o passado não o traz de volta e é, portanto,
perda de tempo, que poderia ser melhor utilizado para coisas úteis,
como por exemplo, para construir, a cada dia, um novo instante de
felicidade. Antecipar o que é meramente potencial, por sua vez, é
uma forma de apressar a velhice.
Um fruto, por mais saboroso
que seja, só é saudável e próprio para o consumo quando está no
ponto certo. Verde, amarra a boca. Podre... Assim também é a vida.
E, igualmente, o que se entende por poder. Para que não seja simples
miragem, este precisa de um período de maturação. O escritor,
principalmente, deve ser sempre atemporal. Não pode, sob pena de
fracassar, voltar suas mensagens apenas para pessoas de sua própria
faixa etária. Tem que escrever para todo o tipo de leitor. Quanto
maior a quantidade, tanto melhor. Terá mais "poder" para a
difusão de idéias. Deve, sobretudo, compreender o comportamento dos
indivíduos em cada etapa de sua vida, e nas variadas formas
existentes, para incorporar em seus personagens e dessa forma
dar-lhes verossimilhança. E em que parâmetro se basear? Na
observação e, sobretudo, na memória. Deve recorrer à lembrança
de como se comportava em cada idade pela qual passou.
Honoré de Balzac, profundo
conhecedor da alma, sentenciou: "Todo poder humano é um misto
de paciência e tempo". Claro que a juventude é fascinante,
quando quem está nela tem as condições ideais de saúde, ambiente
e educação. Quando conta com uma família esclarecida, que lhe
balize o caminho a seguir. Mas é repleta de armadilhas e
sobressaltos. É cheia de espinhos e sofrimentos, de perplexidade e
de abandono quando não se tem nada disso. Os meninos de rua
brasileiros (e de outras partes carentes do mundo) que o digam...
Guimarães Rosa escreveu: "...Juventude? É uma maravilha. A
juventude é quase tudo. É a humanidade, é a esperança
recomeçando". De fato, é tudo isso. Mas para a burguesia. Para
as classes alta e média. Generalizar essa "maravilha" não
passa de alienação.
Mas seja qual for a nossa
idade ou nossa condição social, a postura que tivermos face à vida
vai contar muito para nosso sucesso ou fracasso, para nossa alegria
ou tristeza, para nossa vitória ou frustração. Essa é uma tarefa
solitária que apenas nós mesmos poderemos exercer. De pouca valia
têm os conselhos, se não nos conscientizarmos daquilo que é o
melhor para nós. Egon Krenz, um dos últimos líderes da extinta
Alemanha Oriental, em pronunciamento que fez em 18 de janeiro de
1989, disse uma coisa muito importante a esse respeito. Observou:
"Precisamos reconhecer os sinais do tempo e reagir, do contrário
seremos punidos pela vida. Só correm perigo os que temem a vida".
Não a temamos, portanto. Livremo-nos desse risco. Bebamos desse
cálice milagroso até a derradeira gota...
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